Por Rosiene Carvalho, da Redação
MANAUS – Os 12 municípios atingidos pelo projeto de agrupamento de comarcas do TJAM (Tribunal de Justiça do Amazonas) juntos somam 84.153 eleitores habilitados ao voto e, em 2014, escolheram representantes na ALE (Assembleia Legislativa do Estado) que até agora silenciaram sobre a proposta, evitando confronto direito com o Judiciário. Procurados pelo ATUAL, deputados evitaram questionar o tribunal, mas manifestaram opiniões divergentes sobre os efeitos da medida no interior do Estado.
Os deputados estaduais mais votados em 2014 nos municípios sob ameaça da reedição do projeto de fechamento de comarcas do TJAM foram: Abdala Fraxe, do PTN (Amaturá e Pauni); Ricardo Nicolau, do PSD (Atalaia do Norte e Ipixuna); Sidney Leite, do Pros (Canutama, Juruá e Jutaí); Luiz Castro, da Rede (Envira); Belarmino Lins, do Pros (Itamarati); Alessandra Campêlo, do PMDB (Japurá) e Adjuto Afonso, do PP (Pauini e Santa Isabel do Rio Negro).
Seis anos após a primeira ameaça de fechamento de comarcas pelo Poder Judiciário do Amazonas e aumento de gastos da Justiça Estadual, o TJAM assumiu que municípios do interior não têm juízes há anos e propõe, por meio da fusão de comarcas, que 12 cidades tenham juízes apenas dez dias por mês. Os municípios escolhidas por apresentarem baixa demanda de processos têm os piores índices de desenvolvimento humano do País.
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Os mais votados
Os votos dos eleitores desses municípios foram decisivos para a eleição de pelo menos sete deputados estaduais. Em reunião com o presidente do TJAM, desembargador Flávio Humberto Pascarelli, segundo a coordenação do projeto no tribunal, os parlamentares questionaram apenas a mudança de nome denominação, o que foi avaliado como um pedido possível e atender. O TJAM queria transformar as comarcas em “termos”.
Apesar dos nomes citados acima aparecerem como os mais votados nas 12 cidades, outros deputados estaduais aparecem na lista dos três mais votados em vários deste municípios. Veja lista completa abaixo.
Representação
O cientista social e mestre em Sociologia pela Ufam Davyd Spenser Ribeiro de Souza questionou porque o TJAM não consulta a população dos municípios atingidos pela proposta. Para ele, ouvir deputados estaduais não legitima a decisão porque o Poder Legislativo vive um período de representação de interesse de corporações e não da população.
“O Poder Legislativo, que vive este momento de homenagens e honra ao mérito a quem não merece, não tem credibilidade e preparo para dar aval a este tipo de decisão. Há muito interesse corporativo de grupos privados no Poder Legislativo”, afirmou.
Belarmino Lins
O deputado estadual Belarmino Lins (Pros) afirmou a questão é interna do TJAM e compreende as necessidades do tribunal. Mas, ressaltou que, será um retrocesso para os município
“O projeto tem argumentos fortes do ponto de vista da economia, resolutividade, racionalidade para o Judiciário. Do ponto de vista do meu entendimento, do simbolismo no interior do Amazonas: é extremamente prejudicial. Os municípios que conquistaram comarcas voltarem a ser termos significa que ao invés de andar para frente, andarão para trás. Mesmo mantendo o nome comarca”.
Belão, como é conhecido, disse que já foi procurado por lideranças política e pela própria população, que não aprova a medida. “Não ignoro que o tribunal esteja procurando fórmulas de economicidade e praticidade em razão do momento atual. Mas do ponto de vista do municipalismo, tirar a competência de comarca para voltar a ser termo ou vincular a decisão para outro município é um retrocesso. O Poder Judiciário tem respeito. No município que a população sabe da presença de um juiz, o quadro é outro. Outro clima. Quando se chega num município que não tem nem juiz e nem promotor, aí é uma esculhambação”.
Luiz Castro
Ao ser questionado sobre o tema, o deputado Luiz Castro relatou o que ocorreu na reunião com o presidente do tribunal, Flávio Pascarelli, em abril, e elogiou o gesto do desembargador de procurar a ALE para apresentar a proposta.
“Na reunião, houve um entendimento consensual de alteração do texto da proposta. Ao invés de extinguir as comarcas, que duas comarcas possam subsistir com um mesmo magistrado atuando, até que haja número suficiente de magistrados para designar individualmente por comarca. Nossa preocupação era que não ocorresse extinção de comarcas e cartórios, o que seria um retrocesso muito grande”, disse.
Ricardo Nicolau
O deputado Ricardo Nicolau afirmou que é a favor da medida do TJAM e considera que a mesma será melhor para a população porque levará maior eficiência nas ações do judiciário no interior.
“Há alguns anos, tinha uma perspectiva de se unir, então o cidadão teria que sair de um município para ir a outro. Na ocasião, houve uma união do Governo e da ALE, que abriram mão de parte de seus recurso, repassando para o tribunal manter o serviço no local. Esta proposta (atual) não tira o serviço do local apenas reorganiza para garantir que haja juiz, defensor e Ministério Público. Há municípios com demanda maior e outros com demanda menor”, disse.
Nicolau afirmou que não recebeu nenhuma reclamação de sua base sobre a proposta. “Acredito que tenham entendido o alcance e que vai dar maior efetividade”, afirmou.
Adjuto Afonso
O deputado estadual Adjuto Afonso (PP) disse que a maior preocupação dele é quando imagina como a medida será efetivada na prática, considerando que hoje com todas as comarcas instaladas mesmo com juiz designado não há a presença de magistrados no interior. “Imagina se um juiz responde por mais de um município (…) Se o tribunal fizer isso e determinar que os juízes precisam passar 30 dias no interior percorrendo as comarcas dos municípios que estiverem naquele agrupamento, aí eu concordo. Lá em Lábrea teve uma rebelião em abril e o juiz não estava lá”, disse.
Adjuto afirmou que mesmo com a crise econômica não é certo deixar os municípios sem juízes. “O Poder Judiciário alega que não tem recurso, a mesma coisa que a Defensoria. Eu não conheço o recurso que o poder tem. O certo é que não deveria deixar o interior desassistido. Aqui na cidade as pessoas têm para onde apelar, até para os veículos de comunicação. Mas no interior, não”, afirmou.
Abdala Fraxe
O deputado estadual Abdala Fraxe (PTN) afirmou que diariamente recebe reclamações de pessoas do interior a respeito do projeto e quando questionou o TJAM sobre o assunto recebeu respostas técnicas que demonstraram para ele a necessidade do agrupamento das comarcas.
“Evidentemente que nenhum município quer ficar sem sua comarca. Acredito que lá eles devem ter critérios se pode manter a mesma estrutura ou se pode agrupar com o município vizinho. Acho que o que importa neste momento é o tribunal ter consciência do que pode ser feito. Não adianta se manter uma estrutura que não se pode pagar”.
A reportagem questionou Abdala a respeito de informação prestada pela coordenação do projeto de que com as diárias a implantação poderia representar aumento de gastos. “É… onde fica a economia? Talvez seja com pessoal de cartório, aluguel”, disse.
Mais uma vez o deputado foi informado pela reportagem que a informação da coordenação do projeto é que a estrutura física e de funcionários seria mantida nos municípios. “Foi dito isso que não vai fechar a estrutura? Onde vai ser essa economia?… Fica complicado. Se não forem devolvidos os prédios, se não houver economia de água e de luz e se a diária for representar maior gasto, aí, do ponto de vista do bom senso, não caberia…”, afirmou.
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