É inegável que a revista Veja atuou como cabo eleitoral do candidato Aécio Neves (PSDB) durante todo o processo eleitoral, trabalho que foi intensificado nos últimos dias da campanha do segundo turno. A publicação da reportagem sobre o depoimento de Alberto Youssef, o doleiro preso pela Operação Lava Jato, foi a última cartada da revista na tentativa de influenciar o resultado da eleição.
Na semana que antecedeu o pleito, com a virada nos números das pesquisas de intenção de voto do Datafolha e do Ibope, toda a tropa de choque da revista entrou em ação. O jornalista Augusto Nunes inventou o “DataNunes”, um “instituto de pesquisa” que dava uma vantagem de 10 pontos percentuais para Aécio Neves, quando o Datafolha apresentava Dilma na frente com quatro pontos de vantagem. O argumento do veterano jornalista era de que o Datafolha errou na soma dos números por região, e apresentava um cálculo fantasioso em que aproveitava o percentual de votos identificados pela pesquisa para cada candidato, calculava o número de eleitores que o percentual representava no universo do eleitorado por região (números do TSE) e apresentava um resultado diverso do que apontava o Datafolha. Qualquer estudante de estatística sabe que não se processam os dados de uma pesquisa de forma tão simplória.
Reinaldo Azevedo, outro ícone do jornalismo de Veja, entrava em ação para desqualificar o PT, Lula, Dilma e todos os que o apoiavam. No dia da publicação da reportagem sobre o depoimento de Youssef, Azevedo saiu-se com essa: “A Capa de Veja – Ou: Se Dilma for reeleita, o presidente do Brasil acabará sendo Michel Temer. Ou: Além de dizer que a governanta sabia da roubalheira na Petrobras, doleiro diz que pode ajudar polícia a identificar contas secretas do PT no exterior. Parece que a casa caiu!”. Pregava o impeachment de Dilma.
O que era a reportagem de Veja? Um jornalista da revista disse ter ouvido de alguém que participou do depoimento que o doleiro Youssef disse à Polícia Federal e ao Ministério Público que Dilma e Lula sabiam da roubalheira na Petrobras. E reproduzia uma conversa, que, segundo a revista, fora a conversa travada no depoimento entre o doleiro e o delegado. Youssef dizia: “O Planalto sabia de tudo”, ao que o delegado indagava: “Quem do Planalto?”. “Dilma e Lula”, respondeu o Yousseff.
A regista diz que Youssef não apresentou e nem lhe foi solicitado provas. Se não apresentou provas, que crédito pode ser dada à afirmação? Ele não precisaria ser confirmada? Mas se Youssef realmente disse o que Veja disse que disse, a revista estaria diante de um fato jornalístico, objeto de uma grande reportagem, afinal, trata-se de um escândalo sem precedentes que, se houver conivência da presidente da República e do ex-presidente, eles devem responder pelo crime. Mas o fato é que a Veja não apresentou provas de que Youssef realmente disse.
No caso do depoimento de Paulo Roberto Costa, na delação premiada, os veículos de comunicação divulgaram o áudio da conversa dele com o delegado e o procurador do Ministério Público. No caso do depoimento de Youssef, não há gravação. Veja, nem a Folha de S. Paulo e nem O Estado de S. Paulo, que dizem ter confirmado que Youssef citou Dilma e Lula, apresentaram qualquer prova de que ele realmente disse.
O advogado de Youssef, Antonio Figueiredo Basto, disse não ter conhecimento de que seu cliente realmente fez tal afirmação. “O Beto (Youssef) me disse apenas que tudo ‘vinha lá de cima’, Lamento que esse clima de eleição está gerando loucura no Brasil, muita especulação.”, disse Basto ao Estadão.
Não se trata de aguardar o fim do processo eleitoral para divulgar uma notícia que, certamente, abalaria a campanha da candidata do PT, mas apressar-se para publicar uma informação antes de ter os elementos que possam comprová-la, fere todos os princípios do bom jornalismo.
Mas é compreensivo que a revista Veja tenha tentado sua última cartada para ajudar seu candidato, que foi derrotado nas urnas.
Valmir Lima é jornalista, graduado pela Ufam (Universidade Federal do Amazonas); mestre em Sociedade e Cultura na Amazônia (Ufam), com pesquisa sobre rádios comunitárias no Amazonas. Atuou como professor em cursos de Jornalismo na Ufam e em instituições de ensino superior em Manaus. Trabalhou como repórter nos jornais A Crítica e Diário do Amazonas e como editor de opinião e política no Diário do Amazonas. Fundador do site AMAZONAS ATUAL.
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