Por Rosiene Carvalho, da Redação
MANAUS – O julgamento do processo que pede a segunda condenação de cassação do governador José Melo (Pros) no Tribunal Regional Eleitoral (TRE) do Amazonas exibiu, na quarta-feira, 24, novo episódio de ataques entre os membros da Corte. Desta vez, o relator e desembargador João Simões declarou que decisão do TRE, caso não condene Melo, abre uma “porteira” para ações ilegais em eleições no Estado.
O relator chegou a ironizar a ingenuidade dos membros que não veem no processo graves irregularidades na campanha e insinuou que o colegiado pode cometer ato de insanidade, autorizando e até propondo campanha com uso de repartição e dinheiro públicos.
“Eu entendo, data vênia, que se este tribunal afastar essas condutas vedadas, esses abusos, a partir deste pronunciamento, nós vamos aqui autorizar, veja bem, vou frisar, vamos aqui autorizar a propaganda eleitoral nos locais em que se presta serviço público e isso é grave. Isso não é pouco não. Isso é muito grave”, afirmou Simões.
De forma veemente, o desembargador exortou os membros do TRE a usarem a sanidade e a consciência no julgamento do processo de Melo: “Como é que nós vamos, em sã consciência, no decorrer da prestação de um serviço executado fora das repartições públicas normais, em serviços móveis tanto que o nome é Odontomóvel… Vou destacar as premissas desse serviço: executado sem antes estar programado. Eu penso que com fins eleitorais. Primeiro destaque. Com gravação periciada, pelo menos três servidores públicos estavam com o número 90. Estão lá as ditas praguinhas. Aí disse o nosso ilustre doutor (jurista Felipe) Thury: ‘mas isso não quer dizer que estavam pedindo voto.’ Desculpe mas o que é preciso mais para se pedir voto?”, argumentou Simões.
A reação de João Simões ocorreu após o jurista Felipe dos Anjos Thury proferir terceiro voto contrário ao entendimento do relator e indicando que as sete denúncias apresentadas na AIJE (ação de investigação judicial eleitoral) não têm provas ou ações irregulares o suficiente para influenciar no resultado do pleito de 2014, indicando assim a absolvição do governador e seu vice, Henrique Oliveira (SD).
Thury leu voto longo analisando, em detalhes, cada ponto levantado durante as sessões anteriores em que o processo foi e voltou a julgamento, nos últimos dois meses. Em alguns pontos, Thury sustentou que condenar o governador à cassação pelos fatos relatados seria uma dedução porque não havia prova concreta de que o dinheiro repassado ilegalmente à empresa ANSD, da empresário Nair Blair, tenha sido usado para a compra de voto.
Simões demonstrou irritação à insinuação de que o voto dele, que é pela cassação de Melo, foi dado com base em ilações e deduções. “Não se pode admitir em sã consciência, num programa do Estado, bancado com dinheiro público se faça propaganda eleitoral. Vamos admitir isso? É isso que está sendo proposto aqui? Não vou concorda com isso (…) Eu não cuidei aqui de situações que são meras presunções ou meras conjecturas ou meras ilações. Como se eu tivesse aqui como relator buscado isso do nada. ‘Vou presumir uma situação vou fazer conjectura, agora’. Não foi assim não. Não foi assim, mesmo”, declarou.
João Simões que, a cada voto contrário ao seu, faz novo memorial dos detalhes das acusações contra Melo, voltou a relatar os atos irregulares do governo para contratar a ANSD de Nair Blair de forma fraudulenta, a movimentação do dinheiro e as várias citações e gravações em que a empresária é apresentada como pessoa da confiança do então candidato à reeleição.
Simões ironizou a ingenuidade dos membros que não veem no ato irregularidades. “Ninguém está inventando aqui o pagamento. As anotações que estão aqui. Também ninguém é ingênuo. Se esses recibos existem é porque alguma coisa aconteceu. Não estamos fora do mundo para entender diferente”.
O relator destacou as datas em que o dinheiro é repassado, em dissonância com as datas dos jogos e consonância com a campanha. O relator frisou, ainda, detalhe do voto de Thury em que o jurista admite que R$ 77 mil do valor da conta da ANSD foram usados na campanha do governador.
“Já que estavam em poder desta senhora e não é pouca coisa, não. Dizer que R$ 77 mil não é nada, não é capaz de influenciar. (…) O meu receio é que a partir desde julgamento estejamos abrindo uma porteira, não é a porta não, uma porteira, como diz a linguagem popular. Onde passa um boi, passa uma boiada”, afirmou.
Ataques anteriores
No dia 11 de julho, troca de farpas entre advogados com insinuação de incompetência da defesa, alerta do Ministério Público para falta de boa fé na decisão do TRE e obstrução de vários processos com a certeza de reforma das decisões no TSE (Tribunal Superior Eleitoral) marcaram a sessão em que o mesmo processo estava sendo julgado.
Na ocasião, o julgamento foi suspenso pela terceira vez. Os posicionamentos demonstraram como a guerra jurídica entre o governador José Melo e o senador derrotado nas urnas Eduardo Braga (PMDB) respinga na imagem dos profissionais da lei.
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Desembargador João Simões, merece nosso respeito,esse tem que ser aplaudido