Do ATUAL
MANAUS – Com 40.290 habitantes, Autazes (a 111 quilômetros de Manaus) é o município com o maior IRA (Índice de Racismo Ambiental) entre cinco regiões metropolitanas do Brasil: Cuiabá (MT), Curitiba (PR), Manaus (AM), São Luís (MA) e Sorocaba (SP). O IRA de Autazes é de 41,11 em uma escala de zero a 100.
Esse número representa a parcela da população do município, entre pretos, pardos e indígenas, sem acesso a saneamento básico e moradia digna. O termo que define essa condição é “racializada”. Dos 13 municípios da Região Metropolitana de Manaus, a capital registrou o menor IRA com 1,66. Em contraste com Manaus, 75% dos municípios da Região Metropolitana registraram um IRA superior a 20.
No Amazonas, a cidade com o menor valor de moradia é Novo Airão (AM), com 94,62%. Quanto mais próximo de 100, menor é o valor dos itens analisados na formação do índice.
“É geralmente onde falta infraestrutura, onde a população negra sempre esteve vulnerável, em que não chega água, onde o acesso a moradia sempre veio de forma intermitente. Agora, de maneira estruturada, o IRA revela essas desigualdades e surge como mais um elemento para guiar políticas públicas anti-racistas”, afirma Vidal Dias da Mota Junior, cientista social sócio-fundador do Instituto Dacor e um dos criadores do IRA. Ele também é pós-doutorado em Ciências Ambientais pela Unesp (Universidade Estadual Paulista).
“É importante entender que, mesmo sem outros refinamentos nas variáveis da pesquisa, esse índice é muito eficaz para verificar essas desigualdades onde a população já é mais racializada”, diz Vidal Junior. Ou seja, neste momento inicial de criação do índice seria possível usá-lo com segurança para nortear ações do Estado, especialmente nos municípios com alto índice de racialização.
Para o cientista social, é essencial que universidade, organizações sociais e outros atores passem a “olhar para a questão da desigualdade no Brasil e para a questão da violência pelo viés racial” – panorama que inclui várias dimensões de racismo, inclusive o ambiental.
No gráfico abaixo o IRA e a racialização estão expressos nas cores laranja e vermelho.
“O mais terrível e que não pode continuar acontecendo é esse panorama ser naturalizado na paisagem das nossas cidades”, acrescenta. “Esse é o debate. Essa normalização do absurdo que é a violência contra esses grupos, minoritários quanto ao poder, enquanto não vemos campanhas para zerar o déficit habitacional, para que não tenhamos mais favelas ou submoradias nas nossas cidades, de forma que o estado assuma que todo cidadão brasileiro terá o direito à moradia em um período determinado”.
Vidal Junior alerta que na medida em que se normalizam as condições precárias de alguns perante outros, essas populações vivem ininterruptamente sujeitas a riscos, como doenças, contaminações diversas, excesso de ruído, maior exposição a áreas com altas chances de incêndio, entre outros fatores que deveriam ser inaceitáveis.
As áreas com maior IRA estão nos estados de menor PIB, como Maranhão e Amazonas, enquanto os índices mais baixos foram detectados nas regiões metropolitanas de Curitiba (PR) e de Sorocaba (SP).
“Entre todos os municípios analisados, Autazes obteve o IRA mais alto, e Curitiba (PR) o mais baixo. A região metropolitana de Cuiabá apresentou o maior desvio padrão, indicando uma grande discrepância nos IRAs das suas cidades, e a região metropolitana de Sorocaba também mostrou variações significativas”, diz.
A pesquisa é assinada também por Camilla Camilla Bezerra Ferreira de Souza, Daniela Prando da Silva, Gabriela dos Santos Luchetti Vieira, José Arnaldo Frutuoso Roveda e Sandra Regina Monteiro Masalskiene Roveda.
O racismo ambiental é identificado a partir da falta de saneamento básico, coleta de lixo, rede de esgoto e acesso à água potável. No item moradia, envolve pessoas vivendo em favelas e em áreas de encostas e sujeitas a deslizamentos de terra e enchentes.