Por Valmir Lima, da Redação
MANAUS – As decisões do TCE-AM (Tribunal de Contas do Estado do Amazonas) no julgamento de prestação de contas dos gestores tem gerado, nos últimos anos, manchetes espetaculares, mas na prática, as condenações geram pouco efeito prático. Semanalmente, assistimos aos conselheiros condenarem prefeitos, ex-prefeitos, presidentes de câmaras de vereadores, secretários e ex-secretários a devolver e pagar multas que somadas atingem quase meio bilhão por ano. Quase nada desses valores retornam, de fato, aos cofres públicos.
Pior do que isso: há total falta de controle sobre a cobrança das dívidas. O TCE-AM só pode cobrar administrativamente os valores referentes às multas, e o dinheiro entra por uma conta da Sefaz-AM (Secretaria de Fazenda do Estado do Amazonas). Os débitos gerados a partir de condenações por não comprovação dos gastos – chamados tecnicamente de “alcance e glosa” –, são cobrados dos gestores pelas procuradorias do Estado e dos municípios. É aí que os maus administradores se dão bem. Quase ninguém paga a dívida e as informações sobre as cobranças são guardadas a sete chaves.
Números impressionam
O ATUAL solicitou ao MPC (Ministério Público de Contas junto ao TCE) , com base na Lei de Acesso à Informação Pública, os valores de multas e débitos por condenações de gestores nos últimos anos no tribunal. Como os dados não estavam organizados, o MPC pediu 15 dias para responder e forneceu um levantamento dos últimos dois anos: 2016 e 2017.
No ano passado, foram julgados 300 processos. Desse total, quase metade das contas – 135 – foram julgadas irregulares; outras 137 foram consideradas regulares com ressalvas e apenas 28 passaram no crivo dos conselheiros, ou seja, foram julgadas regulares.
As condenações e as contas com ressalvas geram R$ 3.178.572,74 em multas e débitos de R$ 315.486.687,41. Total de débitos e multas: R$ 318,6 milhões.
Em 2016 foram julgados 367 processos dos quais 153 foram contas reprovadas ou irregulares. As regulares com ressalva somaram 181 processos. Apenas 33 foram aprovadas sem qualquer problema.
As condenações e as ressalvas geram R$ 17.530.795,03 em multas e R$ 386.709.004,47 em débitos por não comprovação dos gastos. A soma desses valores: R$ 404,2 milhões.
Quanto foi pago
Quase nada voltou aos cofres públicos. As informações sobre a cobrança dessas dívidas é tão obscura quanto os labirintos do poder político no Amazonas. Apenas o TCE tem o controle do que é cobrado administrativamente das multas. No ano passado, no entanto, apenas 17% das multas aplicadas foram pagas diretamente ao tribunal: R$ 544,7 mil de R$ 3,1 milhões. Em 2016, apesar de os gestores pagarem R$ 807,3 mil em multas, isso representou apenas 4,6% dos R$ 17,5 milhões em multas aplicadas naquele ano.
A informação que a reportagem obteve com técnicos do TCE e do MPC é de que apenas as multas menores, de até R$ 15 mil em média, são pagas administrativamente. As maiores e os débitos só são pagos pela via judicial, quando há condenação dos gestores. E essa cobrança, como foi dito anteriormente, é feita pelas Procuradorias Gerais tanto do Estado quanto dos municípios.
O TCE encaminha às procuradorias as informações e documentos sobre as condenações e os débitos e não tem mais qualquer controle sobre quem paga e quem não paga o que deve aos cofres públicos.
No Portal da Transparência do Governo do Amazonas há uma rubrica em receitas chamada “Multas Aplicadas pelos Tribunais de Contas”. É lá que estão registrados os valores que o TCE-AM conseguiu receber das multas.
Segredo de Estado
A reportagem recorreu primeiro à Sefaz para saber se havia uma rubrica na secretaria por onde entrava a receita gerada a partir da cobrança de débitos. A assessoria de comunicação, depois de consultar os técnicos, informou que não havia e que a informação quanto o Estado recebe desses valores deveria ser buscada na PGE (Procuradoria Geral do Estado).
