Infraestruturas são anteriores as atividades produtivas. Não se faz infraestrutura depois de se produzir algo, porque neste contexto não se pode perder tempo. Produções não podem ficar paradas nem um minuto, quanto mais anos para a construção de infraestrutura. Isso significa que novas obras de rodovias, portos ou aeroportos não são para a demanda de hoje, mas para a demanda do futuro. Esta é uma perspectiva que precisa ser ajustada na análise cotidiana do tema.
Muitas discussões sobre construções de infraestruturas surgem como se elas fossem soluções para os problemas do presente. Isso não faz sentido. As atividades econômicas de uma localidade são certamente atendidas com o que existe hoje, para o positivo ou para o negativo. A menor competitividade por um transporte caro restringe os lucros ou a venda em si. O contrário também é válido, pois a competitividade pode ser superior quando há a presença de oferta e de demanda para transporte.
A logística e as soluções de transporte não resolverão a questão do equilíbrio entre oferta e demanda, os preços dos produtos ou outras questões de mercado. Assim, se há um interesse em um porto deve vir junta a questão: para qual transporte? Pessoas? Cargas? Quais os volumes, frequências? Quais empresas vão operar no porto? Incontáveis perguntas adicionais surgirão depois das respostas para estas perguntas iniciais. O modal que pede menos perguntas associadas a ele é o modal rodoviário, por ser muito integrativo e gerador de acessibilidade, não demandando um planejamento expressivo. Talvez esta seja uma das razões para este modal ser o predominante no país, uma vez que nosso comportamento não é tão compromissado com planejamento e ação.
Entendo que o Brasil ou nossa cultura pode até possuir um problema de falta de planejamento. Todavia, o nosso maior problema é que se fala muito e se faz pouco. Muito já se falou sobre a BR-319 no Amazonas, mas quase nada se fez. Muito já se falou sobre o desenvolvimento do país, mas seguimos numa condição não ideal de desenvolvimento humano. Muito se fala da complexidade das leis trabalhistas, mas a mão de obra no país é praticamente metade formal e metade informal. Temos facilidade para ver problemas, mas profunda dificuldades para resolvê-los, porque muitas vezes são buscadas soluções perfeitas, o que é sempre impossível.
Ver o Distrito Industrial de Manaus cheio de buracos não afeta o presente. Afeta o futuro. A busca da exatidão para recuperar aquela pequena área com o uso perfeito dos recursos destinados para o propósito tem levado, segundo gestores do município, a licitações desertas. Segundo minha leitura da realidade, a uma inação de múltiplos anos. Uma fiscalização intensa, o que em si não é mal, com diversas pessoas e entidades preocupadas, com inúmeros técnicos envolvidos, na esfera, municipal, estadual, federal, órgãos de controle, terceiro setor etc., com um único resultado: buracos. O que esta confusão de pessoas de boa vontade está fazendo é um comprometimento do nosso futuro. Estamos minando o nosso futuro e não apenas atrapalhando a produção de hoje.
Toda vez que não se faz uma infraestrutura está sendo causado um problema com o futuro. Esta perspectiva precisa ser o norteador de todas as discussões sobre o tema. A inação leva ao incentivo empresarial na mesma direção: é melhor não fazer, porque naquela localidade não há um compromisso com quem faz, há um compromisso pela conversa infindável.
O capital não possui muito tempo para conversa, por isso que empresários têm pressa. Investir na Mastercard na bolsa de Nova York nos últimos cinco anos rendeu 187%. Na Microsoft rendeu 213%. Investir aqui trará retorno mais interessante? A decisão de alocação de capital passa por este viés, mas parece que até agora não entendemos para que serve asfaltar o distrito ou fazer uma rodovia. A esperança segue, mas sempre me é desolador olhar o interior desta confusão, com tantas pessoas de boa vontade que não conseguem tapar o buraco de cerca de 40km de vias nem recuperar cerca de 400km de rodovias, em um país onde o transporte rodoviário representa cerca de 67% de sua movimentação de cargas.
A quem interessa esta realidade? É uma pergunta que não paro de me fazer, mas nunca chego a uma resposta razoável.
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Augusto César Barreto Rocha é doutor em Engenharia de Transportes (COPPE/UFRJ), professor da UFAM (Universidade Federal do Amazonas), diretor adjunto da FIEAM, onde é responsável pelas Coordenadorias de Infraestrutura, Transporte e Logística.