Provavelmente, o ódio deva aumentar com a presidência de Donald Trump. É fato, porém, que os EUA não costumam ser um dos países mais amados mundo afora. Por isso, causou um grande choque e uma tremenda indignação quando, ao final da mais importante competição do atletismo nacional, um brasileiro comemorou a vitória beijando e adorando a bandeira americana.
O episódio do “Tem perdão quem venera o pendão alheio?” ocorreu no dia 21 de junho de 2007, na disputa dos 100 metros rasos do Troféu Brasil, sediado em Ibirapuera, São Paulo. Logo após o triunfo, aquele atleta “americanófilo” pegou o estandarte do “inimigo” e o pôs sobre os ombros. Em seguida, começou a saudar o público balançando o lábaro ianque enquanto chorava. Depois, deitou a bandeira listrada e estrelada na pista e começou a beijá-la com carinho e devoção.
A maioria dos jornalistas que faziam a cobertura do evento e viram a cena não conseguiram manter a isenção profissional. Revoltados, começaram a disparar frases de aversão e repulsa. Alguns, em um tom alto para que o atleta e os espectadores pudessem ouvir.
“Ôrra, meu, que bagulho doido é esse? Olha aquele maloqueiro pagando pau para a bandeira do Bush. Se alguém tomasse essa bandeira dele e a queimasse seria muito da hora, meu”, disse um. “Barbaridade, tchê. Chega a me dá um revertério espiar um piá kakedo desse todo faceiro atracado e ensebando a bandeira dos gringos”, disse outro. “Mermão, babar ovo dos alemão é o maior caô, isso é coisa de x9 vacilão, traidor do movimento”, declarou um terceiro.
Se a difusão e dimensão das redes sociais daquela época fosse igual a de hoje, imagine a quantidade de enraivecidos “textões de Facebook”.
Um repórter, parecendo ser mais experiente, tentou mostrar condescendência. “Uai, sô. Talvez esse fédazunha seja doidjimais e esse trem todo de paparicos aos ianques seja um protesto padaná contra o Brasil”, conjecturou. Assim, cheios de suspeitas e dúvidas, todos se apressaram para conhecer e ouvir o beijoqueiro da bandeira.
Algumas respostas bastaram para os jornalistas perceberem que não era um caso de crime lesa-pátria e, sim, de uma patética leseira da parte deles. O atleta era Sandro Ricardo Rodrigues Viana. E aquela bandeira vermelha, azul e branca não era do país do dólar, era a do Estado do Amazonas.
Talvez, um forte sentimento de culpa também explique o destaque dado àquela prova nos sites e jornais. Todos repletos com fotos de Sandro Viana com o lábaro amazonense. E até legendas ensinando ao leitor que era ignorância confundir a bandeira dos EUA com a do Estado do Amazonas.
Sim, maninho. Sandro Viana é amazonense do rocha. Não é bacaba, não. Só descobriu que tinha o maior caqueado para ser velocista aos 24 anos e teve que treinar com crianças. Para ser um atleta profissional, fez sacrifícios ainda mais drásticos que deixar de comer farinha do Uarini, da baguda.
Para treinar em São Paulo, em 2005, Sandro botou no tchoco. Vendeu quase tudo que tinha para angariar uma babita de R$ 2 mil e se manter lá sem ficar só o cuí. Vendeu até as alianças de casamento.
Nas Olimpíadas de 2008, ficou na lharga de subir ao pódio. Junto a José Carlos Moreira, Vicente Lenílson e Bruno Tenório, Sandro ficou em quarto lugar no revezamento 4 x 100 metros rasos, apenas nove décimos atrás da terceira posição.
Só que o Comitê Olímpico Internacional sentiu o piché de mutreta, e começou a futricar e reanalisar 454 antigas amostras das Olimpíadas de Pequim para descobrir fraudes. Num dos retestes, descobriu-se que o presepeiro do jamaicano Nesta Carter era bate-fofo, caga-pau e merecedor de sabacu. Estava até o talo de doping. Olha já, então!
E agorinha veio a notícia mais pai d’égua. A medalha da Jamaica foi pro babau. Acho é bom! Quem mandou querer dar bolo em catita. Assim, o Brasil vai herdar o bronze. E Sandro Viana se torna o segundo amazonense medalhista olímpico. O primeiro foi o futebolista Gilmar Popoca, prata em 1984, em Los Angeles.
Os contrários que ficavam dando pissica, hoje estão comendo abiu; em silêncio. E Sandro Viana, um cara chibata no balde pode comemorar que só.
Agora, espia só: a história de Viana mostra que não é apenas o potencial maceta da fauna e flora do Amazonas que é rebolado no mato, jogado fora. Poderíamos ter sandros até o tucupi, se não fosse a nossa persistente leseira baré de desperdiçar talentos.
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