Da Redação
MANAUS – Para conter o avanço do contágio pela variante do novo coronavírus, as defensorias públicas do Amazonas (DPE) e da União (DPU) ajuizaram uma ação na Justiça Federal para obrigar o governo federal a comprar, em 30 dias, novas doses de vacina contra Covid-19 para imunizar pelo menos 70% da população de oito municípios do Amazonas.
A ação é assinada pelos defensores Rafael Barbosa, Ronaldo de Almeida Neto e João Luchsinger e tenta viabilizar ‘vacinação extra’ em Manaus, Manacapuru, Tefé, Iranduba, Itacoatiara, Parintins, Coari e Tabatinga. Eles sugerem, como segunda opção, a vacinação em caráter de urgência de pessoas acima de 50 anos. Também propõem a adoção do critério epidemiológico a fim de atender os municípios mais afetados.
“Considerando o estado de calamidade pública em saúde, o mais importante é controlar a circulação viral. Isso só será possível quando parcela significativa da população do Amazonas, em especial nas cidades críticas, estiver imunizada. Na falta de vacina para todos, é necessário que o órgão gestor considere as experiências estrangeiras e as evidências científicas”, afirma Rafael Barbosa.
De acordo com os defensores, caso medidas drásticas não sejam tomadas, “opiniões respaldadas cientificamente prenunciam o surgimento de uma possível terceira onda”. O pedido faz menção a documento elaborado por oito cientistas, a partir de modelo epidemiológico, que assegura que as taxas de transmissão da nova variante, a reinfecção por perda de imunidade após seis meses, e os cenários de vacinação e isolamento social do Estado convergem para, no curto prazo, “uma nova explosão de óbitos na capital e nas principais cidades do Amazonas”.
A iniciativa prevê multa de R$ 200 mil por dia de descumprimento. Segundo os defensores, embora os municípios do Amazonas já tenham recebido doses distribuídas pelo Governo Federal, e tenham dado início à campanha de vacinação, o quantitativo disponível não será suficiente para imunizar nem a primeira fase dos grupos prioritários, que compõem uma pequena parcela da população.
“Sem margem para divergência, certo é que a cobertura vacinal só será realmente eficaz e surtirá os efeitos esperados caso alcance número significativo de pessoas. Somente a partir da ampliação da população-alvo e da intensificação da vacinação será possível pensar na estimada imunidade coletiva pela via vacinal”, diz trecho da ação.
Os defensores justificam a necessidade de amplificar a vacinação, entre outros pontos, em virtude do agravamento do colapso do sistema de saúde, público e privado, causado pelo desabastecimento de oxigênio hospitalar, somado à falta de leitos clínicos e de terapia intensiva, o que “tem abreviado, de forma impiedosa, a vida de milhares de amazonenses semana após semana”.
“Esse conturbado e fatal cenário, testemunhado nacional e internacionalmente, anuncia, com rigor, a imprescindibilidade e a urgência do curso da vacinação na cidade de Manaus e no subconjunto de municípios do interior duramente afetados, na tentativa de que, a partir da imunização do maior número de pessoas possível, a taxa de transmissão seja satisfatoriamente reduzida”, explicam os defensores.
“Manaus já é considerada o epicentro da pandemia e ficará marcada na história não só pela devastação da sua abundante floresta, mas também pelo extermínio do seu povo”, sustentam.
Medida humanitária
Para o epidemiologista da Fiocruz/Amazônia Jesem Orellana, a estratégia de vacinação em massa para Manaus, que alcance 70% da população elegível e no menor espaço de tempo possível, de preferência meses antes do fim de 2021, é medida potencialmente efetiva em termos sanitários, já que contém, ao menos, a circulação viral na cidade e nos municípios em constante contato com a capital.
De acordo com o pesquisador, a medida, “de cunho sanitário e humanitário”, reduz gastos, adoecimento e mortes evitáveis, além de reduzir ainda a chance do aparecimento de novas e ameaçadoras mutações do Sars-Cov-2. “Como também pode oferecer respostas sobre: o processo de imunização e suas repercussões sobre novas variantes; o padrão de reposta imune em pacientes previamente infectados ou não, considerando diferentes cenários de imunização, seja com esquema completo/incompleto; e, também, em relação ao monitoramento robusto de eventuais eventos adversos pós-vacinação”.
Alternativa
“Como única medida capaz de proteger os cidadãos que ainda vivem em Manaus e nas cidades duramente atingidas, para muito além de decretos severamente restritivos – tal como o anunciado em 23 de janeiro de 2021 –, dado que penalizam sobremaneira a população como um todo, mas, principalmente, a mais vulnerável, requer-se a humanitária priorização dos municípios de Manaus, Manacapuru, Tefé, Iranduba, Itacoatiara, Parintins, Coari e Tabatinga na distribuição das vacinas contra a Covid-19 a serem adquiridas pelo Governo Federal”, diz trecho da ação.
O pedido feito à Justiça Federal também lembra que a prevalência da cepa B.1.1.28, em contraste com outras 11 modalidades existentes no Amazonas, “é suficiente para caracterizar o atual momento como merecedor de especial atenção das autoridades sanitárias, até porque, apesar de já dito, os dados comprovam a maior infectividade da variante, o que, por via de consequência, gera quantidade superior de casos notificados, com posterior agravamento e óbito”.