Um dos maiores mistérios que a ciência agora procura compreender se dá no fato de a imensa maioria da massa usada que saiu as ruas pedindo o impeachment de Dilma com o discurso anticorrupção exaustivamente repetido, agora se cala diante da manutenção – descaradamente comprada – do notório corrupto Michel Temer no poder.
Segundo pesquisas, essa mesma massa de manifestantes não era, pelo menos em sua maioria, identificada com as premissas liberais de redução do Estado. Pelo contrário, eram completamente a favor – e esses eram mais um dos argumentos usados para o impeachment – de maior qualidade, e, portanto, maior investimento, dos serviços públicos como saúde, educação e transporte, encabeçados pelo Estado.
O governo sem quase nenhuma legitimidade popular de Temer aproveita sua não necessidade de reeleição futura e realiza todas as reformas impopulares para o lado de lá da luta de classes tupiniquim. Porém, não é rechaçado com a força devida pois representa – pelo menos diante da ideologia disfarçada e acostumado dos monopólios dos meios de comunicação – o realizador das reformas ditas necessárias para o Brasil.
Isso tudo sugere a reflexão sobre o não-dito ideológico. Em tempos de pós-verdade – também conhecida por pré-mentira, o que não se discute apropriadamente é um projeto de nação brasileira – ou mais especificamente, a falta de um.
Isto é, enquanto o discurso que sustenta a manutenção do golpista vampiresco é a falsa promessa de uma consistente e segura retomada da economia, o não-dito se apresenta como deveras determinante. Todo o manual econômico sugerido pelo garoto favorito dos bancos – Henrique Meirelles – garante apenas um aumento de crescimento para aqueles que já tem sua gorda fatia da economia em seus pratos.
Para além da viabilidade e funcionalidade do plano econômico liberal de desmonte do Estado – pois isso é outra discussão – o que deve ser salientado é a justa ausência duma discussão democrática a respeito do trajeto e do plano de desenvolvimento que o Brasil irá tomar, com esse ou aquele presidente.
Para além de afirmar que a ponte que Michel e sua equipe constroem não é para o futuro – e sim para um passado que deve ser urgentemente superado. E que se trata de um afogamento brasileiro no lamaçal dependente e ultra explorado da periferia capitalista – é preciso também refletir sobre qual seria o discurso predominante na mídia se, por exemplo, reformas estatizantes fossem feitas da mesma forma oligárquica. Isto é, seria cobrado um maior índice de democracia? Temer seria acusado de golpista em qualquer canal de TV? Congressistas que defendem a família e os cidadãos-de-bem derrubariam o presidente?
Enquanto isso, uma ainda tímida alternativa econômica circula no meio acadêmico. O ex-tucano Bresser Pereira, se junta com vários intelectuais, de Ciro Gomes até João Pedro Stédile, para propor um plano econômico chamado Brasil Nação. Fato que, entre tantas questões que surgem, faz de mais pertinente, mais uma vez, a questão da burguesia nacional. Não há exemplos históricos, muito menos possíveis indícios atuais e futuros que alguma parte importante da burguesia tope encabeçar um projeto neodesenvolvimentista.
Para a viabilidade desse projeto se espera como ator principal a burguesia para investir e tomar os riscos do projeto. Seria tolice apostar, mais uma vez, num grande pacto nacional, sendo que por diversas vezes as classes abastadas traíram a nação? Por que o Estado brasileiro perde progressivamente seu papel de investidor? Essa é a hora de apostar num velho novo ator político.
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