Estou na Espanha e o ano ainda é 1982. Saímos do Hotel Numance, subimos a Calle Numance e chegamos, andando, ao magnífico Estádio Sarriá. Olhei para um lado, olhei para o outro e vi o Campo do Barcelona bem ali. Pensei logo, sem conhecer o campo: armação à vista. Foi o pior campo que a Fifa entregou aos torcedores em toda a sua história. Dizem que sou um pouquinho exagerado demais, mas perguntem ao Amazonino, ao Dudu Monteiro de Paula ou ao Evandro Farias, se a Colina Formosa, o Estádio Ismael Benigno, não é muito melhor que o Sarriá. O campo não oferecia espaço para bater escanteios e a grama saia nas pisadas mais fortes. Um horror! Foi demolido logo após o jogo para a construção de um moderníssimo shopping.
Estávamos lá, o coração na ponta da chuteira e as bandeiras enforcavam nossos pescoços. Os italianos, desanimados e nervosos, nos cumprimentavam como se fosse um:
Ciao, Copa da Espanha!
Eis que surge no Céu dos italianos um Jumbo 747, acompanhado por seis caças, todos com as cores da Itália. Os torcedores, nas quebradas arquibancadas; e os jogadores, no campo, onde faziam o aquecimento, levantaram os braços, saudando quem estaria à bordo. Eu pensei logo que fosse o Pavarotti ou o Luigi Tenco, porque no Brasil só faríamos isso para o Roberto Carlos ou para o Pelé. Dez minutos depois apareceu um helicóptero imenso, daqueles que a gente sempre vê o Presidente dos Estados Unidos indo para Camp David, pensar na paz mundial, ou o Papa indo falar, mais reservadamente, com o Homem, quando vai a Castel Gandolfo. O aparelho parou ao lado do “espetacular” Estádio e o esperado Messias italiano surgiu do nosso lado. Era o Sandro Pertini, o Presidente da Itália, 1,60m, forte, que resolvera perder junto com seus soldados. A torcida e os jogadores ferveram. Sandro Pertini, a cinco metros de onde estávamos, parou, a equipe perfilada para o hino, olhou, Sandro fez um sinal para Antognoni, o craque avançou um passo, e o presidente, com os dois braços para cima, baixou-os, três vezes, olhei para o Evandro e disse:
– Bambu, essa coisa ficou diferente!
O Evandro, conhecedor de arquibancadas e gerais, esticou o beiço e falou:
– Esse velhinho veio para cá com um Brasilit de água para jogar no nosso chopp. Esses caras parece que ficaram drogados no hino.
Não deu outra. O jogo começou, o Leandro amarelou, o Luizinho embranqueceu, o zagueiro italiano Gentile segurou o Zico, rasgou a camisa do Galinho de cima para baixo e o juiz deixou aquele pênalti para depois. O Telê com aquela mania de mostrar um futebol que não foi inventado por ele, ganharia aquele jogo três vezes: no 0x0, no 1×1 e no 2×2, pois jogávamos pelo empate. Perdemos no 3X2 pela cabeça dura do nosso técnico. Era um excelente técnico, mas perdeu quatro vezes no mesmo jogo, ao mandar o time para a frente. Antognoni, amigo do Murilo Rayol, acabou com o Brasil e com as próprias pernas. Após aquela Copa, suas pernas não mais o obedeceram. Puro castigo!
Sandro Pertini, que foi condenado à morte, pelos fascistas, na resistência ao nazismo e ao fascismo, levantou-se da mais esculhambada almofada que já fora presenteado e extasiou-se ao ver os jogadores voltarem a se perfilar, saudarem seu ídolo e presidente, e correrem para a torcida. O velhinho que misturou o chopp do futebol durante anos de força, subiu no helicóptero e foi embora. Se aguou o vinho do Hitler e do Mussolini, como não faria xixi no nosso?
Eu sonho em ver um Fernando Henrique, um Lula ou uma Dilma com aquela overdose de poder, jogando com a Seleção Canarinho e com a torcida, para a frente e para a conquista de uma Copa do Mundo de futebol ou de um difícil e jamais conquistado título olímpico de futebol.
Quando virmos uma coisa dessas acontecendo, já não precisaremos mais reivindicar hospitais com médicos, escolas com professores, pagamentos justos para todos os profissionais, sejam eles funcionários do governo ou trabalhadores do PIM, e todos estarão passando férias “nas europas”, lotando os aviões da TAM, GOL e Emirates, como vemos, hoje, em apenas um lado da banda. Os Black Blocks serão apenas tristes lembranças de uma invenção “dark” dos hooligans, que não serviram nem para o que foram criados. Foram fezes de um processo infeccioso, criados por péssimos brasileiros, que fizeram com que a Copa do Mundo não voltasse para a América do Sul nos próximos duzentos anos.
Vamos orar pela saúde do Felipão. Vamos torcer pela Neymar, Fred & Cia, e, finalmente, todos juntos, pedir ao Papa argentino que peça a Deus que venha ver a final do Brasil, e se nos depararmos com os vizinhos, deixemos o Papa torcer, em paz, pela sua seleção e vamos contar com o Chefe dele… torcendo por nós. Aí é só correr para o abraço.
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Roberto Caminha Filho, nacionalino, é fã do Papa e do Chefe dele.