Amanhã, dia 09, inicia o período de inscrições para o Enem (Exame Nacional do Ensino Médio), o MEC (Ministério da Educação) estima que na edição deste ano haverá pelo menos sete milhões de inscritos, número que consolida nosso exame como o segundo maior do mundo, perdendo em participantes apenas para o Gaokao, exame chinês que seleciona alunos para o ensino superior. Contudo, na China não temos uma única prova aplicada para os cerca de 10 milhões de participantes, pelo tamanho do território daquele país a logística da avaliação é feita de maneira a dividi-lo em regiões, onde em cada uma delas uma prova diferente é aplicada. Desta forma, podemos dizer que se considerarmos uma prova que seja aplicada a todos os seus participantes, o Enem desponta como a maior avaliação realizada no planeta.
É claro que um exame desta magnitude possui vários desafios: distribuição das provas, locação de espaços, contratação de pessoal para a aplicação, atendimento de alunos com necessidades especiais, correção das redações e, principalmente, segurança contra possíveis fraudes. É fato que desde 2009, ano em que o MEC reformulou o exame para a versão que temos hoje, o Enem vem tentando avançar em cada um desses pontos e nesse sentido muitos recursos foram investidos, prova disto é que todo ano o edital traz modificações em relação ao do ano anterior, no deste ano, por exemplo, a grande novidade é a coleta da impressão digital dos participantes.
Preocupado com a baixa média dos alunos (veja quadro abaixo) o governo federal resolveu contribuir com a preparação daqueles que desejam fazer o exame, para isso criou um projeto chamado “A hora do Enem”, uma ferramenta bem elaborada em que os alunos concluintes do ensino médio têm acesso a uma variedade de opções de estudo, destaca-se dentre elas uma plataforma de aprendizagem adaptativa criada especificamente para desenvolver as habilidades exigidas pelo Enem, o Geekie Games Pro, uma tecnologia altamente sofisticada que já recebeu inclusive premiações internacionais. A TV escola também faz parte do projeto e diariamente exibe programas em que professores comentam questões de edições anteriores do exame, são programas bem produzidos feitos com uma linguagem jovem e acessível a todos que desejam se preparar melhor.
Contudo, neste universo de iniciativas que o MEC tem realizado tentando aprimorar o Enem, e agora também tentando colaborar na preparação dos alunos, um sujeito parece ter sido esquecido em todo este processo, alguém que tem um papel fundamental para que os resultados melhorem: o professor. Se verificarmos os diversos projetos que existem, inclusive aqueles que são capitaneados pelos governos estaduais, nenhum deles atende em larga escala o professor, é como se a preparação dos alunos não implicasse também na preparação dos professores. É claro que alguém pode se perguntar qual a necessidade de atender alguém que via de regra já fez um curso superior, que em tese já está amplamente preparado para ensinar, e que muitas vezes já tem anos de sala de aula. A resposta para todos estes questionamentos é simples, estamos diante de uma nova forma de avaliar, que como já foi dito desde 2009 trouxe um exame totalmente reformulado que engloba aspectos que não eram contemplados antes pelos vestibulares tradicionais.
Neste contexto, é comum ouvirmos professores se lamentando que o Enem é uma avaliação que veio de “cima para baixo”, ou seja, que foi imposta a eles, o que de certa forma é verdadeiro e reflete o sentimento de abandono que estes profissionais vivem, isto tem gerado como consequência uma profunda falta de esclarecimento sobre esta prova, o que em última análise prejudica principalmente os alunos. Neste cenário, é comum encontrarmos nas escolas (públicas e privadas) professores, coordenadores e até diretores cujo conhecimento médio sobre o Enem é muito baixo, que ainda se baseiam nos antigos processos seletivos das universidades locais e deste modo acabam promovendo uma preparação que se distancia da proposta trazida pelo Enem.
A solução para isto passa principalmente pela gestão, as secretárias de educação e as direções de escola (no caso da rede privada) têm por obrigação viabilizar cursos que possibilitem esclarecer gestores, professores e técnicos sobre os aspectos mais relevantes que compõem o exame:
– A importância do trabalho por área de conhecimento;
– O trabalho pedagógico com o desenvolvimento das 120 habilidades previstas na matriz de referência;
– A perspectiva de certificação do ensino médio que a avaliação possui;
– As oportunidades que a participação no Enem proporciona;
– A composição da nota do aluno a partir da Teoria da resposta ao item (TRI);
– Os critérios específicos utilizados na correção da redação;
– As técnicas de elaboração de questões utilizadas no Enem;
– E, prioritariamente, a análise e adequada interpretação dos resultados da escola no exame.
É uma pena que esta situação, que sinaliza um profundo descaso com os professores, reflete duas visões igualmente perversas, a primeira é o entendimento assumido por algumas políticas públicas de que podem produzir resultados sem a efetiva participação docente, o que por si só já é uma visão que reduz a importância do professor. A crença em se trabalhar diretamente com os alunos sem a necessidade de uma mediação parece muito grande, e se isto tem mostrado algum resultado certamente ele poderia ser ainda melhor se tivéssemos a participação dos professores, mas para isso é necessário se investir na formação continuada. A fórmula é bem simples, professores mais esclarecidos podem preparar melhor seus alunos.
A segunda visão decorre justamente da questão “investimento em formação continuada”, incrivelmente as escolas brasileiras não adotam uma política de formação continuada para seus professores, apesar de a lei prever isso, se na rede pública a culpa é colocada na falta de recursos, nas particulares o que falta mesmo é a visão de que isso é algo importante, que de fato produz resultados. Muitas pesquisas contrapõem esta ideia, um mais recentemente da pesquisadora neozelandesa Viviane Robinson, verificou que ao se considerar cinco dimensões da gestão escolar capazes de fazer alunos terem melhores resultados, foi a promoção da capacitação e do desenvolvimento profissional dos professores que se mostrou com maior impacto nos resultados. Veja abaixo.
Ah! Por fim, que fique bem claro que não se deve confundir formação continuada com as semanas pedagógicas que sempre as escolas promovem, a primeira é um processo estruturado para todo o ano letivo que devem ter indicadores de processo e de resultado, já a segunda é algo que ocorre somente no início de cada ano e pelo seu tempo (em geral cinco dias) é insuficiente para se estabelecer um processo em que se se possa alcançar resultados.