Por Vívian Oliveira, do ATUAL
MANAUS – Os protocolos do Programa Nacional de Combate à Dengue estão desatualizadas há 20 anos, afirma Natalia Verza Ferreira, cientista e doutora em genética e biologia molecular pela Unicamp (Universidade de Campinas).
“O princípio ativo dos inseticidas utilizados foi substituído algumas vezes, já que o Aedes aegypti tem desenvolvido resistência aos químicos utilizados em velocidade assustadora. Larvicidas biológicos foram incorporados ao rol de ferramentas, mas dependem da visita de casa em casa ou de equipamentos mais caros de aplicação por aérea, que só têm efeito onde cada gota atinge a superfície e não alcançam o esconderijo das fêmeas para as larvas recém desenvolvidas”, explicou Natalia.
De acordo com o Ministério da Saúde, o número de casos de dengue no Brasil aumentou em 185% entre janeiro e outubro, com 1,3 milhão de notificações. Em 2021, foram registrados 478,5 mil casos. A doença, que pode levar à morte, é transmitida pelo Aedes aegypti, que também é vetor da chikungunya, zika e febre amarela urbana. No dia 20 deste mês de outubro, o Ministério lançou a campanha “Todo dia é dia de combater o mosquito”.
“A melhor forma de atuar no controle do mosquito Aedes aegypti é a prevenção. Não podemos deixar que os ovos se desenvolvam em larvas e estas gerem uma população de mosquitos que cresça e adoeçam as pessoas”, diz Natalia Verza.
A cientista é também diretora-geral da Oxitec do Brasil, empresa que desenvolveu uma tecnologia no controle biológico de insetos para o manejo dessa espécie. Ela pontua que o controle de mosquitos baseado em insetos autolimitantes, como o Aedes do Bem, é uma alternativa para complementar o arsenal, já aprovada para uso no Brasil, mas ainda não adotado pelo PNCD.
Inseto autolimitante consiste na manipulação da genética dos mosquitos-machos que, ao se cruzarem com as fêmeas, limitam o tempo de vida delas fazendo com que somente os machos cheguem à fase adulta, atuando no controle populacional de insetos-pragas de forma sustentável.
“Essa tecnologia foi desenvolvida na Universidade de Oxford, onde cientistas perceberam que os insetos-praga são uma grande ameaça à produção de alimentos, à conservação da biodiversidade e da saúde humana e animal. Eles também notaram que os inseticidas sintéticos eram amplamente utilizados para controle, mas causavam danos ecológicos”, disse Natalia.
O impacto socioeconômico, segundo a cientista, como má formação de bebês, falta nas empresas, autônomos com renda reduzida enquanto se recuperam e alta ocupação dos hospitais, não pode ser banalizada.
“Está nas nossas mãos não apenas limpar nossos jardins, mas também buscar e cobrar soluções comprovadamente eficazes para a questão e nos prepararmos para o controle do vetor na hora certa e não apenas reagir à doença. Caso contrário, estaremos no ano que vem, mais uma vez, assistindo ao mesmo noticiário: mortes, pessoas saudáveis internadas, a falta de leitos e a busca por uma solução que só virá quando tomarmos precauções no decorrer do o ano”, relatou.
“A história tem mostrado que os desafios globais em saúde só são controlados quando novas tecnologias são desenvolvidas para prover soluções que se adequem à realidade da população afetada, e quando o poder público, a iniciativa privada e a sociedade se unem para implementar novas soluções”, concluiu.