BRASÍLIA – Além do excesso de benesses aos devedores do Fisco, o relatório do ‘Super-Refis’ incluiu um ‘jabuti’ – jargão para assuntos incluídos em medidas provisórias que nada têm a ver com o texto original – que abriu uma verdadeira guerra entre os fabricantes de refrigerantes. Uma emenda ao texto original reduz drasticamente as vantagens tributárias para as companhias de bebidas não alcoólicas instaladas na Zona Franca de Manaus e já dividiu o setor.
O relator da MP do Refis, deputado Newton Cardoso Júnior (PMDB-MG), acrescentou três artigos ao texto para tratar especificamente da tributação dos extratos e concentrados utilizados para dar sabor aos refrigerantes.
Em uma rápida leitura, o primeiro artigo parece ser vantajoso para o setor, porque reduz a alíquota do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) cobrado na fabricação desses preparados. A tributação, que hoje está em 20%, cairia para 12% no próximo ano, 8% em 2019 e 4% em 2020.
O imbróglio, no entanto, ocorre porque as empresas instaladas na Zona Franca de Manaus se beneficiam justamente dessa alíquota elevada para gerarem créditos tributários que podem ser abatidos ao longo de suas cadeias produtivas. Ou seja, quanto menor a alíquota desse imposto, menor a quantidade de créditos gerados para o abatimento de outros tributos pelas companhias.
A Associação dos Fabricantes de Refrigerantes do Brasil (Afrebras), que representa 156 fabricantes regionais, é totalmente favorável à mudança de tributação. Para a organização, as vantagens tributárias da Zona Franca de Manaus beneficiam apenas as maiores empresas do ramo, como a Coca-Cola e a Ambev. Já a Associação Brasileira das Indústrias de Refrigerantes e Bebidas não Alcoólicas (Abir) promete ir até ao Supremo Tribunal Federal (STF) para derrubar a emenda, se necessário. A entidade tem sede em Brasília e representa 53 fabricantes, incluindo os dois maiores grupos citados pela Afrebras, mas também médias e pequenas marcas.
Queda
As mudanças no projeto de regularização tributária (apelidado de Super-Refis) aprovadas em comissão mista do Congresso Nacional nesta semana derrubarão a arrecadação do programa, de acordo com estimativas da equipe econômica. A projeção do governo era arrecadar entre R$ 6 bilhões e R$ 8 bilhões com o novo Refis neste ano. No cálculo dos técnicos da área, com o perdão de multas e juros e a mudança de regras, a arrecadação agora não deve chegar a R$ 2 bilhões em 2017. “Mesmo alcançar esse número menor de R$ 2 bilhões será muito difícil. As empresas teriam de compensar cerca de R$ 200 bilhões é improvável que chegue a isso”, afirma uma fonte da equipe econômica.
A medida provisória (MP) original facilitando a quitação de débitos tributários com o governo previa quatro modalidades diferentes para o parcelamento das multas. Mas não havia nenhum perdão das dívidas. No relatório do deputado Newton Cardoso Júnior (PMDB-MG), que foi aprovado na comissão, porém, os benefícios para as empresas que aderirem ao parcelamento dos débitos são bem maiores. Há, por exemplo, um perdão de até 90% nas multas, além de um abatimento de 99% nos encargos legais.
As mudanças no projeto do Refis acontecem em meio às negociações do governo para aprovar a reforma da Previdência. Apesar da oposição da equipe econômica, o Super-Refis está sendo usado como moeda de troca pelos parlamentares para apoiarem a reforma previdenciária, sem que seja necessário modificar ainda mais a proposta.
Mas, na equipe econômica, o foco é reduzir as benesses incluídas no relatório do Refis, durante a votação na Câmara e no Senado. Se isso não for possível, a área econômica já se prepara para recomendar o veto das mudanças ao presidente Michel Temer.
Legislação Um critério técnico será usado para barrar a nova lei: o Tribunal de Contas da União (TCU) tem um entendimento de que não é permitido por lei dar desconto de juros e multas no mesmo ano em que a lei é aprovada. Originalmente, a medida provisória autorizava o parcelamento de débitos acumulados até 30 de novembro do ano passado, mas o novo texto amplia o alcance do Refis até 31 de março deste ano.
A aprovação do relatório do “Super-Refis” foi vista com muita preocupação pelo governo, que contava com os recursos para minimizar o já mais que apertado ajuste fiscal. “Vamos ter que trabalhar para evitar um corte ainda maior”, disse a fonte.
Enquanto tenta barrar as mudanças no Refis, o governo estuda outros dois programas de parcelamento, um com órgãos da administração pública e outro com produtores rurais. Ainda não há estimativa de arrecadação com os dois novos Refis.
(Estadão Conteúdo/ATUAL)