Por Alfredo Henrique, da Folhapress
SÃO PAULO – Mesmo com o cancelamento do Carnaval de rua e com o adiamento dos desfiles no sambódromo de São Paulo, blocos tradicionais aparecem na programação de festas particulares prometidas para as próximas semanas. Os eventos, no entanto, podem contribuir para o avanço da Covid-19, sobrecarregando o sistema público de saúde. Nessa terça-feira (25), o Brasil registrou 199.126 casos da doença em 24 horas, o terceiro maior número desde o início da pandemia.
No último fim de semana, o bloco Agrada Gregos iniciou três dias de festa, com 50 atrações, segundo a organização, na região do Pari, na zona norte da capital. O evento teve início às 17h do último domingo (23) e se encerraria na madrugada desta quarta-feira (26).
O Agrada Gregos afirmou, por meio de sua assessoria de imprensa, seguir “todas as medidas de proteção” à Covid-19. Apesar disso, a Vigilância Sanitária afirmou, por meio da Secretaria de Estado da Saúde, ter realizado inspeção e autuado os responsáveis pelo evento “por não exigir o uso de máscaras”.
No perfil oficial do bloco, no Instagram, é possível verificar que o público não usa máscaras de proteção. A ausência do item obrigatório, segundo protocolos sanitários estaduais, também é constatada no palco da festa, conforme imagens compartilhadas na rede social. Os registros mostram ainda pessoas sem máscara se abraçando.
Mais eventos particulares estão programados para o Carnaval para as próximas semanas. No site da casa de shows Studio SP, que fica na rua Augusta, região central da capital, há até o momento dez festas agendadas, com participação de nove blocos de rua famosos entre os foliões. A programação, publicada na internet, começa no próximo dia 4, com eventos protagonizados por blocos de Carnaval, até o dia 27 de fevereiro.
Em seu site, o Studio SP afirma que irá respeitar o limite de 70% de público na casa, sem especificar a lotação máxima do local, acrescentando que irá obrigar o “uso correto” de máscaras de proteção. No último dia 6, o prefeito Ricardo Nunes (MDB) anunciou o cancelamento do Carnaval de rua na capital paulista, atribuindo isso ao avanço de contaminações decorrentes da Covid-19 e também da gripe H3N2. Em sua última edição, em 2020, a Prefeitura contabilizou 15 milhões de foliões nas ruas da cidade.
Isso, porém, não impede a organização de festas particulares, para as quais a gestão Nunes estabeleceu protocolos específicos, como a exigência de comprovação vacinal completa, limite de 70% de ocupação de público, obrigatoriedade do uso de máscaras e respeito ao distanciamento mínimo de um metro entre as pessoas.
“Entendo que toda essa política é de redução de danos, não de contenção da epidemia. Então, o governo vai pedir passaporte vacinal, restringir o número de pessoas nos locais, para diminuir o número de infecções, que sabemos que irão ocorrer”, afirmou o infectologista Wladimir Queiroz, consultor da SBI (Sociedade Brasileira de Infectologia).
O especialista considerou “absurdas” as imagens da festa do Agrada Gregos. “Na situação epidemiológica atual, ver essas imagens é algo absurdo. Estamos em uma fase de pico de novas infecções.”
Queiroz, que também é professor na Faculdade de Ciências Médicas de Santos, além de médico do Instituto de Infectologia Emílio Ribas, acrescentou que as festas particulares programadas para o Carnaval, em fevereiro, “irão provavelmente causar uma explosão maior de casos [de coronavírus]”.
“Já não sei mais a quem culpar por isso, porque a impressão que tenho é a de que, de alguma maneira, essas festas já são clandestinas pelo próprio modo de ser.”
Organizadores
O bloco de carnaval Agrada Gregos afirmou, por meio de sua assessoria de imprensa, respeitar os protocolos sanitários de prevenção à Covid-19, acrescentando ter sido autuado pela Vigilância Sanitária no primeiro dia do evento. O departamento jurídico do grupo avalia se irá recorrer.
Sobre as pessoas que aparecem sem máscara, durante o evento iniciado domingo (23) na zona norte, acrescentou que o público retira o item para se fotografar ou consumir bebidas. “Não temos controle [sobre a retirada de máscaras], uma vez que o ato de beber caracteriza consumo de acordo com as orientações de realização para eventos particulares”, diz trecho de nota.
Apesar disso, o Agrada Gregos reforçou cobrar o uso do item aos foliões por meio de avisos sonoros e placas. Foi acrescentado ainda ser obrigatória a apresentação da carteirinha de vacinação, constando duas aplicações de imunizante, para entrar no evento. O bloco afirmou respeitar o limite de público de 70%, mas não informou quantas pessoas participaram das festas de domingo e segunda-feira.
O Studio SP, que divulga dez eventos ligados a blocos carnavalescos, não se posicionou até a publicação desta reportagem. Em seu site, afirma respeitar “os protocolos das autoridades de saúde”, como uso de máscara e obrigatoriedade da apresentação da carteira de vacinação.
Prefeitura e estado
A Vigilância Sanitária, por meio da Secretaria de Estado da Saúde, afirmou ter autuado os organizadores do Festival Agrada Gregos. O valor da multa não foi informado. A pasta acrescentou que as autuações são passíveis de recurso, reforçando que o uso de máscara é obrigatório em todo o estado “para enfrentamento da pandemia.”
A Prefeitura de São Paulo afirmou exigir que organizadores de evento obedeçam à obrigatoriedade do uso de máscaras de proteção, além de cobrar o passaporte de vacinas.
Desde o início deste ano, acrescentou, frequentadores de festas e shows precisam estar vacinados com ao menos duas doses de imunizante contra o coronavírus, “devido à nova onda de contaminações causada pela variante ômicron”, diz trecho de nota.
A gestão Ricardo Nunes (MDB) não comentou se iria tomar algum tipo de medida em relação ao evento na zona norte em que frequentadores aparecem sem máscara de proteção em vídeos.