Alexa Salomão, da Folhapress
BRASÍLIA – O grupo intitulado Elas no Orçamento, que reúne mulheres especialistas em finanças públicas, divulgou nesta terça-feira (15) uma proposta de nova regra fiscal. Elaborada na forma de PEC (Proposta de Emenda à Constituição), a sugestão tem três princípios básicos.
No lugar do atual teto de gastos, seria adotada uma meta de endividamento público de médio prazo, alinhada com uma estratégia de desenvolvimento econômico-social, e um novo teto para as despesas primárias dentro de um horizonte de quatro anos. Ou seja, o teto seria quadrienal e compatível a previsão de endividamento.
Esse novo teto não abarcaria recursos destinados a programas de combate à pobreza. O Auxílio Brasil ou o Bolsa Família, não importa o nome, ficaria permanentemente fora do limite de gastos. Essa alternativa é defendida por alguns setores do governo eleito de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), mas tem sido criticada por analistas de mercado e grupos políticos do centrão, que propõem limitar a 2023 a exclusão do benefício social do teto de gastos.
Segundo a economista e professora da Universidade Johns Hopkins (EUA) Monica de Bolle, uma das integrantes do grupo, a iniciativa é uma contribuição para o debate na transição de governo que, até o momento, está restrito a um grupo de homens. Integram a equipe de transição dessa área os economistas André Lara Resende, Persio Arida, Nelson Barbosa e Guilherme Mello.
“É uma iniciativa propositiva de um grupo de mulheres peritas em finanças públicas para o futuro governo, mas é também uma ação de representatividade das mulheres, tendo em vista que a equipe econômica de transição só tem ternos”, disse de Bolle.
Pela sugestão, o detalhamento do novo teto seria feito por lei ordinária, e não mais em artigo constitucional, para facilitar e agilizar ajustes da regra diante de mudanças no contexto econômico.
Pela proposta, a fixação do limite da dívida seguiria norma já definida no artigo 52 da Constituição. Caberia ao presidente da República definir os limites globais da dívida consolidada da União, dos estados, do Distrito Federal e dos municípios, que seriam validados pelo Senado.
Segundo levantamento do grupo, a maioria dos países que adotam limite de gastos trabalha com horizontes mais curtos. Geralmente, o teto é fixado para um prazo de três anos e a regra geral costuma ser revista a cada cinco anos.
O arcabouço do atual teto brasileiro de gastos foi feito para um horizonte de 20 anos, com revisão em dez.
Um dos documentos considerados para a formulação da sugestão é um levantamento do FMI (Fundo Monetário Internacional) que avaliou o desempenho de diferentes regras fiscais durante a pandemia da Covid 19 e demonstra a importância das metas flexíveis.
Entre as economistas que integram o grupo Elas no Orçamento também estão Virgínia De Angelis, auditora federal de Controle Externo do TCU (Tribunal de Contas da União), atualmente assessora da Coordenação-Geral de Controle Externo da Área Econômica do órgão, Rita Santos, consultora de Orçamento no Senado, Júlia Rodrigues, consultora de Orçamento na Câmara, Clara Marinho e Roseli Faria, analistas de Planejamento e Orçamento do Poder Executivo. Faria também faz parte do grupo de transição Mulheres, que trata de questões de gênero.
Essa é a terceira proposta de mudança do teto que sugere a adoção de meta para a dívida pública associada a limites de gastos.
Na semana passada, o economista Felipe Salto, secretário de Fazenda e Planejamento do Estado de São Paulo, também apresentou uma sugestão de reforma da regra fiscal que atrela o teto de gastos à meta de dívida. Uma minuta foi enviada ao vice-presidente eleito Geraldo Alckmin e ao economista Persio Arida, que integra o grupo de transição da economia, e já está em análise. Nesta terça, Salto se encontrou com Alckmin para tratar da sugestão.
Na segunda-feira (14), o Tesouro Nacional também apresentou proposta para uma regra mais flexível do teto de gastos, que permite crescimento real das despesas conforme o nível e a trajetória da dívida pública.
Propostas de nova regra fiscal
– Proposta do grupo Elas no Orçamento: Meta de médio prazo para dívida pública, com estratégia de desenvolvimento econômico-social; novo teto para as despesas primárias com horizonte de quatro anos, alinhado a projeção de dívida; recursos destinados a programas de combate à pobreza, como o Auxílio Brasil, ficariam permanentemente fora do teto
– Proposta do PT: a equipe de Lula ainda não apresentou uma proposta concreta de regra fiscal, embora negocie a PEC da Transição, que pode tirar o Bolsa Família do alcance do teto de gastos. Economistas que integram o time da transição defendem mudanças no arcabouço fiscal.
Entre as opções analisadas desde a campanha estão manter só uma regra de resultado primário, como era antes do teto de gastos, ou ainda estipular um limite de despesas mais flexível, com expansão acima da inflação e possíveis exceções para determinados gastos, como investimentos.
– Proposta do Tesouro Nacional: Autorizar um crescimento real do teto de gastos, acima da inflação, em taxas definidas de acordo com o nível e a trajetória da dívida líquida do governo geral. Além disso, a existência de resultado primário positivo (sinalizando arrecadação maior que as despesas) e crescente dá ao governo direito a uma espécie de bônus na expansão dos gastos.
– Proposta de Felipe Salto: o atual secretário de Fazenda de São Paulo ex-diretor-executivo da IFI (Instituição Fiscal Independente) do Senado trabalha em uma proposta que tenha um limite para a dívida pública. Haveria também uma meta de superávit primário, calculada com base na trajetória da dívida, e um teto para diferentes gastos, fixado a partir das variáveis anteriores. No primeiro ano, porém, haveria uma licença extra de R$ 120 bilhões.