Por Jullie Pereira, da Redação
MANAUS – Com o isolamento social, artistas, produtores de eventos culturais e empresas de entretenimento do Amazonas ficaram sem público e contabilizam o impacto econômico do coronavírus (Covid-19) no setor. As perdas, em alguns casos, chegam a R$ 1 milhão por evento adiado ou cancelado. Após as medidas de suspensões de eventos para evitar aglomerações, casas de shows e espaços culturais fecharam as portas e as atividades culturais e de lazer se concentraram na internet e TV.
Os últimos dados do IBGE mostram que no Amazonas 37 mil pessoas trabalham empregadas no setor cultural. No Brasil, são mais de 300 mil empresas que atendem serviços de arte, informação, comunicação, artesanato, shows musicais, exposições.
A Fábrica de Eventos, com 20 anos de atuação na região Norte, anunciou o adiamento de cinco shows que estavam marcados para este primeiro semestre do ano. A proprietária Bete Dezembro estima que o prejuízo financeiro ultrapasse mais de R$ 1 milhão por evento adiado. Ela diz que emprega cerca de 5 mil pessoas, direta e indiretamente, que ficaram sem renda.
Mas não são apenas os grandes produtores que perdem com o isolamento. Artistas que trabalham diretamente com o público e têm custos menores são os mais afetados. Márcia Antonelli, escritora e professora manauara de 47 anos, se mantêm financeiramente, desde 2011, com a venda de seus ‘livretos’ que custam R$ 10 por unidade e eram vendidos de forma itinerante, em praças e bares do Centro de Manaus. “Eu vivo da escrita, abdiquei de tudo pra viver da minha escrita. Eu devo muito aos livretos, eu posso comprar o que eu preciso, eu me alimento deles”, disse.
Com a impossibilidade de sair e encontrar pessoas, Antonelli resolveu fazer as vendas pela Internet. Agora, o cliente pode depositar o dinheiro em conta bancária e receber o pacote pelo correio. “ É o meio que encontrei para não passar privações futuras. Não estou exagerando ou dramatizando. A situação é séria. O governo federal alegou que ajudará estes segmentos com uma quantia de R$ 200 durante três meses, mas até agora não há nada certo”, disse.
Um dos espaços culturais da cidade, a Vila Vagalume oferece apresentações musicais, aulas de técnica vocal, aulas de alongamento, exposição, e aluga sala para processos teatrais. Também possui um restaurante vegano. As despesas fixas do local, que é gerenciado por oito artistas, custam em média R$ 4 mil por mês. Até o momento, apenas 10% desse valor, que é usado para pagar aluguel, Internet, energia, gás e alimentação, foi adquirido. A suspensão das atividades levou os artistas a trabalharem com a entrega das comidas por delivery e vendendo também plantas ornamentais, alimentícias e terapêuticas.
Para Vivian Gramophone, uma das artistas que administra o espaço, os órgãos culturais da cidade e do estado devem oferecer uma ajuda a curto prazo aos artistas independentes. “Acredito que existe boa intenção nas ações dos nossos órgãos, mas é preciso que se tenha em mente que existem muitos trabalhadores da cultura que são independentes e que precisam de uma ajuda a curto prazo porque o que se recebe como artista em Manaus, não dá pra fazer reservas. Tem artista vendendo equipamento, eletrodomésticos e o que puderem para comprar comida. Isso é muito sério. Precisamos de atenção agora”, disse.
Posição governamental
O orçamento da Manauscult (Fundação Municipal de Cultura, Turismo e Eventos) para o ano de 2020 estava estimado em R$ 25 milhões, valor que poderia ser alterado ao longo ano. Com as restrições impostas pelo novo coronavírus, a Fundação ainda não consegue mensurar o impacto financeiro e aguarda análises da Semef (Secretaria Municipal de Finanças).
A Manauscult informou que deve iniciar o pagamento de editais correntes, como o ‘Conexões Culturais’, que na última edição contemplou 100 projetos com aproximadamente 700 artistas envolvidos. Segundo a Fundação, a Prefeitura estuda alternativas para ajudar a classe artística e outras medidas devem ser anunciadas posteriormente.
A Sec (Secretaria de Cultura e Economia Criativa do Amazonas) divulgou dois projetos para artistas e produtores culturais. Um deles, o ‘Fica na Rede, Maninho’, vai selecionar 300 projetos de conteúdo digital e ofertar R$ 1 mil para cada um, nos meses de abril, maio e junho. O outro, ‘Cultura sem sair de casa’, oferece vídeos no Youtube e no Instagram com professores do Liceu Cláudio Santoro e de outros espaços administrados pela Sec.
O Portal da Transparência mostra que foi destinado à SEC, assim como à Manauscult, o valor de R$ 25 milhões para o exercício da cultura no Estado no ano de 2020.
Estudo de impacto
Em nota, a SEC informou que o custo do edital de Seleção de Propostas para Realização de Atividades Artísticas de Conteúdo Virtual – ‘Fica na Rede, Maninho’ totaliza R$ 300 mil e atenderá até 300 propostas, com o valor de R$ 1 mil cada. O projeto ‘Cultura Sem Sair de Casa’ não teve custo.
Ressalta ainda que já iniciou um estudo para avaliar o impacto financeiro causado na cadeia produtiva da cultura e economia criativa do Amazonas, devido as medidas restritivas impostas para a não propagação do novo coronavírus no Estado, e que divulgará o resultado quando a pesquisa for finalizada.