Por Soraia Joffely, do ATUAL
MANAUS – As gravuras expostas em pedras próximas ao Encontro das Águas pela seca que atinge o Amazonas devem ser preservadas para contar a história pré-colonial de Manaus e da população originária que a habitava. Embora conservados, os vestígios históricos ainda são alvos de ação humana. Localizados no sítio arqueológico e geológico Ponta das Lajes, no bairro Colônia Antônio Aleixo, zona leste da cidade, os petróglifos ressurgem pela segunda vez nas paredes rochosas do parque.
O local registrado no CNSA (Cadastro Nacional de Sítios Arqueológicos) do Iphan (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional) possui, há mais de mil anos, gravuras rupestres esculpidas em seus paredões de pedra. Segundo o relatório do Museu Amazônico, o sítio revela uma ocupação aparentemente ininterrupta desde o início da era cristã até os dias atuais.
Popularmente nomeadas como “caretas”, por se tratarem de figuras que remetem a rostos de seres humanos, as gravuras estão hoje aparentes em função da estiagem histórica. Há também pinturas feitas no pedral das Lajes, que mesmo não sobrepostas aos vestígios encontram-se visíveis.
Próximo ao sítio arqueológico, o Ponta das Lajes também tem obras de construção da Estação de Tratamento de Água pela concessionária Águas de Manaus. Nesse período, segundo reportagem da Amazônia Real, o Iphan obteve decisão judicial para a interrupção das atividades, uma vez que o serviço começou sem ações de segurança para preservar o sítio arqueológico.
No início da obra as relíquias arqueológicas foram recolhidas e encaminhadas ao Museu Amazônico, conforme previsto na Lei 3924/1961 de proteção ao patrimônio arqueológico. A norma estabelece que é terminantemente proibido alterar à composição dos sítios arqueológicos por quaisquer meios.
O arqueológo Iberê Fernando Oliveira Martins, coordenador do Núcleo de Arqueologia do Musa (Museu da Amazônia), explica que a proteção dos elementos históricos contribui para a preservação do patrimônio arqueológico e o entendimento da formação da sociedade amazônica.
“Aqui conseguimos observar grafismo rupestre e também bacias de polimento. Esse local acaba sendo muito significativo para a população, primeiro por ser um momento histórico por conta do impacto que está sendo a seca. Acaba ficando exposto muitos desenhos que nós sabíamos, como arqueólogos, que haviam aqui. E também acaba tendo o interesse da população de vir até o local e procurar pelos desenhos. Por isso, é importante reforçar a necessidade de não recolher o material arqueológico, não precisa recolher, porque acaba perdendo as informações”, explicou.
A Ponta dos Lajes faz parte da formação de rocha denominada Alter do Chão, que forma o assoalho da planície do Rio Amazonas. As pedras que estruturam o sítio são oriundas do ambiente tectônico que originou o local.
Jaime Oliveira, arqueológo do Iphan, conta que os registros aparecem a cada 10 anos. Logo, a arqueologia depara-se sempre com novas obras pré-coloniais.
“Nós tínhamos conhecimentos de algumas gravuras, mas nessa nova seca mais intensa nós podemos visualizar outros que não conhecíamos ainda. Logo, por conta dessa característica do sítio, nós não temos essa datação específica de origem”, disse Jaime Oliveira.
Atualmente, é possível encontrar vários materiais cerâmicos no sítio. Nas pontas da praia, observa-se peças de milhares de anos que, antes da vazante, não eram possíveis de visualizar. Especialistas apontam que esses “paredões” são amostras históricas desse processo das Lajes no Amazonas.
“Primeiro, nós temos uma grande quantidade de bacias de polimentos que são locais onde eles confeccionavam as ferramentas que utilizavam no dia a dia. Para além dessas bacias, o sítio também é muito rico com as gravuras que somente são possíveis serem vistas na seca. A arqueologia permite que a gente entenda o modo de vida das populações pré-colonial, e esse sítio traz um dado importante que traça a interpretação de que esses povos também viviam períodos de seca rigorosos como a que estamos vivendo agora”, afirmou Jaime.
Os arqueólogos que estudam os vestígios das Lajes caracterizam as figuras como obras de arte. “Nós percebemos que essas figuras rupestres também passam diferentes impressões de estado emocional. Você tem algumas que os antropomorfos (gravuras) se apresentam mais sorridente e outras que eles já estão mais sérios. Por isso visualizamos o sítio também como uma obra de arte, porque ele tem essa característica de expressar sentimentos”, completou o arqueólogo.
Poluição
Ao caminhar pela área, nota-se muito lixo como garrafas PET, papelão, madeira e outros objetos plásticos. De acordo com o Iphan, os resíduos são proveniente do descarte inadequado em outros pontos ao longo do Rio Negro.
A superintendente do Iphan no Amazonas, Beatriz Calheiro Evanovick, afirma que para realizar a gestão patrimonial é necessário haver gestão compartilhada com a população.
“Não temos intenção de criminalizar as visitas da comunidade. Ela, inclusive, é quem tem uma relação anterior a nós, uma relação de intimidade e proximidade. Levando em consideração que essa é uma área passiva da população circular. Nós só reforçamos para não deixar os resíduos, pedimos também para não fazer as fogueiras sobre o pedral”, disse.
Para conter os danos humanos e as degradações no patrimônio, o Iphan e o Instituto Soka Amazônia, organização não-governamental responsável pela gestão do parque, farão ações educativas no dia 28 de outubro para preservar a área.
Serão realizadas atividades de recolhimento do lixo no local e o descarte correto desses materiais a fim de sensibilizar e conscientizar a população da importância de preservar os rios e os bens arqueológicos.
Arqueólogo Jaime Oliveira fala sobre a importância de preservar sítio arqueológico.
Se existem gravuras ali, significa que o nível da água já foi tão ou mais baixo por um período significativo e que nada disso tem a ver com as tais “mudanças climáticas” supostamente causadas pelo ser humano, mas sim, com os ciclos naturais do planeta, que nós ainda estamos longe de compreender integralmente…