Diversos eventos e declarações fora de contexto, ou seja, sem maiores fundamentos, marcaram a semana que passou, inclusive repercutindo no âmbito da segurança pública.
Começou pela declaração do técnico da seleção inglesa – Roy Hodgson, que ganhou âmbito internacional, ao manifestar preocupação com a possibilidade da Inglaterra vir jogar na capital do Amazonas. Depois veio a divulgação dos polêmicos resultados de pesquisa sobre vitimização, em específico sobre o grau de confiança da população nas polícias, realizada pelo Instituto Datafolha e pelo Crisp (Centro de Estudo de Criminalidade e Segurança Pública). E, por fim, a onda de boatos que potencializaram os eventos de violência ocorridos em Manaus, na última sexta-feira (06/12).
A infeliz declaração do técnico inglês teve muitas reações, inclusive de autoridades locais. Na realidade, mesmo sem ter consciência disso, o que Roy Hodgson fez foi apenas externar o eurocentrismo neocolonial com que boa parte da tradição europeia ainda trata as regiões tropicais, quase sempre taxadas de primitivas, selvagens e atrasadas. A doutrina do esporte quer exatamente superar isso, essas discriminações e preconceitos, buscando integrar povos de culturas e ambientes diversos. O bom futebol, assim como qualquer ramo esportivo, deve ser praticado em toda parte, não só na Europa. Um bom time, muito embora as condições ambientais possam influir (e em que região elas não influem?), joga seja qual for altitude ou clima. Além disso, uma pena ter o técnico da seleção inglesa ignorado que os ingleses ajudaram a construir a Manaus cosmopolita da belle époque que herdamos, tendo aqui desembarcado conterrâneos seus num período sem ar condicionado. Mesmo assim, vieram e o que fizeram marcou nossa história.
A pesquisa social, inclusive a de opinião, como pesquisa científica cuja metodologia seja minimamente consistente e coerente, deve levar em conta o contexto (tempo e espaço) em que é realizada e divulgada. A pesquisa de opinião sobre vitimização, empreendida pelo Datafolha e pelo Crisp, em especial o item sobre a confiança da população nas policiais na realidade de Manaus, não enfatizou adequadamente o período em que ocorreu. Ao lançar os resultados agora, ao invés de esclarecer, acabou por confundir ainda mais os indicadores sobre a segurança pública no Amazonas. Um desserviço, pois não esclareceu a opinião da população após os investimentos do governo estadual na área de segurança pública, incluindo os concursos e o programa ronda dos bairros. Resultado: a pesquisa do Datafolha/Crisp ficou inteiramente devassada – fora de contexto.
Nos últimos dias da semana passada, em razão de eventos de violência na cidade de Manaus, inclusive alguns como resultado da atuação da polícia, que resultou na prisão e até morte de infratores, potencializou-se uma onda de boataria que deixou muita gente insegura e, alguns, em pânico. Manaus sofre, como qualquer outra capital no país e no mundo, de problemas de insegurança pública. Ocorreram eventos de violência e crime, como acontecem todos os dias. Isso não se deve negar nem mascarar e nem muito menos servir de desculpa à responsabilidade de todos. Contudo, chega a ser uma “forçada de barra” frustrar o funcionamento de faculdades e escolas noturnas, programas de comércio, de entretenimento e de lazer baseado tão somente na maximização de uma bolha de lendas urbanas. Aí a onda passa, a bolha estoura, e que podia ter sido feito, não foi feito. Então, as pessoas reclamam da frustração com tudo isso e culpam a chamada sensação de insegurança, que elas também contribuíram para formar. É um ciclo que nos deixa fora de contexto. Riscos existem a todo instante, em toda parte. Quem deve temer sair à rua e viver uma vida ilícita são os que delinquem, não os demais cidadãos. Por isso, é preciso ter algum cuidado com essas ondas de boataria que potencializam certos eventos de insegurança e convertem a todos em reféns da própria lenda medonha, pois elas acabam por favorecer, ao final, os próprios infratores que procuram delinquir. A melhor maneira da sociedade e do Estado combater a insegurança pública e a violência é não ficar paralisado de medo diante delas. Por favor, não entenda que é pra reagir diante de um assalto ou se for abordado por qualquer infrator. É apenas para lembrarmos o seguinte, como afirmava o ex-presidente americano Theodore Roosevelt: “Faça o que você pode, com o que você tem, no lugar em que você está”. Enfim, não podemos “abrir mão” de ser cidadãos.
São essas algumas situações e declarações fora de contexto, que se impõe a todos nós como uma verdade, sem que possamos fazer um melhor exame sobre elas, e que acabam ditando, muitas vezes sem percebermos, nossas opiniões e escolhas. E nem tratamos do que aconteceu nas arquibancadas daquele jogo, domingo, que os vascaínos querem esquecer…
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