O tema da segurança pública tem suas controvérsias. A questão inicia com a própria concepção de segurança pública. Há doutrina pra todo tipo de interesse. Contudo, é no direito e nas leis que a criatividade doutrinária encontra limite. E o que se pode entender, afinal, por segurança pública em nossa lei maior?
Na Constituição Federal brasileira, segurança é concebida como direito individual (art. 5, caput), direito social (art. 6, caput) e direito “público” (art. 144, caput), cabendo ao Estado o dever de preservá-lo, sem excluir a responsabilidade de todos para com a segurança pública.
Segurança pública é o singular direito que, em regra, infelizmente, só se dá ênfase quando o mesmo é violado, ou seja, quando ocorrem eventos de insegurança. Aí já é tarde. Só resta o tratamento da insegurança, ou seja, a repressão ao dano e à violência sofrida, bem como a responsabilização do(s) autor(es). Por isso, segurança pública é essencialmente preventiva. A repressão só atua nos efeitos. A prevenção possibilita a atuação nas “causas”.
A ação preventiva é fator real e direto de segurança pública. A atuação repressiva trata do combate à insegurança, isto é, da possível responsabilização pela prática ou tentativa do delito, podendo indiretamente contribuir com a segurança, desde que o judiciário decida de forma justa. Reparar o dano, retratar a ofensa, condenar os autores de delitos, executar a pena… tudo isso é necessário e deve ser efetivamente oportunizado pelo Estado, contudo, nada se equipara aos efeitos positivos da prevenção, que a tudo isso pode evitar e contribuir muito mais à segurança pública.
Com respeito à repressão, de acordo com a CF, a apuração ficou a cargo da polícia judiciária (civil, nos estados; federal, à união) enquanto a atuação preventiva e ostensiva coube às polícias militares. Embora a prevenção não seja propriamente nem exclusivamente uma questão de polícia, mas de políticas sociais.
Lamentavelmente, em quase todos dos estados da federação, a polícia militar tem sido descaracterizada e os seus quadros pressionados e constrangidos a fazer um papel que nem sempre é sua atribuição constitucional. Muitas vezes, pressionada para atuar muito mais de forma repressiva do que preventiva, a polícia militar acaba perdendo sua identidade e seu sentido de existir, priorizando uma atuação sobre os efeitos quando deveria primar pela ação sobre as causas, os fatores deflagradores de violência e da criminalidade. Certamente esse é um dos motivos que tem levado diversos movimentos e manifestações da sociedade civil a pleitearem a desmilitarização da policia ostensiva.
Por outro lado, por conta de diversos fatores, dentre os quais os riscos, a falta de valorização funcional e do devido aparelhamento, inclusive na área de inteligência e de capacitação permanente, as polícias judiciárias estaduais tem sido reduzidas à prática de atividades cartorárias e procedimentos de expediente básico.
Portanto, cumpre de modo urgente resgatar o legítimo papel constitucional das polícias, respeitando suas especificidades legais, mesmo que para isso tenham de ser refundadas, a fim de dar efetivo cumprimento ao disposto na CF, especialmente quanto à prevenção e à investigação ou apuração policial, visando colaborar para promover uma ordem social mais livre, justa e segura, essencial à promoção da dignidade humana.
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