Mesmo uma semana depois da divulgação da média do Enem por escola o resultado ainda repercute. Muitas análises, recortes e comparações ainda continuam sendo feitas e divulgadas pelos principais meios de comunicação do país.
No meio desse turbilhão de informações estão os pais, atônitos sem saber o que pensar, pois com a proximidade do final do ano vem com ele o momento de tomar a decisão entre manter o filho em uma escola ou mudá-lo para outra.
Os pais que tem filhos em escolas que aparecem no “Ranking” divulgado pela imprensa nas primeiras colocações estão muito satisfeitos, e ficam tranqüilizados por saberem que seus filhos estão sendo bem preparados para o Exame que lhes dará acesso ao ensino superior.
Em contrapartida, os pais de alunos que estão em escolas que ocupam posições mais abaixo neste ranking preocupam-se com o futuro de seus filhos, sobra sempre uma sensação de angústia e frustração por eles não poderem estar em uma escola melhor.
Contudo, a verdade não é bem assim. Aliás! É bem distante disso. Colocar em uma mesma lista, organizada em ordem decrescente de média, escolas com vários perfis diferentes é algo indevido, incoerente, indesejável e tecnicamente errado.
Tudo isso nasce de uma interpretação equivocada que é feita pelos veículos de comunicação a partir do resultado que o Inep divulga todos os anos: “a média do Enem por escola”. É claro que o equívoco não ocorre por ma fé, mas por falta de conhecimento técnico de quem produz as matérias para os jornais, televisões e sites.
Desde 2006, quando o Inep começou a divulgar este resultado, houve sempre a preocupação com que ele fosse interpretado de maneira adequada, não se restringindo apenas a um conjunto de escolas dispostas em ordem decrescentes de notas.
Neste sentido, com o intuito de deixar a análise mais rica, o Inep veio ao longo do tempo criando alguns indicadores que nos possibilitam olhar o resultado sob várias perspectivas. Contudo, este tipo de análise demanda mais tempo e exige um pouco mais de conhecimento técnico, além de uma boa dose de bom senso.
Neste conjunto de possibilidades podemos destacar quatro indicadores fundamentais que podem auxiliar os pais na hora da escolha da escola de seu filho:
– Porte da escola;
– Média das 30 melhores notas da escola;
– Indicador de permanência escolar.
– Indicador socioeconômico;
Tentaremos a partir daqui esclarecer cada um desses indicadores, construindo também “Rankings” alternativos para que os pais possam entender que, como já foi dito, há várias maneiras diferentes de se analisar este resultado. E, não necessariamente, seu filho está em uma escola ruim, precisando ser urgentemente colocado em uma daquelas que despontam entre as primeiras colocações no ranking geral.
Porte da escola
“Tendo a dizer: procure uma escola maior. Ali, seu filho terá contato com pessoas mais diferentes entre si. Vai conhecer o preguiçoso, o esforçado, o desobediente, tipos de pessoas que ele encontrará na vida. Numa escola pequena, as pessoas podem ser muito parecidas. A nota pode ser maior, porque é mais fácil dar aula para estudantes parecidos. Mas, no futuro, o garoto ou a garota não vai conseguir lidar com um mundo cada vez mais complexo.”
As palavras são do Ministro da Educação, Renato Janine Ribeiro, referindo-se a como os pais devem proceder na hora de escolher a escola para os filhos a partir dos resultados do Enem.
Se analisarmos o “Ranking” divulgado pela imprensa colocando agora o componente “número de alunos”, que revela o porte da escola, verificaremos um detalhe interessante. Vejamos:
Perceba que nove das dez escolas com a maior média do país não chegam a ter 60 alunos, ou seja, o equivalente a duas turmas completas de terceiro ano. Contudo, uma escola de Minas Gerais chama atenção, apesar de ficar na 5ª colocação, ela consegue ficar entre as dez melhores médias do país mesmo trabalhando com 294 alunos, cinco vezes mais que qualquer uma das outras nove. Sendo assim, em uma avaliação crítica, qual seria a melhor escola entre as dez? Acho que a resposta não é difícil.
No amazonas, se utilizarmos este mesmo critério, temos o seguinte quadro:
Para o nosso estado podemos dividir as escolas com as dez maiores médias em dois grupos: aquelas com mais de 100 alunos e as que possuem menos de 100 alunos. Novamente fica fácil dizer qual grupo tem um trabalho mais admirável no sentido de produzir uma média de destaque no Enem.
Média das 30 melhores notas da escola
Este é um indicador que permite uma comparação mais justa entre escolas de porte diferente, pois ele considera apenas a média dos 30 alunos com melhor desempenho de cada instituição. Com este indicador podemos analisar escolas de grande, médio e pequeno porte, igualando-as através da observação do desempenho dos seus 30 melhores alunos. Vejamos:
Note que o quadro muda bastante em relação ao anterior, a escola que antes era primeiro lugar simplesmente desaparece do “Ranking” e as médias ficam muito mais próximas umas das outras. Uma grata surpresa é que temos três escolas públicas aparecendo neste quadro, todas federais.
Contudo, vale ressaltar que uma escola não pode ter um “bom” trabalho somente para 30 alunos, a menos que ela só tenha este número de estudantes.
Caso uma escola seja de médio ou grande porte e apareça entre as dez no “Ranking geral” e no “Ranking das 30 melhores médias”, isso indica uma homogeneidade no seu trabalho, ou seja, ela não é uma escola capaz de produzir resultados apenas para um grupo pequeno de alunos mais interessados, mas para um conjunto grande e diverso, onde existem alunos de vários perfis.
