Pro Rosiene Carvalho, da Redação
MANAUS – A ex-ministra do TSE (Tribunal Superior Eleitoral) Maria Thereza de Assis Moura, antes de terminar o mandato, sinalizou que o governador José Melo (Pros) pode ter razão no argumento de que o processo dele tramitou irregularmente no TRE (Tribunal Regional Eleitoral) do Amazonas.
As sinalizações, nada sutis, estão na decisão em que a ministra Maria Thereza concedeu ao vice-governador Henrique Oliveira (SD) uma medida cautelar garantindo a ele a participação nas eleições municipais deste ano sem que sua condição de elegível fosse questionada pela Lei da Ficha Limpa, apesar da cassação colegiada no TRE em janeiro deste ano. Henrique pediu a liminar quando o recurso contra a cassação subiu ao TSE. (Saiba mais)
Em um dos trechos da decisão, a ministra indica que o TRE assumiu risco de “evidente e realçado” cerceamento de defesa. Seu ponto de vista é exposto quando ela se refere à negação de perícia nos recibos apreendidos no dia em que Nair Blair foi presa, a quem qualifica como “suposta” agente da compra de votos.
As referências da ministra ao caso animaram aliados do governador sobre as chances de ele reverter a cassação no TSE. Esses aliados já apostavam fichas na continuidade de Melo no governo, mesmo casado, por causa da morosidade natural de um processo deste tipo em Brasília.
Entre os aliados de Eduardo Braga (PMDB), a expectativa é de que os ministros do TSE não ignorem o “acervo” de provas da “interferência que o abuso do poder econômico provocou” nas urnas em 2014 no Amazonas.
Maria Thereza deixou o TSE no final do mês passado e o processo de Melo, ao ser redistribuído, recebeu como novo relator o recém-empossado no tribunal, ministro do STJ Napoleão Nunes Filho.
Mesmo com a saída da ministra, o posicionamento anima os aliados do governador e do vice por dar a primeira pista de como os julgadores em Brasília enxergam o caso, que já recebeu parecer do Ministério Público pela manutenção da cassação.
Detalhes da decisão
No texto da decisão, Maria Thereza dá dicas de como avalia a principal tese de defesa de Melo: produção e perícia de provas e outras questões técnicas da tramitação de processo na Justiça Eleitoral não foram regulares. A defesa de Melo em Manaus e em Brasília tenta anular o caso com base nessas questões, que são analisadas preliminarmente antes dos julgadores verificarem o mérito da denúncia.
Quando relata o pedido apresentado por Henrique Oliveira, em vários trechos a ministra deixa sua impressão. O primeiro é no indica que o requerimento de perícia da defesa estava “devidamente justificado”, mas foi indeferido pelo TRE.
“Sustenta a ocorrência de cerceamento do direito de defesa, haja vista ter sido indeferido pelo Tribunal a quo requerimento, devidamente justificado, para a realização de perícia grafotécnica, que tinha por finalidade atestar a autenticidade dos elementos coletados em busca e apreensão realizada em diligência policial”.
Em seguida, a ministra, ainda se referindo à perícia nos recibos apreendidos no dia em que Nair Blair foi presa, indica que a negação do pedido se expôs à “evidente e realçado” cerceamento de defesa. Maria Thereza se refere ainda a Nair Blair como “suposta portadora” dos recibos.
“O pedido de perícia grafotécnica requerido pelo governador e pelo ora recorrente, a despeito do evidente e realçado perigo de cerceamento de defesa, foi indeferido ao argumento de ter sido genericamente formulado e, também, não ter havido incidente de falsidade ou alegação de inautenticidade por parte de Nair Blair, suposta portadora dos inúmeros escritos”.
No julgamento do TRE, a empresária foi tratada como a receptora de dinheiro público desviado para a empresa dela por contrato fraudulento e, segundo a investigação da Polícia Federal, como uma pessoa que representava o governador em reuniões de campanha. Os recibos indicavam os repasses de dinheiro aos eleitores.
Em outro trecho, a ministra qualifica a ação policial que apreendeu as provas como “conturbada” e afirma que não foram apontados nenhum dos “alvos” da compra de votos. Indicando que foram dentro desses parâmetros que as provas foram usadas para invalidar os votos recebidos de forma legítima nas urnas.
“O pleito probatório foi satisfatoriamente fundamentado eis que os documentos que se pretendiam alçar à condição de prova eram atribuídos e foram encontrados com terceiros em uma conturbada diligência policial em que sequer foram identificados possíveis alvos da suposta compra de votos que, todavia, poderiam assumir relevo a ponto de alcançar os mandatos legitimamente obtidos nas urnas”.
A ministra também revela o seu estranhamento em relação à forma como foi designado o relator definitivo do processo de cassação no TRE. E expõe isso colocando em letras maiúsculas que a redistribuição se deu unicamente por ato da secretaria ao invés de voltar ao relator inicial do caso.
“Por fim, o voto-vista indica que, em 24/11/2015, os autos foram novamente redistribuídos ao Dr. Francisco Marques, com alegado fundamento no art. 132 do Código de Processo Civil, POR ATO DA SECRETARIA (fls. 1731) e, em 02/12/2015, foi determinada a inclusão do feito em pauta de julgamento. Defende, outrossim, ser aplicável o disposto no art. 245 do Código de Processo Civil, que afasta a preclusão quando a parte prova o legítimo impedimento de arguir a nulidade, pois não houve publicação dos atos de redistribuição nem se deu ciência inequívoca por outros meios.”
Após toda essa exposição, a ministra afirma que o direito de Henrique é plausível e também destaca que tudo que consta no processo, mérito e preliminares, será reanalisado pelo TSE. Ou seja, tudo o que foi decidido no TRE do Amazonas pode ser revisto em Brasília.
“Em relação à plausibilidade do direito invocado, deve-se salientar que o recurso ordinário se reveste de ampla devolutividade e, considerando os fatos e fundamentos deduzidos nas razões recursais, entendo ser prudente a concessão da cautela para suspender a inelegibilidade do ora recorrente Henrique Oliveira até a publicação do decisum que julgar o recurso interposto contra o acórdão do TRE/AM”.
Quem atira pedras no governador eleito José Melo, deveria tirar primeiro a trava dos seus próprios olhos.