SÃO PAULO – O problema de Hollywood com as adaptações de jogos de videogames ainda é tirar do jogador (ou do espectador) a capacidade de controlar algo da história desenvolvida ali, diante dele. Muda-se a posição do público, de ativo para passivo. Embora em grande parte dos games seja necessário seguir uma trama ou uma linearidade mínima, é o jogador que conta a própria história. Se não consegue vencer certo adversário ou realizar alguma tarefa, o jogo empaca. Está aí, no desafio, na conquista, parte da graça da imersão em diferentes realidades dos games.
O cinema oferece a imersão, o deslumbramento, os saltos de tirar o fôlego, mas já não há consequências – se determinada ação não der certo, o espectador não precisará voltar ao início da fase para recomeçá-la.
Assassin’s Creed, que estreia nesta quinta-feira, 12, nos cinemas do Brasil, para quem está com o joystick nas mãos, é uma viagem ao passado muitíssimo bem feita, cheia de ações furtivas, missões difíceis, assassinatos planejados e fugas espetaculares. Tudo dará certo se o jogador tiver agilidade suficiente nos dedos. Nas telonas, tudo fica a cargo de Michael Fassbender, o assassino que volta ao corpo do antepassado para reviver suas aventuras e trazer informações que podem mudar o nosso presente. Se ele se esborrachar após um salto mal dado, será o rostinho bonito dele, exibido muito mais vezes do que de qualquer personagem dos jogos, que estará em risco.
Ao tirar o protagonismo de seus jogadores, o que resta são tramas frágeis demais para o cinema. Existem exceções, obviamente, mas Super Mario World seria apenas sobre um encanador barrigudo que tem dificuldades em saltar tartarugas e recuperar uma princesa. Assassin’s Creed, por exemplo, cairia no marasmo da repetição. E é o que acontece nas telonas.
Provavelmente uma hora do filme é dedicado à corridas, fugas espetaculares, saltos impossíveis e por aí vai. Se já imaginamos que Fassbender vá durar até o fim do filme, contudo, ninguém perderá o fôlego na iminência do perigo. Se fosse para ter essa experiência, era só chamar alguém para jogar o seu Assassin’s Creed e ficar ao lado, sentado no sofá assistindo.
Pode até ser que o filme não fosse bom, mas em O Mundo de Warcraft, o diretor Duncan Jones esforçou-se para criar, no cinema, a linguagem do game. Justin Kurzel não vai por esse caminho em Assassin’s Creed. Do game, ele pega o conceito da ficção científica, que concilia com uma aventura na Espanha da Inquisição, e do cruel Torquemada. Cal/Michael Fassbender viaja na máquina do tempo criada pela cientista Marion Cotillard. Ela é uma sonhadora. Quer erradicar a violência no mundo e o pai, Jeremy Irons, se aproveita disso.
Enredo
A trama foi adaptada para o cinema. No invento de Marion – a máquina chamada Animus -, Cal vai em busca de um ancestral, Aguilar. O que ele não sabe é que Aguilar foi o último homem a colocar as mãos na lendária Maçã do Éden. Marion acredita que, com o artefato, poderá criar um admirável mundo novo de paz. Cal é assassino condenado à morte.
Vive atormentado porque seu pai matou a mãe em nome do Credo dos Assassinos, ou assim crê. Odeia o pai, a sociedade secreta. A viagem no tempo, em que seu DNA bate com o do ancestral, vai lhe fazer descobrir o significado do Credo. E resolver o enigma da própria identidade.
Mas isso é metade da equação – Marion, a dra. Sophia Rikkin, trabalha para uma empresa bilionária a serviço dos Templários e, ao longo do tempo, as duas sociedades têm lutado pela Maçã. Os Assassinos defendem o livre arbítrio. Os Templários não creem na humanidade e querem dominá-la pela força. Esse é o contexto e a narrativa salta da Espanha do século 15 à de 2016, passando pela Califórnia de 1986. Kurzel coloca na boca da templária Charlotte Rampling sua explicação para a ‘direitização’ do mundo. O homem abriu mão da liberdade. Só quer consumir, ter segurança, ser guiado. A saga – no cinema – está recém começando. Termina em aberto, à espera de que o sucesso viabilize o investimento no 2, no 3.
Assassin’s Creed é um filme grande, não um grande filme. Eventualmente, diverte. Os livros são muito melhores.