
Por Felipe Campinas, do ATUAL
MANAUS – O Governo do Amazonas e empresas médicas que prestam serviços ao estado travam “guerra de versões” sobre as contratações feitas pela Agir (Associação de Gestão, Inovação e Resultados em Saúde) para serviços no Hospital 28 de Agosto e do Instituto da Mulher Dona Lindu, em Manaus.
A associação detém, desde o início deste mês, a gestão das duas unidades, que formam o Complexo Hospitalar Sul. Antes da mudança, as contratações dos serviços para esses hospitais eram feitas pela SES-AM (Secretaria de Saúde do Amazonas), que priorizava as cooperativas do estado.
Com o novo modelo de gerência, a gestora faz cotação de serviços, e tem contratado outras companhias, inclusive de fora do estado, diante da recusa das empresas médicas de Manaus em firmar contratos com ela.
Algumas dessas empresas que não firmaram contrato com a entidade têm feito alarde sobre risco de paralisação de serviços no hospital. As cooperativas médicas dizem que não puderam assinar contratos com a entidade por conta dos pagamentos atrasados.
A Agir e o Governo do Amazonas rebatem as informações, afirmam que as cooperativas se recusaram a assinar contratos e que o serviço não será interrompido, pois profissionais de outros estados estão sendo contratados.
Na noite desta segunda-feira (16), o presidente do Iceam (Instituto de Cirurgiões do Amazonas), Marcus Assayag Coen, criticou a decisão da Agir de recusar a proposta oferecida pelo instituto para permanecer nos hospitais.
“Na sexta-feira, ela [Agir] lançou em seu portal o resultado na qual o Icea não foi a escolhida. Os cirurgiões que trabalham nestas unidades há mais de 30 anos, três décadas trabalhando em parceria com o estado, estarão fora de seus serviços a partir do momento que esta nova empresa tomar os postos deles”, afirmou Marcus Coen.
Na página de compras da Agir, consta que a empresa SUMMEDBR (Support Serviços Médicos), de Aparecida de Goiânia (GO), foi a vencedora da cotação para prestar os serviços de cirurgia geral.
Marcus Cohen confirmou que a Agir propôs, no dia 29 de novembro, um contrato emergencial, de 60 dias, com o Icea para manter os serviços no Hospital 28 de Agosto, mas a cooperativa não assinou o contrato de imediato.
Cohen disse que, nas últimas duas semanas, a assessoria jurídica do instituto analisava as cláusulas do contrato proposto quando foi surpreendida com o resultado da cotação, publicada no site da Agir na sexta-feira. Diante do resultado, os médicos do Icea não viram razão para prosseguir com a contratação emergencial.
Ainda de acordo com o presidente do instituto, a SES-AM (Secretaria de Saúde do Amazonas) foi informada que a Agir precisa “assumir o mais rápido possível” os serviços, mas que os profissionais não deixarão a população desassistida nos hospitais.
“Da parte do Icea em nenhum momento [tanto o pronto socorro como a maternidade] vão ficar desassistidos. Independente de termos contratos ou não, a assistência na cirurgia geral dessas duas unidades vai se manter normalmente, mesmo sem contrato e sem pagamento”, afirmou Coen.
“Neste momento, nós estamos sem receber desde setembro. Mesmo assim, nenhuma unidade que os Icea participa – são 27 unidades – ficou desassistida por falta de pagamento”, completou o presidente do instituto.
Sobre os pagamentos atrasados, o presidente do Icea afirmou que negocia o pagamento de 50% do valor devido desde o mês de setembro.
O Itoam (Instituto de Traumato-Ortopedia do Amazonas) publicou vídeo com o título: “estamos sendo despejados”. No vídeo, funcionários relatam que foram notificados para saírem das unidades.
A SES-AM informou que o Itoam, assim como outras empresas médicas, recebeu proposta da Agir para permanecer prestando os serviços, mas não aceitou. “Dessa forma foi necessária a busca por profissionais de outros estados”, comunicou a secretaria.
Serviços contínuos
Na manhã desta terça-feira (17), ao ser questionado sobre o assunto, o governador Wilson Lima negou que haja risco de paralisação, disse que há expectativa de aumento de produtividade e afirmou que “alguns empresários” ficaram insatisfeitos por terem que sair da “zona de conforto”.
“Eu determinei para a empresa: não quero que traga ninguém de fora. A preferência é para para o médico que está aqui. Agora se o médico não quiser entrar no novo sistema da empresa, se não quiser atender as exigências da empresa de cumprir plantão, ter hora pra entrar e ter hora pra sair, aí paciência”, disse o governador Wilson Lima.

Mudança de gestão
A transferência da gestão foi firmada no fim de novembro através da assinatura de um contrato de R$ 2 bilhões, com validade de cinco anos. O novo modelo de gestão é considerado eficaz e econômico pelo Governo do Amazonas, que prevê diminuição de despesas em até R$ 130 milhões por ano. O acordo engloba os serviços administrativos, técnicos e operacionais.
O repasse da gestão para a Agir gerou uma briga judicial entre as cooperativas e o Governo do Amazonas. O contrato foi contestado no TCE-AM (Tribunal de Contas do Amazonas) por nove cooperativas médicas que prestam serviços ao estado e afirmam estar com pagamentos atrasados.
No dia 2 deste mês, a conselheira Yara Lins, presidente do Tribunal de Contas, concedeu liminar para suspender todos os atos posteriores à homologação e adjudicação relacionado ao edital de Chamamento Público nº 001/2024, que selecionou a entidade. Na prática, a conselheira proibiu o estado de firmar o contrato com a organização.
O Governo do Amazonas recorreu à Justiça no dia 3 deste mês para derrubar a decisão de Yara. Além de apontar irregularidades na decisão da conselheira, o procurador-geral do Estado, Giordano Cruz, afirmou que a ordem dela “tem o condão de gerar prejuízos sociais irreversíveis ao sistema público estadual de saúde”.
Ao analisar o caso, a juíza Etelvina Lobo Braga, da 3ª Vara da Fazenda Pública de Manaus, derrubou da decisão de Yara por entender que houve irregularidades, entre elas a incompetência da conselheira para analisar o pedido. Braga afirmou que a decisão deveria ser analisada pelo conselheiro Luís Fabian, que já analisa outros processos relacionados ao tema.
A juíza também afirmou que a decisão da presidente extrapolou a competência do TCE e usurpou a competência da Assembleia Legislativa do Amazonas de suspender contratos. Conforme a juíza, a conselheira “deveria encaminhar os autos à Assembleia Legislativa (ALE), uma vez que, no caso, se trata de ato que sustou contrato”. Somente os deputados podem suspender contratos.
Ao falar sobre a mudança de gestão nesta terça-feira, o governador Wilson Lima afirmou que a contratação é uma forma de resolver problemas crônicos dos hospitais.
“Ou a ente resolve isso agora ou nunca será resolvido. A minha preocupação é com o paciente, com a população do estado do Amazonas. O meu objetivo é aumentar produtividade no [Hospital] 28 de agosto e vamos enfrentar o que tiver que ser enfrentado”, disse Lima.