MANAUS – O presidente Jair Bolsonaro começou a se insurgir contra as medidas dos governadores quando notou que estava ficando isolado, tanto pela falta de ação quanto pelas palavras, que destoavam das orientações de seu próprio ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta.
Na terça-feira, 24, surpreendeu a todos com um pronunciamento em cadeia nacional em que defendia a volta ao trabalho e o fim do isolamento social para todos – segundo ele, apenas as pessoas do grupo de risco deveriam ficar isoladas. E criticou os governadores e a imprensa pela “paralisia na economia”.
Como Bolsonaro nunca desceu do palanque desde a disputa de 2018, deve ter pensando que a crise gerada pela pandemia do coronavírus seria o momento oportuno para faturar politicamente. Não deve ter feito isso sozinho, mas orientado pela turma que o direcionou à vitória nas urnas.
De louco, Bolsonaro não tem nada. Neste momento, ele tenta desestabilizar as medidas adotadas pelos governadores, mesmo tendo consciência de que elas são necessárias para conter o coronavírus e evitar o estrangulamento dos serviços de saúde.
Isso é perceptível no discurso do ministro Mandetta, no sábado, ao orientar que não existe isolamento vertical (como defende o presidente). Mas recomenda que a população respeite as medidas de isolamento e em breve os governos busquem saídas para a volta de algumas atividades econômicas. Exatamente como pensam os governadores.
E por que Bolsonaro insiste com a campanha “o Brasil não pode parar”? Exatamente por conta da aposta política. Ele sabe que os governadores e prefeitos podem frear a pandemia e evitar o caos registrado na Itália, Espanha e Estados Unidos.
As medidas adotadas pelos governadores e prefeitos terão, e nenhum deles nega isso, impactos profundos na economia do país. É desejável a um governador a perda de receita, como está ocorrendo com a paralisação das atividades econômicas? Não creio que algum deles responda “sim”. Ninguém quer o caos na economia, mas os Estados optaram por colocar a vida em primeiro lugar em detrimento da economia.
Mas a charada está exatamente ai: Bolsonaro prepara o ambiente para apresentar, depois de passada a crise na saúde, os “bodes expiatórios” da crise econômica. “Eu avisei”, “Eu estava certo, e ninguém me ouviu” são frases que o presidente poderá usar para se eximir de culpa pelo fraco desempenho da economia, como preveem os analistas econômicos.
Bolsonaro pode ganhar a aposta, mas ninguém tem certeza que a sociedade brasileira vai aceitar esse tipo de canalhice num momento em que todos deveriam dar sua contribuição para conter uma doença que devastou uma população significativa de idosos em todo o mundo.
Façamos, também, nossas apostas.
Valmir Lima é jornalista, graduado pela Ufam (Universidade Federal do Amazonas); mestre em Sociedade e Cultura na Amazônia (Ufam), com pesquisa sobre rádios comunitárias no Amazonas. Atuou como professor em cursos de Jornalismo na Ufam e em instituições de ensino superior em Manaus. Trabalhou como repórter nos jornais A Crítica e Diário do Amazonas e como editor de opinião e política no Diário do Amazonas. Fundador do site AMAZONAS ATUAL.
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