Não sou contra a criação de novos partidos, contanto que sejam formados por conta e risco de seus fundadores, sem um único centavo de recursos públicos. Mas não é o que acontece hoje no Brasil. As pequenas siglas, com uma ou outra exceção, já nascem sob o signo do balcão e de olho no Fundo Partidário, constituído com dinheiro do contribuinte, que distribui milhões e milhões de reais por ano aos partidos com existência homologada pelo Tribunal Superior Eleitoral.
A partir daí, dá-se uma corrida pela conquista de deputados e senadores, cujas novas filiações permitirão auferir um quinhão maior ou menor no orçamento federal. E tudo agora é feito com o aval do Supremo Tribunal Federal. Em decisão fundada em equívoco, o STF admitiu a denominada portabilidade partidária, ao autorizar que os parlamentares carreguem com o mandato para a nova legenda as condições que servem para fixar os índices de partilha do Fundo Partidário. Sem dúvida, a portabilidade, tomada por empréstimo do sistema de telefonia móvel, mostra-se no ponto bem apropriada. Confere ao parlamentar o mesmo direito que concede ao usuário de telefone celular de mudar de operadora a qualquer momento e quantas vezes quiser, precisamente como ocorre no atual quadro partidário brasileiro.
Há um novelo que vai sendo puxado de oportunidades a serem oferecidas aos paraquedistas do Congresso, alternativas todas criminosas, é bem verdade – um escárnio, desde o recebimento direto e em espécie de parte do dinheiro público reservado à nova sigla, até a negociação sobre o comando do partido em seu Estado de origem. No jogo vergonhoso, vale tudo, inclusive compor o governo em suas mais diversas esferas, em ministérios e secretarias, quando o comprometimento político escorre para as bandas do poder federal ou no seu interesse.
Composta a sigla, alicerçada em mandatos nos três níveis da Federação, especialmente no plano federal, conquista-se espaço na televisão, no invejável horário eleitoral gratuito. Trata-se de uma designação indevida, porquanto de gratuito não tem nada, uma vez pago por todos os brasileiros, a preços de horário nobre, apresentados antes ou logo após os telejornais brasileiros. Nem sequer a ideologia e os programas partidários são divulgados no tempo reservado todos os anos a cada organização, em franco descumprimento da lei que instituiu o benefício, prestando-se muito mais à negociações espúrias em nome de objetivos inconfessáveis. Mais um estelionato político, dentre tantos outros propiciados pelo atual sistema partidário, praticado em rede e sem nenhum pudor, via comercialização de horários televisivos com outras legendas ou para atender a projetos de propaganda de candidaturas carentes de projeção nacional.
Agora, com a fundação do tal do Pros e do Solidariedade, já vamos para 32 partidos. O primeiro, obra de um inexpressivo ex-vereador de Planaltina, Goiás, Eurípedes Júnior, aparece na órbita do governo, como linha de transmissão do PT e de outras legendas da base aliada. E o segundo, de autoria do conhecido Paulinho da Força Sindical, desde o nascedouro, já se revela comprometido com a oposição liderada pelo senador Aécio Neves, candidato do PSDB a presidente da República. Vê-se que o vento que venta lá, venta cá; e que o sujo não pode falar do mal lavado, nessa mixórdia geral que caracteriza a ação política e partidária no Brasil.
Estima-se que cerca de 50 deputados adiram a essas siglas, todos do ‘baixo clero’ na Câmara Federal, fato que implicará na destinação de algo em torno de R$ 30 milhões aos seus partidos. Há promessas de toda ordem, tanto do Pros, quanto do Solidariedade, a respeito da transferência de recursos para os diretórios ou comissões provisórias nos Estados. Em tudo isso, o que não se consegue esconder é que essa dinheirama toda, somada a muitos outros cifrões de origens não declaradas, servem para azeitar as contas bancárias dos balconistas de plantão, ao mesmo tempo em que lhes garante uma campanha rica e exitosa.
É por isso que os partidos continuam frágeis e inorgânicos, dos mais importantes aos mais modestos. Não há embasamentos ideológicos ou programáticos que estabeleçam liames firmes com filiados e simpatizantes. E, diante da ausência de compromissos, verifica-se um movimento incessante de entra e sai nas legendas, com a mesma naturalidade de quem chega numa loja para comprar uma camisa.
Poucos conseguem manter alguma coerência partidária e há de contar-se nos dedos de uma só mão aqueles que jamais mudaram de partido no Brasil. Para o troca-troca basta um pequeno desejo contrariado ou uma ambição política de natureza pessoal não satisfeita, em projetos de curto prazo, como ocorre agora com o governador do Ceará, Cid Gomes, seu irmão Ciro, que já passou por uma meia dúzia de partidos, e outros liderados da família. Acabam de abandonar o Partido Socialista Brasileiro, mais uma sigla descartada, subservientes aos esquemas montados com a finalidade de reeleger a presidente Dilma Rousseff.
No outro extremo, o caciquismo interno impede a oxigenação do debate político nos partidos, quase todos comandados por feitores, que agem como senhores absolutos das legendas que controlam como extensão de seus interesses, a ferro e a fogo.