O mundo moderno tem nos imposto um ritmo frenético de trabalho, a busca por uma condição melhor de vida que passe pelo conforto e estabilidade financeira nos tem feito aumentar a jornada de trabalho para 50, 60 e às vezes até 70 horas semanais, nos afastando cada vez mais das outras dimensões da vida, como: família, amigos, espiritualidade e compromisso social.
É claro que parte dessa jornada é cumprida em casa. São relatórios param serem feitos, planilhas para serem produzidas, projetos para serem elaborados, metas a serem cumpridas, whatsapp’s que não podem deixar de ser respondidos, e principalmente, uma imensa vontade de ascender profissionalmente, que fazem com que nos submetamos a uma condição de trabalho que compromete sobremaneira o convívio familiar.
É fato que nos últimos anos se criou a idéia de que quanto mais ocupada uma pessoa é, maior o seu valor dentro da sociedade. Sendo assim, ter uma agenda lotada com pouco tempo para família e amigos é sinônimo de sucesso profissional, e conseqüente reconhecimento.
As mães solteiras, que muitas vezes tem de ocupar o lugar da figura paterna, no sentido de assumirem sozinhas o sustento dos filhos, sentem-se muito culpadas pela falta de tempo para dar mais atenção às crianças. Sem contar o olhar de reprovação que sofrem de alguns, inclusive familiares que num julgamento precipitado as classificam como: relapsas, insensíveis e desumanas. Mas o que fazer diante da necessidade de prover o sustento da família? O jeito acaba sendo prescindir da atenção aos filhos. Mesmo assim muitas tentam se desdobrar, e até conseguem encontrar um ponto de equilíbrio.
Há ainda um caso mais grave que é o da família em que temos a presença do pai, mas este não participa efetivamente da educação dos filhos, uma espécie de “pai ausente de corpo presente”. São homens que convivendo debaixo do mesmo teto com a esposa e os filhos, entendem que a sua parte na educação deles é financeira e operacional, ou seja, pagar as contas e levar os filhos à escola. O resto é por conta da mãe, e da escola é claro. A justificativa para isso é sempre a falta de tempo imposta pela alta jornada de trabalho capaz de assegurar o padrão de vida da família.
Nas escolas é nítida a diferença dos alunos em que o convívio familiar e a interação da família com a escola são mais intensos. Essa diferença se percebe principalmente em resultados melhores e no comportamento dos alunos. É muito comum que por trás de uma atitude rebelde haja uma situação de ausência dos pais, não necessariamente a ausência física, mas na participação da vida dos filhos.
O assunto é tão sério e impacta tanto na vida escolar que no final de 2014 a ONG “Todos pela Educação” publicou uma pesquisa sobre o perfil dos pais dos alunos da educação básica, no Brasil. Com base em mais de 2.000 (duas mil) entrevistas com pais e responsáveis, de escolas públicas e privadas, foram traçados cinco perfis de pais:
I) Distantes (20%): Não se relacionam com outros pais e com a escola e dialogam pouco com as crianças e jovens. É o grupo que tem menor assiduidade nas reuniões e eventos escolares. 61% têm escolaridade até o Ensino Fundamental, somente 25% procuram se informar sobre a proposta de ensino da escola e apenas 37% ajudam a organizar o material escolar do filho.
II) Intermediários (17%): Os responsáveis desse grupo demonstraram um interesse ligeiramente maior que a dos Distantes, porém abaixo muito abaixo do desejável. Entre os Intermediários, 57% alcançaram o Ensino Fundamental, sendo que, destes, 31% foram até a 4ª série. Os dados revelam que 70% conferem se o filho faz as lições de casa e 67% olham os cadernos, livros e apostilas.
III) Vinculados (27%): Os que são assim classificados exibem um comportamento mais ligado ao vínculo com a criança do que com a valorização da Educação. São responsáveis que dialogam freqüentemente com os filhos, mas não acompanham tão incisivamente a rotina escolar. Os dados mostram que 95% dos vinculados afirmam estar presentes nos momentos mais importantes da vida da criança; mas apenas 20% conversam com outros pais sobre a qualidade da escola e 44% acompanham o calendário de provas. A maior parte desse grupo é formada por mulheres (60%) e quase metade (49%) tem Ensino Médio ou Superior.
IV) Envolvidos (25%): São aqueles que praticam mais ações de valorização do que de vínculo e, portanto, destacam-se por acompanhar a rotina escolar do filho. Ao mesmo tempo, apresentam um ambiente familiar menos propício ao diálogo e um relacionamento menos próximo com a criança. Entre eles, 87% acreditam que, se a criança estudar, terá uma vida melhor que a dele e 79% conferem se o filho estudou para as provas. Mas apenas 35% procuram levá-lo a programas culturais.
V) Comprometidos (12%): É o perfil que participa das reuniões e dos eventos escolares com maior assiduidade. Eles buscam informações sobre a escola, estabelecem parceria com outros pais e professores e apóiam os filhos na rotina. Entre eles, a maioria é formada por mulheres e metade tem Ensino Médio ou Educação Superior. Deve-se destacar ainda que 98% deles monitoram de perto as faltas da criança; 91% afirmam respeitar a opinião do filho e 100% dizem gostar dos momentos que passam com a família.
É chocante ver que apenas 12% dos pais podem ser classificados como comprometido com a educação de seus filhos. Percebe-se nessa categoria a predominância das mulheres e do tempo dedicado a uma rotina com os filhos. Deste modo, ficam evidentes três mensagens:
– É muito importante o comprometimento dos pais na educação dos filhos, mas isso demanda tempo. Desta forma, é preciso que se reserve um espaço (diariamente) para essa convivência, e isso pode significar ter que reduzir a jornada de trabalho.
– O pais (os homens) precisam se dedicar mais a educação dos seus filhos. É necessário que se envolvam com a rotina das crianças e jovens. E isto não pode se restringir somente a olhar as notas no final do bimestre, isso é principalmente: sentar para fazer o dever, ajudar a fazer os trabalhos, olhar o caderno, verificar a agenda, participar das reuniões da escola.
– A escola pouco pode fazer sem o envolvimento da família. Não adianta pensar em pagar a escola mais cara com a intenção de se transferir toda a responsabilidade para ela. Sem a participação familiar o desenvolvimento do aluno é comprometido.
Num momento em que se fala em “pátria educadora” que sejamos também a “pátria da família educadora”, pois sem isso de pouco adianta escolas mais bem estruturadas, professores bem qualificados, e material didático de qualidade. A lógica da educação não é, e nem deve ser, como a da indústria em que se pode assegurar um bom produto tendo uma boa matéria prima e garantindo os insumos necessários. Na educação o componente afetivo que vem da família é decisivo nesse processo.
George Castro é supervisor do Pacto Nacional pelo Fortalecimento do Ensino Médio;
diretor executivo da Macedo de Castro consultoria educacional; ex-professor da Universidade
Federal do Pará e ex-diretor do ensino médio e educação profissional do estado do Pará.
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