Por Lucas Neves/ Da Folhapress
PARIS, FRANÇA – Se Jair Bolsonaro (PSL) vai ao segundo turno como favorito, seu caminho até 28 de outubro deve incluir ao menos três grandes obstáculos: a expertise do PT em campanhas, a antecipação do voto útil antipetista para a primeira rodada da eleição (possivelmente esvaziando esse “banco de votos”) e sua provável caracterização como candidato das elites pelo campo adversário.
A avaliação é do cientista político Frédéric Louault, professor da Universidade Livre de Bruxelas.
“Bolsonaro terá de se expor mais nessa segunda fase, em que vai bater de frente com a prática ‘de rua’ que o PT tem, que inclui ‘know-how’ em campanhas em nível local e redes importantes de apoio e divulgação”, diz ele, também vice-presidente do Observatório Político da América Latina e do Caribe, da Sciences Po (Instituto de Estudos Políticos de Paris).
Além disso, afirma Louault, as porcentagens do primeiro turno parecem indicar uma “fuga” antecipada de eleitores avessos ao PT para o guarda-chuva do capitão reformado. “Mesmo que ele precise avançar pouco para ganhar a eleição, sua reserva de votos pode ter se esgotado já agora, deixando-o com pouca margem de manobra para o segundo turno.”
O pesquisador acha improvável que se forme, em torno de Fernando Haddad, uma frente republicana nos moldes da que, ao longo das últimas eleições presidenciais francesas, tem visto nomes da esquerda e da direita moderada somarem esforços no segundo turno para evitar a ascensão ao poder da ultranacionalista Reunião Nacional (antiga Frente Nacional).
“Isso não vai funcionar no Brasil, é um discurso que não encontra eco entre antipetistas, para quem o PT encarna uma ameaça à democracia tão grande -senão maior- do que uma eventual eleição de Bolsonaro”, diz Louault.
Por isso, prossegue o professor, a estratégia de Haddad deveria passar pela recuperação do capital de seu partido enquanto “protetor dos pobres”, e isso não só no Nordeste, mas também nas periferias das grandes cidades, onde ele precisará tirar a enorme vantagem do adversário.
“Há uma fatia do eleitorado mais sensível a efeitos de campanha, ao uso da emoção para caracterizar certos perigos. O PT pode escolher enquadrar Bolsonaro como um candidato das ‘elites opressoras’, mas isso significaria polarizar ainda mais o debate”, observa.
Segundo o cientista político, o candidato petista poderia optar por um “jogo tático”, induzindo o oponente e seus auxiliares (como o boquirroto candidato a vice, general Mourão) ao erro, a se excederem na retórica radical, por exemplo -o que afugentaria alas da classe média desiludidas com o PT, mas de perfil moderado em matéria de usos e costumes, que votaram em Marina Silva (Rede) ou Geraldo Alckmin (PSDB) no domingo, 7.
“Como são menos experientes, os bolsonaristas estão mais vulneráveis a armadilhas, podem cair em contradição sobre o eventual programa de governo, fazer anúncios apressados que deem ao campo petista a chance de caracterizá-los como ineptos, como aqueles que vão derrubar a economia e desmantelar os serviços públicos”, afirma Louault.
Ele pondera, entretanto, que a força torrencial da “campanha de desinformação e simplificação de questões” conduzida nas redes sociais pela equipe do militar fragiliza a estratégia de apostar em tropeços discursivos dele.
Qualquer que seja o resultado do segundo turno, o risco de degradação da democracia no Brasil é acentuado, na opinião do professor. “Por um lado, há uma ameaça de não aceitação do resultado [em caso de vitória de Haddad]; por outro, delineia-se um desprezo pelas instituições republicanas, a começar pela Justiça, já criticada por Bolsonaro durante a campanha na figura do TSE. Vai ser difícil governar.”