Por Nicola Pamplona, da Folhapress
RIO DE JANEIRO-RJ – Dados da ANP (Agência Nacional do Petróleo, Gás e Biocombustíveis) confirmam as queixas do presidente Jair Bolsonaro com relação à falta de repasses às bombas de cortes promovidos pela Petrobras no preço da gasolina e do diesel em suas refinarias.
Na semana passada, segundo a pesquisa de preços da agência, os preços nos postos caíram pela primeira vez em 2019, mas em patamares ainda pequenos: 0,3% no caso da gasolina, que fechou a semana, custando em média, R$ 4,58 por litro; e 0,5% no caso do diesel (R$ 3,778 por litro, em média).
No domingo, 2, Bolsonaro reclamou que os cortes não estavam chegando aos postos e anunciou apoio a projeto de lei para mudar o sistema de cobrança do ICMS sobre os combustíveis, aderindo à proposta defendida pelo setor, mas que enfrenta resistência dos Estados.
Desde o início do ano, a Petrobras promoveu três reduções nos preços da gasolina e do diesel. No primeiro caso, a queda acumulada no ano é de 7%. No segundo, de 10%. Os preços da estatal, porém, representam apenas parcela do valor cobrado nas bombas (30% na gasolina e 54% no diesel).
Os restantes são impostos, custos de transporte e margens de lucro de postos e distribuidoras. O presidente da Fecombustíveis (federação que reúne os postos), Paulo Miranda, diz que é normal que os repasses demorem uma a duas semanas para chegar às bombas, já que distribuidoras têm que se desfazer de estoques. “Os nossos preços estão ligados umbilicalmente aos preços das companhias (distribuidoras). Elas reduzem, nós reduzimos. Elas aumentam, nós aumentamos”, afirmou.
Alvo de Bolsonaro, o ICMS equivale, em média, a 29% do preço da gasolina e 15% do preço do diesel. Já os impostos federais representam 15% e 8%, respectivamente. Um grupo de 22 Estados rechaçou a proposta de Bolsonaro e sugeriu que o governo cortasse sua própria fatia no preço final dos dois combustíveis.
A proposta de cobrar o ICMS em reais por litro, e não sob o atual modelo de percentual sobre o preço final, vem sendo defendida pelas distribuidoras e postos como uma maneira de reduzir fraudes e suavizar o repasse de variações bruscas nos preços internacionais do petróleo.
O tema, porém, é mal visto pelos Estados por reduzir autonomia sobre a arrecadação. Os combustíveis são importante fonte de receita dos governos estaduais e alguns deles apelaram durante 2019 para estratégia de não acompanhar as quedas nos preços de bomba para evitar perda de arrecadação.
Nesta segunda, o petróleo continuou em queda, refletindo temor sobre os efeitos na economia global do surto de coronavírus iniciado na China. O petróleo do tipo Brent, referência mundial negociada em Londres, caiu 3,83%, para US$ 54,45 (cerca de R$ 231) por barril.
Os contratos da commodity entraram no chamado ‘bear market’, quando o pessimismo sobre o ativo leva a queda de 20% sobre o pico anterior. O movimento começou logo após disparada nos preços no início do ano, em função do assassinato do general iraniano Qassem Soulemaini.
Analistas do Citi disseram que a demanda por petróleo deve registrar queda de até 1 milhão de barris por dia no primeiro trimestre e cortaram suas projeções de preços para o segundo trimestre para US$ 50 (R$ cerca de 212) por barril, ou US$ 18 (R$ 76) a menos do que a estimativa anterior.
A situação levou membros da Opep (Organização dos Países Exportadores de Petróleo) a começar a discutir cortes emergenciais na produção, para tentar segurar os preços. Eles avaliam se uma redução de 500 mil barris por dia poderia reverter o movimento atual.
No Brasil, ainda não há clareza sobre a posição da Petrobras, que em outras situações de variação abrupta nos preços internacionais, adotou a postura de esperar o mercado se acalmar antes de decidir por reajustes. Nos dois casos em que o fez durante o governo Bolsonaro, a pressão era altista (primeiro, um ataque a refinarias da Arábia Saudita e, segundo, pela tensão ameaça de guerra entre Estados Unidos e Irã).
“Agora não é evento geopolítico, mas continua sendo um evento que não tem nada a ver com o mercado de petróleo”, diz o consultor Adriano Pires, do CBIE (Centro Brasileiro de Infraestrutura). “Até para manter a coerência, acho que a Petrobras vai segurar um pouco para ver se o cenário vai permanecer”.
Ele pondera, no entanto, que a manutenção de preços altos no país por muito tempo pode abrir espaço para a entrada de combustíveis importados.