Indicador de Permanência Escolar
Uma escola pode “garimpar” bons estudantes para se tornarem seus alunos apenas no último ano do ensino médio, geralmente eles são seduzidos com bolsas de estudo e em alguns casos até com ajuda financeira. Desta forma, a escola consegue aumentar sua média no Enem à medida que matricula no 3º ano mais alunos que já vem de outras instituições de ensino com um bom embasamento, praticamente prontos.
Neste caso, a média da escola no Enem não retrata a qualidade do seu ensino médio, é um resultado “maquiado”, construído a partir de uma prática que tem como objetivo principal produzir um resultado de destaque, trazendo assim mais matrículas para o ano seguinte.
Com intuito de que a sociedade possa observar isso, o Inep criou o Indicador de Permanência Escolar, um dado que mostra em termos percentuais quanto do ensino médio os participantes do Enem de uma determinada escola estudaram nela.
Quando olhamos para o quadro nacional verificamos algo bem interessante, que justifica a preocupação do Inep em divulgar este indicador, das dez primeiras escolas no “Ranking geral” cinco tem indicador de permanência escolar inferior a 20%, isto significa dizer que em sua maioria os alunos cursaram menos de 20% do seu ensino médio nestas escolas, ou seja, provavelmente tornaram-se alunos destas instituições no último semestre do 3º ano.
Nota-se também que somente em uma escola o indicador de permanência escolar é superior a 80%, o que sugere que os alunos desta escola que realizaram o Enem em 2014 estudaram a maior parte do seu ensino médio nela. Sendo assim, podemos atribuir o bom desempenho dos seus alunos ao trabalho realizado durante os três anos que lá estudaram.
No Amazonas, quando levamos em consideração este indicador verificamos que as dez primeiras escolas têm bons números, o que indica que este trabalho de “garimpagem” de bons alunos ainda não chegou por aqui, ou pelo menos ainda não é tão sistemático quanto nas escolas do sul e sudeste.
Indicador de Nível Socioeconômico
Analisando-se os resultados do Enem dos últimos cinco anos observa-se que este indicador acaba tendo uma relação direta com a média das escolas, em geral quanto maior o nível socioeconômico dos alunos maior tende a ser a média das escolas.
A explicação para isso é simples: com maior poder aquisitivo uma família pode proporcionar mais momentos de aprendizagem não-formal aos seus filhos, bons exemplos disso são: viagens, cinema, peças de teatro, livros, TV a cabo, internet, revistas, livros.
Tudo isso pode contribuir para um bom desempenho no Enem, uma vez que esse exame avalia um conjunto de habilidades que o aluno deve ter ao final do ensino médio, ou seja, o que ele sabe fazer com aquilo que aprendeu. Conta bastante também o conhecimento sobre atualidades.
No Amazonas, das dez primeiras escolas do Ranking oito tem Indicador Socioeconômico “Muito Alto”, isto se traduz no caso das instituições privadas em mensalidades mais altas. Contudo, comparando-se as escolas com esse indicador percebemos uma variação considerável no valor médio da mensalidade.
Uma observação interessante é que as escolas particulares de ensino médio do nosso estado estão praticamente todas inseridas no nível socioeconômico “Alto” ou “Muito Alto”. Apenas uma escola privada em todo o estado possui Indicador “Médio Alto”, é o Instituto Adventista Agroindustrial de Rio Preto da Eva. Isto indica que no Amazonas o ensino médio privado é para poucos.
O desafio para a rede estadual
As escolas de ensino médio da rede estadual em geral são de médio e grande porte, com alunos de nível sócio econômico entre “Baixo” e “Médio”. Para elas o desafio é duplo, pois se os últimos resultados do Enem tem mostrado que o indicador socioeconômico tem relação direta com o desempenho dos alunos, é na escola que essa diferença pode ser minimizada. Contudo, como já foi dito, um trabalho com foco em resultados em escolas que possuem muitos alunos é sempre mais difícil, exigindo da gestão um planejamento de longo prazo muito bem feito.
Quando se analisa o desempenho das escolas estaduais amazonenses, confirma-se a informação de que o indicador socioeconômico influencia sobremaneira no resultado do Enem. As que apresentam melhor desempenho são aquelas onde os alunos tem os melhores indicadores, mesmo tendo muitos alunos. Vejamos:
Melhorar é possível
Uma lição que vem do interior do estado de Pernambuco é a da Escola de Referência em Ensino Médio Senador Nilo Coelho, localizada a 745 Km da capital Recife.
Nesta escola 65% dos 149 alunos são provenientes da área rural, possuindo indicador socioeconômico “Baixo” e Indicador de Permanência na Escola superior a 80%.
Mesmo com um perfil que apontaria para um péssimo rendimento dos seus alunos no Enem, a escola obteve média 485,43, superando o desempenho de muitas escolas da rede estadual pernambucana.
Segundo o diretor da escola, Samuel Araújo, Isso só foi possível por meio de práticas pedagógicas que incentivam o desempenho de cada estudante, com projetos e simulados, além do atendimento integral.
“Abraçamos a filosofia da educação integral, que é trabalhar o aluno como um ser completo, não só o cognitivo. Trabalhamos a afetividade, a convivência social e tentamos desenvolver a independência. Não basta ter conteúdo e informação, temos que transformar o aluno num ser autônomo. Estamos ali como parceiros”, diz ele.