
Na madrugada de 24 de fevereiro, as tropas russas invadiram a Ucrânia, dando início ao maior ataque de um país contra outro desde a Segunda Guerra Mundial, há 80 anos. Tendo em vista o grande arsenal da Rússia, trata-se de uma guerra injusta com evidente desproporcionalidade bélica. A humanidade produz mais uma grande tragédia, promovendo destruição e sofrimento. O evento também ilustra o quanto precisamos corrigir os processos educativos, que configuram o ser humano e as suas relações com a alteridade.
Nos últimos dias, mais exatamente no dia 2 de março, a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) lançou a Companha da Fraternidade 2022, com o tema “Fraternidade e Educação” e o lema bíblico “Fala com sabedoria, ensina com amor”. A campanha tem como objetivo geral promover diálogos a partir da realidade educativa do Brasil, propondo caminhos em favor do humanismo integral e solidário.
Mesmo não sendo motivada pelos acontecimentos europeus em curso, mas voltada para a realidade brasileira, a Campanha da Fraternidade tem muito a dizer sobre a guerra, fundamentando-se na percepção de que não estamos construindo condições apropriadas para viver relacionamentos respeitosos, que engendram o aprendizado mútuo. Ao contrário, promovem a competição, a agressividade e a morte.
Assim como na Europa, seguimos um modelo educacional incapaz de mostrar as relações entre os saberes, evidenciar a complexidade do ser humano e incentivar uma cultura dialógica e colaborativa.
É o momento de refletirmos a respeito da prioridade da educação na formação do país, mas também sobre o modelo de educação adotado nas escolas, universidades e outras instituições de ensino. Pautando em um paradigma educacional determinado pela separação entre espírito e matéria, entre razão e emoção e entre cultura e natureza vamos continuar produzindo seres humanos pouco dispostos ao diálogo, à empatia, à responsabilidade socioambiental e à paz. Mas muito inclinados à dominação, à agressividade, à devastação ambiental e à guerra.
É hora de olharmos a educação como política pública fundamental, democratizando o seu acesso para todos e todas. No entanto, se quisermos construir condições mínimas de vida coletiva duradoura, é imprescindível não somente incentivarmos o desenvolvimento do espírito científico, mas também a construção de pontes entre saberes, habilidades e experiências. É preciso também aprendemos a importância da vida coletiva, respeitando o diferente e dele aprendendo. Finalmente, importa não esquecermos de escavar os nossos fundamentos interiores, superando os nossos preconceitos e intransigências.
Graças ao modelo de educação dominante é possível dizer que já vivemos numa guerra permanente. Tal modelo de educação é suporte para a desigualdade social, a devastação ambiental e para a violência de raça, de gênero e étnica. É preciso impedir que as armas substituam os livros, mas é igualmente importante construir condições para que a justiça e a solidariedade sejam práticas corriqueiras. É preciso uma educação para o ser humano todo e para todos os seres humanos. Uma educação para a paz, uma educação integral e libertadora.
Sandoval Alves Rocha Fez doutorado em ciências sociais pela PUC-RIO. Participa da coordenação do Fórum das Águas do Amazonas e associado ao Observatório Nacional dos Direitos a água e ao saneamento (ONDAS). É membro da Companhia de Jesus, trabalha no Intituto Amazonizar da PUC-Rio, sediado em Manaus.
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