BRASÍLIA – A reforma ministerial deu fôlego à presidente Dilma Rousseff, mas ela virou refém do PMDB e seus auxiliares temem que o partido cobre faturas cada vez mais altas para emprestar apoio ao Palácio do Planalto, se a crise não arrefecer. O PT nunca esteve tão enfraquecido na correlação de forças com os partidos da coalizão governista desde que chegou ao Planalto, mostra levantamento feito pelo jornal O Estado de S. Paulo. No novo arranjo da Esplanada, o PMDB tem previsão de administrar ao menos R$ 99 bilhões do Orçamento para 2016, ante R$ 75, 5 bilhões programados para as pastas petistas.
O levantamento também deixa claro que, ao longo dos mandatos, a era petista vem sendo corroída pelo arranjo de forças para dar sustentação ao projeto do partido, alvo de denúncias de corrupção e sob constante ataque dos adversários. Se em 2003, início da primeira gestão Lula, o partido tinha 19 dos 35 ministérios (54% do total de pastas), agora os petistas estarão à frente apenas de 9 das 31 pastas (29% do total).
Principal parceiro do PT, o PMDB entrou no governo com apenas dois ministérios, em 2004: Comunicações e Previdência. Em 2007, no início da segunda gestão Lula, o partido sobe de status e leva a Saúde, a Integração Nacional e a Agricultura. Agora, com Dilma sob ameaça de impeachment e em momento de crise econômica, comandará sete pastas, todas de alto peso político e grande poder orçamentário: Saúde, Minas e Energia, Agricultura, Ciência e Tecnologia, Turismo, Secretaria da Aviação Civil e Secretaria de Portos, que, juntas, têm quase R$ 100 bilhões previstos para o Orçamento de 2016.
Os números ajudam a ilustrar a preocupação de auxiliares da presidente em relação aos aliados. Avaliam que o PMDB pode até ser confiável para que o Planalto possa derrubar a chamada pauta-bomba no Congresso e aprovar a nova fase do ajuste fiscal, que prevê a volta da CPMF (o imposto do cheque) e de outros tributos. Mas os petistas receiam que, superados esses obstáculos, o aliado não se comprometa a evitar o impeachment da presidente Dilma Rousseff.
Os mais céticos avaliam ainda que o PMDB planeja, na verdade, limpar a pauta-bomba e resolver o déficit no Orçamento justamente para ficar em condições ainda melhores de governar o País sem Dilma e o PT.
Para os petistas, uma sinalização nesse sentido ocorreu na noite da quarta-feira passada, quando o vice-presidente Michel Temer, que preside o PMDB, participou de um jantar oferecido pelo líder do partido no Senado, Eunício Oliveira (CE). Em diversos momentos ao longo da festa, Temer foi tratado como “futuro presidente”.
Naquela altura, a reforma ministerial já estava praticamente definida e a ampliação do espaço do PMDB sacramentada. Ainda, o tema principal do jantar foi a possibilidade de impedimento de Dilma. O anfitrião do jantar não admite em público a possibilidade de a reforma ministerial fracassar e não ser suficiente para manter Dilma no Palácio do Planalto, porém, reservadamente, “não aposta R$ 10 no governo”, afirma um de seus interlocutores.
Ao ampliar as cadeiras do PMDB na Esplanada, e não desalojar outros aliados, a presidente tem agora, em tese, número suficiente de votos para se manter no poder. Para barrar um pedido de impeachment, ela precisa de ao menos 172 dos 513 deputados. Na contabilidade do governo, Dilma já conta com 200.
Um dirigente do PMDB disse ao Estado que, com as mudanças no coração do governo, a presidente colherá frutos na política porque os novos ministros “sabem usar o bambolê”. Era uma referência à peça cor de rosa que Henrique Eduardo Alves, então líder do PMDB na Câmara e hoje ministro do Turismo, deu a Dilma em 2008, quando ela chefiava a Casa Civil. “A gente achava que ela era muito dura, muito técnica, e precisava de jogo de cintura”, comentou Alves. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
Ministério da Saúde
O Ministério da Saúde sempre esteve na lista de desejos do PMDB. O que torna a pasta tão atrativa, além de um orçamento robusto, é a sua capilaridade e o poder diante de prefeitos e governadores. Algo essencial sobretudo agora, diante da proximidade das eleições municipais. Desde o início do segundo mandato da presidente Dilma Rousseff, setores do PMDB estão de olho no que consideram o filé da área: a administração de hospitais federais e institutos no Rio.
“Boa parte da verba do ministério é transferência automática, não dá para mexer. Os hospitais federais dão mais autonomia. São o local ideal para abrigar grupos próximos, fazer contratos de ocasião”, afirma um administrador, que pediu anonimato. “Ali é preciso estar sempre de olho. Sai um grupo, entra outro.”
Este ano, o orçamento do Ministério da Saúde é de R$ 121 bilhões. Do total, R$ 3,5 bilhões foram reservados para a administração dos hospitais do Rio. O desejo de controlar essa fatia não foi atendido e o apetite aumentou. “O interesse não era à toa. Agora terão toda a pasta.”
A Fundação Nacional de Saúde, que em 2008 foi chamada de corrupta pelo então ministro José Gomes Temporão (ele também indicado pelo partido), não pode ser considerada uma conquista. Há anos ela é classificada como reduto do PMDB, que ocupa postos importantes da fundação tanto em Brasília quanto nos escritórios espalhados pelo País.
Embora vitrine, a pasta também é fonte de crises. Descontentamento de prestadores de serviços por valores baixos pagos por procedimentos, surtos, problemas nos planos de saúde são alguns dos percalços que boa parte dos ministros tem de lidar. O baque na popularidade – mesmo por dificuldades provocadas por falhas de esferas municipais e estaduais – invariavelmente é sentido por ministros.
Essas crises, no entanto, nunca são lembradas no momento da disputa pelo controle da pasta. Esta é a segunda vez que a área é cedida para PMDB em troca de apoio. A primeira vez foi em 2005 no governo Luiz Inácio Lula da Silva, com a crise do mensalão. Na época, saiu o ministro petista Humberto Costa para dar lugar ao deputado mineiro Saraiva Felipe. O movimento foi bem-sucedido. Os ânimos se acalmaram e o PT continuou no poder. Agora a situação se repete.
Escolhido para ocupar a pasta pela bancada do PMDB na Câmara, o deputado federal Marcelo Castro (PMDB-PI) está em seu quinto mandato consecutivo. Formado em Medicina pela Universidade Federal do Piauí (UFPI), em 1974, ele é doutor em psiquiatria pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). O novo ministro da Saúde já encabeça o movimento a favor da recriação da CPMF para o financiamento do setor. O peemedebista já defendeu inclusive que o chamado imposto do cheque seja permanente e propôs uma fórmula excêntrica na qual a taxa seria cobrada “tanto no crédito quanto no débito”. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
(Estadão Conteúdo/ATUAL)