Por Henderson Martins, da Redação
MANAUS – Após ser vítima de injúria racial, dentro do ambiente de trabalho, a enfermeira Francineth Santos Júnior, prestou depoimento na manhã desta quarta-feira, 21, no 24° DIP (Distrito Integrado de Polícia), localizando na avenida Lourenço da Silva Braga, na Manaus Moderna, zona central de Manaus. De acordo com a enfermeira, o fato aconteceu no dia 10 de janeiro de 2018, no Hospital São Lucas, localizado no Bairro Nossa Senhora de Aparecida, quando cumpria as normas internas da emergência pediátrica do hospital.
“O segurança do hospital deixou duas pessoas entrarem no setor de medicação pediátrica (a norma do hospital, diz que todo paciente tem direito a um acompanhante), nesse dia entrou o pai e a mãe do paciente e como a criança estava chorando bastante, deixamos ficar um pouco até a criança acalmar, quando isso aconteceu, eu cheguei até o casal e pedi que um deles pudesse se retirar, pois a norma do hospital não permitia. Então, a mãe se retirou”, disse a enfermeira.
Em outro momento, segundo o relato da enfermeira, na hora de fazer o acesso na sala de medicação, a mãe entrou novamente, e a equipe optou por permitir a permanência dela por mais um tempo na sala, pois a criança chorava bastante. Quando a criança se acalmou, a enfermeira comenta que pediu para que um dos dois (pais) se retirassem. Então, a mãe (J. M. V.) começou a gritar que não iria se retirar, pois a mesma pagava o plano, ela sabia que tinha direitos, tinha direito de ficar os dois acompanhando o filho.
Segundo Francineth Santos, foi o momento que a mãe da criança começou a chama-la de mal-humorada, mal-educada, de enfermeira preta mal-humorada e que não sabia o que estava fazendo lá, que não entendia o porquê trabalhar no local, que não tinha o direito de estar ali, onde não era o seu lugar.
“Quando a técnica (K. M. D. de S) foi tirar a pulsão da criança ela falou para técnica – ‘olha essa enfermeira preta ai, essa preta nojenta’ e ao se retirar do local, ela foi falando pelo corredor e a nossa agente de limpeza (A. R. L. A) ouviu quando a agressora se referiu a vítima, dizendo: ‘por isso que não gosto de preta, preto quando não suja na entrada, suja na saída’. Nunca fui tão humilhada. Minha vontade era apenas de chorar. E chorei muito. Mesmo assim, fui por volta de 21h do mesmo dia ao 29° DP, registrar o B.O. (Boletim de Ocorrência), por injuria racial”, disse a enfermeira.
No entanto, no momento de registrar o B.O., a enfermeira disse que mais uma vez, considera que foi ofendida, pelo atendente (M. R. A) que ao ouvir o relato do caso, olhou para ela (enfermeira) e disse: “esse caso não é injuria racial, pois você é preta mesmo”.
A coordenadora do Movimento das Mulheres Negras da Floresta (Dandara), Francy Júnior, que acompanha dois caso de injúria, informou que vem recebendo alguns casos que envolvem vítimas de injuria, desde 2003. Segundo ela, a grande dificuldade é que as vítimas acabam desistindo de tomar qualquer previdência por falta de apoio das instituições, ou da própria família.
“O caso da Francineth, nós demos entrada na Comissão de Direitos Humanos da ALE (Assembleia Legislativa do Estado do Amazonas), para que acompanhasse e desse todo amparo jurídico; também, na Comissão da Verdade na Escravidão no Amazonas, na OAB (Ordem dos Advogados do Brasil – Seção Amazonas), e entrada da Sejusc (Secretaria de Justiça, Direitos Humanos e Cidadania), na Comissão de Igualdade Racial”, disse Francy.
A coordenadora explica que é importante que as vítimas nunca deixem de fazer o registro da ocorrência na delegacia e sempre estar informando o grupo de apoio e passar a ter conhecimento do passo-a-passo das ferramentas de combate ao racismo.
“As pessoas que cometem injúria racial, podem responder criminalmente, com penalidade de prisão de 1 a 3 anos, ou pagamento de finança, ou em casos civis, penalidade por danos morais, algo que atinge a questão financeira.
Mais casos
Outro caso que está sendo acompanhado pelo movimento Dandara, é de uma vítima que sofreu com a injúria dentro de um ônibus coletivo de Manaus, em 2014. Nos relatos da vítima, a cobradora do transporte fala alto, chamando a senhora de “preta suja, que preta era uma merda e por isso viviam na merda. Que não gostava de preta. Que preta quando não suja na entrada, suja na saída”. A vítima, nervosa, começou a chorar, e foi defendida por um jovem.
A vítima registrou a ocorrência, foi chamada na delegacia, ouvida em dezembro de 2015, porém a acusada não foi encontrada, sendo o caso encaminhado para 1ª Vara do Juizado Especial Cível e desde então, a vítima nunca foi acionada para informações sobre o andamento do processo.