Cada vez que eu perdia um gol, deixava quebrar um copo ou me esquecia de passar um recado, sempre tinha alguém para lembrar uma insistente ameaça: “Ih! Vai sofrer muito no Exército!”.
Atualmente, a carreira militar é muito requisitada. Nos EUA, por exemplo, a polêmica da vez envolvendo o presidente Donald Trump é a sua decisão de proibir transexuais de ingressarem nas Forças Armadas americanas. No Brasil de hoje também há muito interesse e disputa entre os jovens por uma vaga militar.
Quando era adolescente, no meu círculo social não era assim. Não sei se era devido a algum trauma com a Ditadura Militar ou se os mais adultos inventaram uma atualização para adolescentes do ‘bicho-papão’. O certo é que o Exército era sempre evocado como algo penoso e ruim. Um ‘lugar’ relacionado à tortura e sofrimento.
Os jovens separados para ‘jurar à Bandeira’ contavam com ar de heroísmo como haviam conseguido ser dispensados e afetavam sabedoria quando davam dicas para outros também atingirem a mesma ‘façanha’.
Uns garantiam que a melhor forma era ir para um município do interior e se alistar lá, pois nesses locais haveria menos vagas para soldados. Outros asseveravam que era infalível usar um calçado grande, tamanho 45, por exemplo. Para os que tinham pés menores, a solução seria preencher o restante do calçado com algodão ou tecidos. A justificativa era que as Forças Armadas não adquiriam botas de tamanho grande e, por economia, o jovem pezão seria dispensado.
Também havia os que aconselhavam algumas atitudes especiais durante o dia da apresentação: caminhar fingindo ter pé torto; ficar tossindo e cuspindo o tempo todo para o oficial achar que o cara era doente; ou, ainda, usar camisa manchada de creme dental, sapato com laços desamarrados e braguilha aberta. Tudo para o selecionador acreditar que o cabra seria desatento e, portanto, não adequado para a vida na caserna. Em caso de desespero, os gestos mais estratégicos seriam ficar ajeitando o cabelo a cada 15 segundos, piscadelas ao recrutador e até desmunhecar.
A escolha de servir ou não o Exército foi decisiva para as carreiras de Elvis Presley e Muhammad Ali. O rei do rock temeu perder seu trono e desaparecer no cenário musical, mas, ainda assim, decidiu prestar o serviço militar. Foi recruta por 17 meses, a maior parte do tempo na Alemanha. Para alguns especialistas, a demonstração de patriotismo não apenas não atrapalhou, mas até teria contribuído com a carreira de Elvis.
Já o boxeador foi incisivo na recusa da intimação: “Eu rechaço ser convocado para as Forças Armadas dos Estados Unidos. Por que me pedem para vestir uma farda, viajar 10 mil quilômetros e matar vietcongues, se eles nada fizeram de mal para mim? Nunca fui chamado de crioulo por um vietcongue”, disse Ali.
Ali foi bastante criticado inclusive por atletas que foram combatentes de guerra. Como consequência da recusa foi condenado a cinco anos de prisão e US$ 10 mil. Pagou a fiança e permaneceu livre devido aos recursos impetrados por seus advogados. A maior punição, porém, foi a perda do título mundial e de sua licença para lutar.
Há pouco tempo, um jogador brasileiro de futebol passou por uma situação tragicômica envolvendo questões como patriotismo e oportunidade de carreira. Paulista de Mogi das Cruzes, o meia Edmar, 34 anos, é desconhecido no Brasil, mas estava fazendo muito sucesso na Ucrânia. Por isso, depois de vários anos morando no país europeu, foi natural pensar na naturalização como forma de conseguir participar de competições como a Copa do Mundo.
A questão é que a Ucrânia é um país envolvido com conflitos bélicos, causados por disputas territoriais e grupos separatistas.
Assim, quando chegaram os documentos de convocação, é muito provável que esse brasileiro “que amava os Beatles e os Rolling Stones” tenha se lembrado de Elvis Presley e Muhammad Ali. Possivelmente, também pensou em adotar atitudes como usar sapato 45 com laços desamarrados, camisa suja de pasta, andar torto e desmunhecando.
Em mais uma demonstração de que brasileiro não deve contar com a sorte, o que aconteceu foi que Edmar não foi chamado para a seleção de futebol de lá. Ele foi convocado pelo Exército da Ucrânia para lutar numa guerra.
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