Certo dia, o poderoso Zeus determinou que cada um dos deuses do Olimpo adotasse uma cidade. Em troca de proteção, os habitantes de cada local selecionado deveriam prestar culto e fazer oferendas à respectiva divindade.
Apolo escolheu Delfos. Ares optou por Esparta. Hera decidiu-se por Argos; e assim por diante. Tudo estava indo bem na partilha, até que dois dos mais poderosos deuses desejaram a mesma cidade: Ática. Houve tentativas de conciliação, mas Atena e Poseidon eram deuses caprichosos e ter um oponente com o mesmo interesse só fazia intensificar sua intransigência e aumentar a cobiça pelo território-alvo.
O conflito provavelmente continuaria pela eternidade. Então, Zeus resolveu repassar a controvérsia para o rei de Ática, Cécrope. Não era um problema de solução simples. Escolher uma divindade significava necessariamente rejeitar a outra. E como os potentes deuses gregos se comportavam como adolescentes mimados, atrair a antipatia de um deles significava também ter que arcar com imprevistas e terríveis consequências.
Rei Cécrope tinha a reputação de sábio, e talvez tenha sido por isso mesmo que ele não quis ficar com a responsabilidade do dilema exclusivamente para si. Resolveu, então, criar uma eleição em que todos os habitantes votariam no seu deus favorito. Inclusive jovens e mulheres.
Para facilitar a votação, Cécrope inventou a melhor das campanhas eleitorais: no lugar de garantir um tempo para que os candidatos ficassem fazendo promessas sobre o que fariam pela cidade, o monarca pediu que cada deus desse um presente especial para Ática. O presente considerado mais útil seria decisivo para o pleito eleitoral.
Poseidon, o deus dos mares, resolveu conceder duas dádivas. A primeira foi uma espécie de piscina natural para que os cidadãos pudessem se divertir e realizar competições aquáticas. A segunda foi um cavalo de batalha que não perderia em nenhum conflito bélico.
Já Atena fez brotar uma árvore, que chamou de oliveira. A deusa da sabedoria ensinou como extrair o seu óleo e preparar os seus frutos como alimento. Além disso, salientou que a madeira poderia ser usada na construção de móveis e casas.
Segundo os institutos de pesquisa da época, a maioria dos homens gostou mais dos donativos ofertados por Poseidon, pois eles significavam diversão na cidade e vitória nas guerras. Já as mulheres preferiam que as águas da piscina não fossem salgadas, pois poderiam ser usadas como fonte para matar a sede. Elas também não viam vantagem no cavalo de batalha, pois mesmo a vitória numa guerra não impediria que soldados fossem feridos ou mortos. Para elas, o regalo de Atena era mais proveitoso, pois significava um contínuo provimento de alimentação para todos.
A escolha, basicamente, era entre a diversão e a guerra contra a agricultura e a paz. Na votação, os argumentos dos cabos eleitorais da deusa foram mais persuasivos. Atena não apenas foi a escolhida, como também a cidade resolveu mudar o nome para homenageá-la, passando a se chamar de Atenas.
De vez em quando, todos temos uma espécie de ‘Dilema de Ática’, no qual temos que escolher entre os presentes de Poseidon e Atena. Ou seja, optar entre a piscina da diversão instantânea ou a árvore que dará frutos a longo prazo.
Essa decisão – entre o lazer imediato e a colheita futura do esforço – costuma determinar o futuro de candidatos a atletas, como também o destino de clubes.
Em breve, o Amazonas vivenciará um ‘Dilema de Ática’ quando os eleitores terão que escolher, possivelmente em agosto, o substituto do governador José Melo, cassado na semana passada.
No nosso caso, lidaremos com candidatos que se acham verdadeiros deuses. Portanto, é uma boa hora para aceitar aquele conselho do: “mirem-se no exemplo das mulheres de Atenas”.
Isto é, não mergulhar nas ideias de ‘piscinas salgadas’, evitar os ‘coices dos cavalos de batalha’. E o mais importante: entender que, de tempos em tempos, o nosso destino depende de saber discernir certas ‘árvores’ pelos seus ‘frutos’.
Texto muito apropriado e de muita sabedoria ao retratar nossa condição humana perante as escolha de prazer imediato ou de utilidade real….Parabéns Enoque você é um grande escritor.
Muito bom, Enock. Soh me diz uma coisa, cadê a nossa Atena? Pelo cardápio posto a vista, estamos a escolher entre diferentes facetas de Hades… Nem sequer Poseidon. É dificil escolher quando nenhum dos pretendentes tem algo promissor a dizer ou ofertar…
Mil vezes parabéns!!!
História muito emocionante.