A reportagem fez, primeiro, um contato telefônico com a assessoria de comunicação da PGE e explicou em detalhes o teor da reportagem e as informações que buscava junto à procuradoria. A assessoria então, pediu que fosse enviada a solicitação por e-mail. No entanto, a resposta da PGE não responde à questão central: “quanto o governo consegue recuperar dos débitos gerados a partir das condenações do TCE?”.
Portanto, a única informação concreta é de que o TCE, em 2016 e 2017 aplicou multas e condenou gestores a devolverem ao Estado e aos municípios R$ 722,9 milhões e recebeu R$ 1,3 milhão. Ou seja, 0,18%.
Perguntas e respostas
Para quem se interessar, publicamos abaixo o e-mail enviado à PGE e as respostas enviadas pala assessoria.
Pedido do ATUAL
Conforme contato telefônico, o Amazonas Atual está fazendo matéria a respeito de débitos gerados a partir de decisões do Tribunal de Contas do Estado do Amazonas, que incluem multas e alcance/glosa (dinheiro que o gestor é obrigado a devolver por não comprovar os gastos ou por má aplicação dos recursos públicos).
Conforme informações do TCE, em 2016 o montante de débitos foi de R$ 404 milhões, sendo R$ 17,5 milhões em multas e R$ 386,7 milhões em alcance/glosa. Em 2017, foram 318 milhões, sendo R$ 3,1 milhões em multas e R$ 315,6 milhões em alcance/glosa.
Nesses anos, o TCE recolheu em multas (o tribunal de contas só é autorizado a receber valores referentes a multas) R$ 807 mil em 2016 e R$ 544 mil em 2017.
Conforme os técnicos do TCE, os valores não pagos e os alcance/glosa são cobrados pelas procuradorias do Estado e dos municípios. Essa mesma fonte informa que o TCE, atualmente, não tem o controle do montante que o governo e as prefeituras municipais conseguem recuperar desses débitos, grande parte cobrado pela via judicial.
Como fomos informados de que a Sefaz tem, no portal da transparência do Estado, uma rubrica em Receita (rubrica 19194800) chamada Multas Aplicadas pelos Tribunais de Contas, consultamos a Sefaz-AM sobre se havia uma rubrica que acusasse a receita advinda das dívidas cobradas a partir das decisões do TCE. A informação obtida na Sefaz foi de que não havia essa rubrica e a informação sobre os valores recolhidos de multas, alcance/glosa é de responsabilidade da Procuraria Geral do Estado.
Portanto, recorremos a esta assessoria para pedir as seguintes informações:
- Como são cobrados os débitos gerados a partir de condenações do TCE-AM no julgamento das contas dos ordenadores de despesas de órgãos estaduais?
- Qual o número de ações judiciais para cobrar esses débitos?
- A PGE tem o valor aproximado cobrados nos últimos anos?
- Quais os valores que a PGE conseguiu recolher, a partir de acordos ou decisões judiciais nos anos de 2016 e 2017?
- Como é feito o pagamento? A Sefaz é quem recolhe os valores pagos pelos gestores quando esgotada a tramitação do processo ou quando há acordo entre as partes?
Ficamos à disposição para quaisquer esclarecimentos e aguardamos as respostas aos questionamentos.
Cordialmente,
Valmir Lima
Resposta da PGE
“Oi Valmir, bom dia
Seguem as respostas da PGE:
1 – Os débitos quando a partir de condenação do Tribunal de Contas do Estado/TCE-Am, são objeto de inscrição em dívida ativa
2 – Cada débito gera uma Certidão de Dívida Ativa, que gera uma execução fiscal feita através da especializada Procuradoria da Dívida Ativa (Prodace) – PGE, em nome da Fazenda Pública, não sendo possível identificar o órgão.
3 – Especializada Procuradoria da Dívida Ativa (PGE)
4 – Depois do ajuizamento, não sabemos se é possível separar por órgão o resultado.
5 – Depois do ajuizamento, se houver acordo, é feito pela Coordenadoria de Parcelamento da PGE.
Se for pagamento em juízo, o repasse é feito ao Erário (Conta Única do Estado), mediante quitação da Guia da Certidão de Dívida Ativa.”