O Conselho Indigenista Missionário (Cimi), Regional Norte I, e a Equipe de Apoio aos Povos Indígenas Livres (Eapil/Cimi) expõem que está acontecendo invasão de garimpeiros na Aldeia Jarinal, localizada no alto Rio Jutaí, na Terra Indígena Vale do Javari, Oeste do Estado do Amazonas.
De acordo com as entidades denunciantes, as lideranças Kanamari e Dyohom-Dyapa, povos que integram a Aldeia Jarinal, garimpeiros chegam à aldeia promovendo festas e distribuindo bebidas alcoólicas, embriagando os parentes e cometendo crimes sexuais contra as mulheres, incluindo, menores de idade. Mas essas lideranças entendem que a intenção dos garimpeiros é aliciar os povos para viabilizar a exploração de ouro na região.
Em posicionamento de algumas lideranças dessa região, denunciam ainda que a Fundação Nacional do Índio (Funai) estaria sendo omissa em se manifestar sobre essas violências. Assim confirmou Paulo Marubo, presidente da União dos Povos Indígenas do Vale do Javari (Univaja): “a Funai está cada vez mais fragilizada. Quando acontece algum fato como este, é difícil se manifestar. O Estado não faz nada, com exceção de alguns parceiros dentro da Fundação… a Funai não está fazendo o seu papel”.
Outra liderança indígena que demonstra preocupação com os acontecimentos é Feliciana Kanamari, vice-presidente da Associação Kanamari do Vale do Javari (Akavaja): “a situação está tensa. A gente está correndo para ajudar nosso povo. Não tem ninguém para proteger os parentes isolados”.
Recebi essas denúncias do Cimi e já estou encaminhando ofício à Polícia Federal, à Fundação Nacional do Índio (Funai) e ao Ministério da Justiça, além de representação no Ministério Público Federal (MPF), solicitando do poder público a adoção de medidas urgentes para inibir essa invasão e até as denúncias de abusos sexual contra mulheres indígenas.
É de conhecimento público que a relação entre o presidente e os povos indígenas é bastante conflitante desde o início de seu mandato. De forma deliberada e, até ilegal, ainda em 2019 Bolsonaro retirou da Funai a atribuição pela demarcação das terras indígenas; e demitiu o então presidente dessa Fundação, por estar dialogando com os povos indígenas. São muitas as ameaças, com interesses econômicos por trás, que colaboram para a constante invasão de garimpeiros e grileiros em terras indígenas.
Até hoje, o que vemos são retrocessos e perdas de direitos desses povos, assim como propostas anti-indígenas do próprio Governo Federal que, a cada dia, tomam celeridade na tramitação no Congresso Nacional.
São projetos, como o PL 191/2020, que ficou conhecido como o PL da Mineração em Terras Indígenas, que a base do Governo aprovou. Eu fui o único deputado do Amazonas que votou contra. Esse projeto avança nas terras indígenas para exploração em grande escala, como mineração, hidrelétricas e outros planos de infraestrutura.
Juntamente com a Frente Parlamentar Mista em Defesa dos Direitos dos Povos Indígenas, da qual sou vice-coordenador, assinei Carta contra esse PL da devastação e reafirmamos a luta que a “a atual legislatura não pode passar para a História como incentivadora da destruição dos povos e das terras indígenas. Vamos ouvir o clamor da floresta”.
Além disso, estamos acompanhando o julgamento do Marco Temporal, que será retomado no Supremo Tribunal Federal (STF) ainda no primeiro semestre deste ano, e para o pacote de destruições do Governo Bolsonaro para com os Povos Indígenas, entre outros estão: PL 490/2007, que propõe o fim das demarcações e na revisão de terras indígenas; PL 6.299/2002, PL dos Agrotóxicos, PL 2.633/2020 e PL 510/2021, que legalizam a grilagem de terras indígenas; bem como do PL 3.729/2004, que flexibiliza o licenciamento ambiental. Todo esse pacote de maldades com a população indígena está na lista de prioridades anunciada pelo Governo Federal.
Assim como essa denúncia no Vale do Javari, neste mês de abril, também recebemos denúncia de membros da Comissão Pastoral da Terra (CPT) do Município de Tapauá (AM), com relatos de ribeirinhos e indígenas sobre ações de supostos grileiros em Áreas de Proteção Ambiental de responsabilidade do Estado e da União.
Sobre esse assunto, também encaminhamos representação nos Ministérios Públicos Estadual (MPE) e Federal (MPF), para que apurem todos os fatos e adotem as medidas cabíveis, a fim de garantir os direitos básicos dessa população, que se sentem ameaçada, como ainda a preservação do meio ambiente.
A Constituição Federal reconhece os direitos originários aos indígenas sobre as terras que tradicionalmente ocupam, em respeito aos seus costumes, crenças e tradições, dentre os quais a relação com a terra transcende caráter econômico e se reveste da própria essência vital, de existência desses povos. Porém, relatório de 2020 do Conselho Indigenista Missionário aponta que das 1.238 terras indígenas no Brasil, apenas 31% estão demarcadas, exemplo de que falta uma política que garanta o direito dos povos indígenas à terra.
Temos que lutar contra todas as medidas e ações que prejudicam os povos indígenas. É preciso o apoio também da sociedade. Necessitamos de uma Funai forte e com estrutura para suas atividades, não da forma que o Governo Bolsonaro está fazendo.
Da nossa parte, vamos continuar insistindo nessas lutas, em defesa de todos os povos indígenas, como do Vale do Javari. Situação que requer atenção urgente, como também em Tapauá, com medidas para inibir essas ações criminosas. Existem povos indígenas isolados que correm sérios riscos de serem massacrados. Não podemos aceitar que os povos originários deste país sejam tratados dessa forma. Vamos continuar nesta luta!
José Ricardo Wendling é formado em Economia e em Direito. Pós-graduado em Gerência Financeira Empresarial e em Metodologia de Ensino Superior. Atuou como consultor econômico e professor universitário. Foi vereador de Manaus (2005 a 2010), deputado estadual (2011 a 2018) e deputado federal (2019 a 2022). Atualmente está concluindo mestrado em Estado, Governo e Políticas Públicas, pela escola Latina-Americana de Ciências Sociais.
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