Da Folhapress
Por Walter Porto, da Folhapress
SÃO PAULO – Há um mês, Manu Gavassi saiu do ‘BBB 20’ como a terceira colocada. Isso não quer dizer, contudo, que ela não tenha atingido seu objetivo primordial com a passagem pelo programa.
Na entrevista a seguir, a atriz e cantora conta como participar do ‘Big Brother’ se encaixou num planejamento mais amplo de sua carreira artística, afirmando que o palco do programa trouxe uma visibilidade que ela sempre buscou como profissional.
Manu discute também os motivos pelos quais esta última edição teve uma proporção estrondosa, as acusações de que ela passou boa parte do reality show interpretando uma personagem que não era autêntica e a necessidade de que influenciadores como ela – que alcança mais de 15 milhões de pessoas no Instagram – passem a se posicionar sobre política, cada um a seu modo.
O fator fama
A minha decisão de entrar no reality tinha completamente a ver com meu trabalho. Eu queria ampliar a minha visibilidade, me apropriar da minha própria imagem.
Eu sentia que quem tinha uma percepção verdadeira sobre mim era um nicho muito pequeno. E muitos dos meus trabalhos como compositora e roteirista eram muito autorais, tinham muito a ver com quem eu era. Só tinham graça para as pessoas que realmente me conheciam.
Era uma frustração pessoal, um empecilho em muitos dos meus projetos grandes. Diziam, “ai, Manu, sua ideia é incrível, mas a gente não sabe se isso vai trazer muita gente para assistir”. Isso me frustrava bastante, saber que minhas ideias eram boas, que eu tinha capacidade de realizá-las de maneira incrível, só que me faltava o fator fama.
Nunca pensei na minha vida em entrar num reality show, principalmente do tamanho do “Big Brother”. Mas pensei: se isso for trazer o que eu sempre quis para a minha carreira, essa visibilidade da minha personalidade e, logo, do meu trabalho, então eu topo.
O retorno
O resultado foi muito melhor do que eu imaginava. Eu estava ciente do preconceito que carregava participar de um reality show. Mas eu contava com isso e sabia que talvez poucas pessoas entendessem aquele meu humor, a maneira que eu estava representando. Eu tinha na cabeça que ia virar um número um pouco maior, mas também limitado de pessoas.
Via esse risco, mas confiava em quem eu era. Por mais que eu seja uma pessoa que está aprendendo, que eu erre, é muito importante a maneira como você lida com erros. E eu sempre fui uma pessoa que não tem problema nenhum em pedir desculpas e rever comportamentos.
Tinha mais medo de fatores que eu não poderia controlar. Mas pensei que, na pior das hipóteses, as pessoas iriam ver os vídeos [Manu deixou mais de cem vídeos pré-gravados para serem usados enquanto ela estava no “BBB”] e alguém vai me dar uma oportunidade por conta desse trabalho.
Eu nunca imaginei o que aconteceu. Entrar na casa com 4 milhões de seguidores no Instagram e sair com 15 milhões, meu Spotify crescer em 980% e, além dos números, a credibilidade que eu passei do meu trabalho e o respeito que houve por ele.
Eu não senti nem por um segundo o preconceito do reality show. Eu mesma quebrei um monte de preconceitos que eu tinha lá dentro. Tenho orgulho da minha coragem de ter me permitido me expor em tudo, nos meus medos, besteiras, nos meus ideais.
Interpretando uma personagem
Eu não concordo que eu estava vivendo uma personagem. As pessoas do meu convívio sabem que eu sou assim. Eu sou artista, no sentido de dublar as pessoas, fazer brincadeiras. Quando eu topei, as minhas amigas falaram “caraca, você é um personagem da vida real, você só vai estar fazendo isso na televisão”. Então não concordo que eu entrei blindada.
Mas quando a gente não está segura num ambiente, tende a mostrar só um lado da nossa personalidade. Eu não estava segura no começo. Não me sentia à vontade com ninguém ali. Não achava que eu poderia fazer amigos, principalmente ali nas primeiras semanas, quando tinha uma série de episódios extremamente machistas, de ideias que eu abomino.
Estava me sentindo muito fora da zona de conforto, tímida. Por isso só mostrava um lado da minha personalidade. Mas depois de morar um mês, dois meses, você se solta completamente.
Eu me sinto muito representada pela imagem que foi criada a meu respeito. Ainda bem, porque tem gente que passa uma vida inteira tentando construir uma imagem pública que a represente, e em três meses eu consegui de uma maneira muito simples e verdadeira.
Por que o ‘BBB’ teve essa proporção Eu já sentia antes que a gente estava entrando numa nova era. Meu pai, que é extremamente preocupado, disse que tinha medo de eu me frustrar muito, de as pessoas não partilharem dos meus ideais e eu sair de lá machucada.
Ele até deu o exemplo: “Muita gente elegeu o presidente que temos hoje, que é uma pessoa em que a gente não acredita”. E eu respondi que estávamos entrando numa nova era, e que o entretenimento também ia retratar isso.
A resposta das pessoas que votam no “BBB” é como a sociedade está pensando, quais suas inquietações, o que elas aprovam e desaprovam. Tudo isso fez com que tomasse essa proporção. Acho que foi uma mudança de ideologia.
Minha própria agência
Eu recebia muitas marcas querendo trabalhar comigo com escopos que eu não acreditava. Não vou segurar um produto e falar “compre isso”. Eu não acredito nisso, será que alguém vai acreditar?
Queria trabalhar de uma maneira mais artística. Primeiro, respeitando o consumidor, que é o meu público. Segundo, me respeitando como artista. Se eu tenho ideias para deixar a publicidade muito mais legal, de uma maneira que eu ia querer assistir, que transforme uma ideia em narrativa, por que eu não faço?
Comecei a testar isso com marcas parceiras e o resultado era dez vezes melhor, para a marca e para mim. E elas começaram a ver isso. As marcas estavam começando a me chamar para fazer trabalhos não só comigo como personalidade, mas como diretora criativa para outras pessoas.
Criei minha agência criativa e, dois meses depois, fui confinada. Quando eu saí, a série de vídeos que eu deixei foi um exemplo incrível do que eu posso fazer com uma marca, porque fiz isso com a minha própria marca, “Manu Gavassi”. Agora muitas marcas têm me procurado para criar a campanha e ser cara dela ao mesmo tempo.
Posição política
Eu sempre me posicionei, desde quando eu era muito atacada por isso e perdia muito seguidores. Comecei a me posicionar quando para mim a política começou a entrar no lugar do que eu acreditava como ideais, como direitos humanos, com coisas que para mim eram completamente abomináveis. E nunca deixei de me posicionar.
Sou muito preocupada com a maneira como eu me posiciono, quero sempre ter bastante informação, estudar bastante antes, porque sei o público com que eu lido e o tamanho da minha plataforma.
E hoje em dia isso, sim, envolve muito política. Eu acho muito legal o que a Anitta está fazendo [sua primeira live com Gabriela Prioli, sobre política, teve 3 milhões de visualizações], porque a gente não tem informação sobre política, isso não é ensinado na escola. Eu me senti muito desinformada a vida inteira. Acho muito importante assumir isso e buscar informar as pessoas que nos acompanham.
Tenho acompanhado o crescimento do Felipe Neto, a maneira como ele se posiciona e admiro muito. Acho que é esse o caminho. A gente não pode mais ficar quieto em relação a isso, já passou da hora. Cada um do seu jeito, no seu tempo, tem que saber falar sobre o que acredita, sim.