Da Redação
MANAUS – Não há como assegurar os direitos do trabalhador sem privilegiar os bancos, afirma a mestre em Direito Previdenciário Thaís Riedel. De acordo com a especialista, a capitalização defendida pelo ministro Paulo Guedes (Economia) protege muito menos o contribuinte que o modelo atual, funcionando como uma manobra de deslocamento de uma política pública para o mercado financeiro.
Em entrevista ao ATUAL na Sefaz (Secretaria de Fazenda do Amazonas) nesta quarta-feira, 22, a especialista citou riscos ao capitalizar a previdência. “Na repartição, que é o modelo atual, existe uma solidariedade. O risco de doenças e idade avançada não ocorre de forma igual para todo mundo. Depois de muitos anos o estado percebeu que se fossem colocadas todas as pessoas para contribuir ao mesmo tempo, ele consegue proteger mais indivíduos em maior quantidade de riscos porque a probabilidade das pessoas ficarem todas doentes no mesmo dia é mais improvável”, disse.
Segundo Riedel, na lógica da capitalização individual não há essa solidariedade. “Se você tiver uma incapacidade, um acidente ou outra situação você só tem aquela sua economia. Se você depender somente da capitalização, cada um por si, vai se proteger muito menos que no modelo atual”, explica.
A especialista comentou ainda sobre o perigo que a capitalização da previdência traz ao confiar o orçamento previdenciário ao mercado. “Então, o que acontece, ao final da sua vida, é que você vai verificar o quanto foi capitalizado no mercado financeiro. Essa aplicação no mercado financeiro pode ser muito boa ou muito ruim, porque há o risco natural do mercado”, disse.
De acordo com Thaís Riedel, em estudo a OIT (Organização Internacional do Trabalho) aponta que o custo da capitalização é alto, sendo preferível a previdência pública solidária vigente e a capitalização como algo complementar. “Tem um estudo da OIT que mostra que nos últimos anos, dos 31 países que capitalizaram sua previdência, 18 tiveram que reverter porque é um custo muito alto e houve uma precarização desses valores. Então o ideal é que a gente tenha uma previdência pública solidária, bem administrada até um valor, que é o que já tem”, disse.
Segundo ela, o custo dessa transição torna a reforma um retrocesso. “Então haveria um retrocesso muito grande e algo que o governo não mostrou, que é o custo dessa transição. O governo pretende economizar R$ 1 trilhão com essa reforma, mas há economistas que mostram que se instituir essa capitalização serão gastos R$ 6 trilhões”, disse.
Privilégios
Thaís Riedel diz ainda que o argumento dos privilégios de servidores e superaposentadorias não tem validade e que a maior parte da economia que a reforma propõe vem das contribuições do regime geral, que é dos trabalhadores da iniciativa privada.
Riedel diz que em 2003 houve uma reforma que estabeleceu o teto das aposentadorias dos servidores, e que somente os antecessores a essa mudança podem receber além do estipulado. “Não existe mais hoje a possibilidade dessas superaposentadorias, o que acontece é que pessoas que se aposentaram há anos já tem esse direito adquirido. Ficam batendo nessa tecla de que a reforma é para combater privilégios, mas dos R$ 1 trilhão de economia da reforma quase R$ 900 bilhões é do regime geral, dos trabalhadores da iniciativa privada e não do servidor público”, disse.
A reforma da previdência altera as regras de cálculo de todos os benefícios, inclusive do regime geral dos trabalhadores, diz a especialista. “Então a grande economia que se terá na reforma, é no regime geral e não nos servidores públicos”.
De acordo com Riedel, embora haja redução no percentual pago houve aumento de tempo na contribuição. “Eles reduziram o percentual que é pago hoje no regime geral, de 8%, para 7,5%. Mas em compensação aumenta cinco anos que o trabalhador vai ter que contribuir. Então na prática o trabalhador vai pagar mais”, disse.
Mais Pobres
Na prática haverá uma redução substancial de todos os benefícios, inclusive dos mais pobres, diz a especialista. “Se você pegar um trabalhador da iniciativa privada que ganhe hoje R$ 3 mil. Se ele por acaso aposentar por invalidez, o cálculo na aposentadoria que seria hoje R$ 2,1 mil cai para R$ 1.080 com a reforma. Ou seja, os valores dos benefícios dos mais pobres”, disse.
Riedel afirma que o preço que está se pagando para uma redução de gastos tem sido também da população mais carente. “É uma reforma que visa reduzir gastos, e a preocupação que a gente tem é que ela tem que ser uma reforma que vise proteção de riscos”, cita. “Além disso, as mulheres serão mais prejudicadas porque no cálculo elas terão que contribuir mais para ter o mesmo cálculo dos homens”, completa.
Idade Mínima
Segundo a especialista, o ponto que deve ser discutido é a correção da idade mínima no regime geral. “Há 20 anos criaram a idade mínima no serviço público, que é 55 anos mulher e 60 homem, e no regime geral não passou por nenhum voto. O que possibilita que o brasileiro que começa a trabalhar muito cedo se aposente novo ainda”, defende.
(Colaborou Patrick Motta)