Do Estadão Conteúdo
WASHINGTON – O ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, advertiu para o risco de se abortar a recuperação da economia mundial, se as condições das finanças internacionais mudarem abruptamente. “É preciso”, afirmou, “conduzir com muito cuidado a normalização da política monetária nos EUA e na Europa, depois de anos de juros muito baixos e de muita emissão de moeda”. “As políticas frouxas foram usadas para facilitar crédito, estimular consumo, animar negócios e facilitar a superação da crise”, disse.
Os bancos centrais, comentou o ministro, melhoraram notavelmente sua comunicação e vêm orientando os mercados cuidadosamente no caminho da normalização gradual. Apesar disso, acrescentou, convém levar em conta o risco de um caminho acidentado, enquanto o mundo sai de uma fase sem precedente, por sua duração, de políticas monetárias fora dos padrões convencionais. Ele tratou do assunto em declaração preparada para a reunião, nesse sábado, 14, do Comitê Monetário e Financeiro, o principal órgão político do Fundo Monetário Internacional (FMI).
Advertências semelhantes foram feitas durante a semana por economistas e dirigentes do Fundo. Políticas de juros baixos e crédito fácil, num ambiente de inflação muito fraca, contribuíram para a reativação das economias, mas ao mesmo tempo criaram ambiente favorável a riscos financeiros e à supervalorização de ativos. Na quarta-feira, o diretor do Departamento Financeiro do FMI, Tobias Adrian, mencionou o risco de uma atitude complacente e citou cinco sinais de alerta:
- a) Muito dinheiro está sendo usado na caça a poucas aplicações altamente rentáveis. Antes da crise havia US$ 16 trilhões de ativos com rendimento acima de 4%. Hoje há menos de US$ 2 trilhões de títulos com essa qualidade, mas a corrida às compras continua, estimulada por juros excepcionalmente baixos.
- b) O endividamento do setor privado cresce nos países do Grupo dos 20 (G-20), aumentando o perigo de um desastre se os juros subirem abruptamente.
- c) Empréstimos externos a países emergentes e em desenvolvimento têm aumentado. Os ingressos aproximam-se de US$ 300 bilhões em 2017, mais que o dobro do total de dois anos atrás.
- d) A expansão do crédito na China indica riscos financeiros crescentes.
- e) Com diferenciação pequena entre diferentes classes de ativos, os mercados menosprezam possíveis choques de vários tipos, como problemas geopolíticos, surtos inflacionários, mudanças nos juros de longo prazo e tropeços econômicos.
“Essas crescentes vulnerabilidades podem fazer descarrilar a recuperação”, disse Adrian. No pior cenário, prêmios de risco sobem, preços de ações e de imóveis caem e US$ 100 bilhões aplicados em títulos saem dos países emergentes. O desafio para os bancos centrais do mundo rico é normalizar suavemente suas políticas, apertando-as gradualmente e sempre com cuidado para evitar choques. A experiência, até aqui, comprova os cuidados sugeridos pelo diretor de assuntos financeiros do FMI e defendidos também por Meirelles. O banco central americano, o Federal Reserve (Fed), tem elevado os juros de forma bem gradual e sinalizada. O Banco Central Europeu (BCE) já anunciou planos para mudar sua política e também deverá fazê-lo de forma cautelosa.
Avançar na regulação do sistema financeiro intensificada a partir da crise, foi uma recomendação reiterada por dirigentes do FMI durante a semana. O assunto é hoje politicamente mais complicado, porque o afrouxamento das normas bancárias é uma das bandeiras do presidente americano, Donald Trump.