Da Redação
MANAUS – Militares das Forças Armadas no Amazonas deverão ser treinados para conhecer, respeitar e manter a cultura dos povos indígenas no Estado, principalmente os Waimiri-Atroari. A determinação é da Justiça Federal no Estado que responsabilizou a União por danos causados por agentes da Marinha do Brasil ao povo Waimiri Atroari durante a realização da Operação Ágata 4, em maio de 2012. Em ação civil pública movida pelo Ministério Público Federal no Amazonas (MPF/AM), a União foi condenada pela Justiça a promover treinamento aos militares a fim de respeitarem as peculiaridades socioculturais dos povos indígenas.
O programa de treinamento deve contar com a participação de antropólogos indicados pela Fundação Nacional do Índio (Funai) e a União deve produzir cartilhas, também sob supervisão dos antropólogos, que tratem das peculiaridades dos indígenas Waimiri Atroari e seus modos de vida. O material deve ser produzido em quantidade equivalente ao número de servidores das Forças Armadas.
De acordo com a sentença judicial, o União não pode realizar novas incursões na ocupação tradicional dos Waimiri Atroari, independentemente da área demarcada, sem a adoção de medidas diferenciadas quanto às peculiaridades socioculturais daquele povo, mediante o apoio de profissional da antropologia e prévio treinamento da equipe.
Postura ofensiva
Em maio de 2012, durante a realização da Operação Ágata 4, uma equipe de lideranças indígenas e funcionários do Programa Waimiri Atroari se dirigiu à comunidade Xixuaú para dialogar com militares do 9º Distrito Naval da Marinha, tendo sido abordada e questionada pelos militares, na ocasião, os limites da terra indígena Waimiri Atroari e o uso de boias e placas sinalizadoras pelos indígenas no posto de fiscalização da região conhecida como Mahoa.
Dias depois, militares do 9º Distrito Naval se aproximaram da terra indígena Waimiri Atroari com forte armamento e adotaram postura ofensiva em relação aos indígenas que estavam no local, exigindo retirada de boias e placas sinalizadoras que sinalizaram o Rio Jauaperi, liberando o uso do rio para todos, sem a observância das suas peculiaridades socioculturais ou preocupação com o modo de vida, ameaçando os indígenas de prisão e posteriormente cortando as correntes que seguravam as boias e placas, causando danos morais coletivos aos Waimiri Atroari.
Para o MPF, mesmo que os militares tenham permanecido em posição de descanso, como foi alegado pela União, para os índios, a presença de pessoas armadas e o uso de embarcações de guerra foram entendidos como demonstração de poder dos militares, fato evidente nos depoimentos das testemunhas.
A história do povo Waimiri Atroari é marcada por conflitos envolvendo indígenas, militares e seringalistas desde a segunda metade do século XIX, que resultaram na destruição de aldeias e mortes de indígenas, em razão da ‘política de pacificação’ adotada e do grande interesse econômico nas riquezas naturais da terra que habitam. Outro episódio que marcou sua história foi a construção da BR-174 – que liga Manaus a Boa Vista (RR), iniciada em 1967 e inaugurada em 1977. O assunto foi tratado no 1º Relatório da Comissão Estadual da Verdade do Amazonas e vem sendo acompanhado pelo MPF por meio de inquérito civil público em andamento.
O povo foi ainda vítima da grande inundação em seu território decorrente da construção da usina hidrelétrica de Balbina, a qual alagou imensa área na floresta amazônica e afetou pelo menos um terço da população Waimiri. Em meados da década de 1980, este povo havia chegado a pouco mais de 300 indígenas. Atualmente, a etnia conta com mais de 1,6 mil indígenas.
O MPF aponta que a postura dos militares durante a Operação Ágata 4 mostrou-se abusiva em relação ao povo indígena em questão, tendo se baseado numa visão etnocêntrica do problema. Ao abrir mão, num contexto em que não havia qualquer perigo concreto à atuação militar, de um procedimento dialógico e atento à cultura do povo Waimiri Atroari, valendo-se de métodos utilizados em face dos não-indígenas, a União fez ressurgir antigos traumas naquele povo, causando-lhes danos.
A ação civil pública segue tramitando na 1ª Vara Federal no Amazonas, sob o nº 0001769-90.2014.4.01.3200.
Ainda há gente boa e corajosa no judiciário. Os nomes destes juízes deveriam ser mencionados na reportagem para que conheçamos a turma do bem. Ou dos advogados. Tomara que a ordem seja acatada e os Waimiris respeitados.
https://www.brasildefato.com.br/2016/12/02/conselho-indigena-protesta-contra-mudancas-em-demarcacoes-de-terras-no-governo-temer/