Uma das histórias mais curiosas na transferência da Coroa Portuguesa para o Brasil envolve a mistura de insetos com uma moda excêntrica.
Tudo começou com o ultimato de Napoleão Bonaparte: Portugal deveria decidir se apoiava a França ou a Inglaterra. Caso se aliasse aos franceses, a Inglaterra invadiria e dominaria o Brasil, que era responsável por aproximadamente 85% das riquezas e produtos então obtidos pelos lusitanos. E se decidisse enfrentar o avanço francês, o país seria facilmente derrotado e imediatamente anexado ao império napoleônico.
Diante do dilema, o príncipe regente D. João VI decidiu evitar o confronto, abandonando Portugal para governar na sua principal colônia. Acompanhada de 10% da população – formada por membros da elite lusitana – a família real portuguesa partiu da metrópole em 29 de novembro de 1807, chegou a Salvador em janeiro de 1808 e depois desembarcou definitivamente no Rio de Janeiro em março daquele mesmo ano.
A viagem não foi fácil, especialmente para quem estava acostumado ao conforto e boa vida. Ocorreram tempestades e ameaças de naufrágios. Foi necessário racionar comida e água. Os navios eram autênticas ‘saunas flutuantes’. O excesso de passageiros e a falta de higiene favoreciam a proliferação de pragas.
Logo quando já estavam bem perto de chegar ao Brasil, as mulheres enfrentaram o que consideraram o mais terrível perrengue: seus cabelos ficaram ‘cheios de vida’, ou seja, ocorreu uma infestação de piolhos. A solução era radical. Todas tinham que raspar completamente suas cabeças. Dessa vez não havia como manter privilégios. Até a princesa Carlota Joaquina teve que ficar com a cabeça toda pelada.
Quando desembarcaram no Brasil, algumas nobres lusitanas exibiam seus cabelos bem curtos. A maioria, porém, ainda careca, preferira usar turbantes.
Após a surpresa, as madames brasileiras logo decifraram o que estava acontecendo. Evidentemente tratava-se da última moda na Europa: mulher com cabeça pelada e raspada para melhor usar turbantes.
Em poucos dias, as mais descoladas damas brasileiras – antes fãs de Rapunzel – rasparam seus cabelos e passaram a usar turbantes para imitar a nobreza lusitana.
Copiar novidades de países considerados avançados não é algo restrito às senhoras brasileiras da alta sociedade colonial. Ainda é corriqueiro no Brasil a atitude de adotar com avidez e sem muita reflexão tudo o que vem de fora.
O desejo de parecer descolado para os olhos estrangeiros fez o Brasil adotar conturbados ‘turbantes’ dispendiosos. Para sediar eventos como a Copa e as Olimpíadas, o País gastou fortunas para construir estádios e ginásios que atenderiam aos padrões estrangeiros mais exigentes.
Bem semelhante ao que ocorreu quando a família real chegou ao Rio de Janeiro e não encontrou número suficiente de alojamentos disponíveis para abrigar as quase 15 mil pessoas que vieram de Portugal. O príncipe regente, então, decretou que as melhores casas da cidade fossem cedidas, sendo carimbadas na porta com as iniciais PR, de ‘Príncipe Regente’”, mas que foram apelidadas pelo povo como ‘Ponha-se na rua’ ou ‘Prédio Roubado’.
Os eventos grandiosos da Copa e das Olimpíadas passaram e para o povo só restou enxergar o carimbo de ‘Prédio Roubado’ em ginásios e estádios superfaturados. O ‘Ponha-se na Rua’ ainda vale, porque esses locais não estão sendo aproveitados pelos contribuintes que os pagaram.
Enquanto o brasileiro ficou encantado pelos ‘turbantes’, corruptos mais nocivos e sanguessugas que piolhos aproveitaram para, sem resistência, ‘pelar’ e ‘raspar’ o povo. Uma incômoda lembrança que, nesse caso, não pode sair da cabeça.