O caso do jovem que atirou “notas falsas” de R$ 100 sobre o governador José Melo (Pros), confeccionadas com a foto dele, poderia ter um dia de mídia e morrer no dia seguinte, mas foram os próprios aliados do governador, no afã de dar uma resposta ao chefe, que conseguiram manter vivo o tema por duas semanas. O barulho feito pelos aliados foi um tiro nos próprios pés e só serviu para alimentar os adversários. Até acusação de retorno aos métodos da ditadura militar houve, o que é um exagero.
No dia seguinte ao episódio seria de bom tom que os representantes do governador na Assembleia Legislativa protestassem contra o ato que o constrangeu. Ninguém com o mínimo de bom-senso cometeria uma indelicadeza daquelas com o governador, mas daí condenar o manifestante e tratá-lo como delinquente foi um remédio mal dosado. Tentar procurar culpados e até ameaçar o mandato de um parlamentar pelo ato também foi um erro de avaliação.
O líder do governo exibiu imagens tentando provar que houve participação do gabinete do parlamentar tanto na confecção do material quanto na execução do ato. Se houve participação, é preciso pesar o dispêndio do recurso investido nas cópias em preto e branco e a própria atuação do parlamentar para saber se a sanção de perda de mandato é adequada. Não é, seja o deputado aliado ou neutro. Como atua na oposição, a intenção de cassá-lo cheira a retaliação.
Dias depois, no sábado, a Polícia Civil foi à casa de Hinaldo de Castro Conceição e apreendeu um computador e os telefones dele e do irmão. No computador, a polícia encontrou a “arte” do material usado na “chuva de dinheiro” e divulgou como “prova do crime”. Outro erro, uma vez que o próprio manifestante já havia dito que confeccionou o dinheiro com o rosto do governador.
Por colocar o caso sob a investigação do Departamento de Repressão ao Crime Organizado, da Polícia Civil, o depoimento de Hinaldo Castro gerou uma mobilização de familiares e amigos, e, mais uma vez, o tema ganhou a mídia. Ora, querer relacionar um ato de protesto ao crime organizado foi outro erro dos que querem agradar o governador.
Consideremos a hipótese de o dinheiro falso justificaria a investigação pelo Departamento de Repressão ao Crime Organizado. Será que algum cidadão brasileiro poderia ser ludibriado por quem quisesse comprar com o dinheiro atirado em Melo, uma cópia em preto e branco e ainda mais com o rosto do governador? Sem a necessidade de qualquer análise técnica, é impossível dizer que o dinheiro do protesto foi confeccionado com a intenção colocá-lo em circulação. Nem de longe o dinheiro do protesto se parecia com cédulas de dinheiro circulante no Brasil.
Portanto, o próprio governo e seus aliados potencializaram e quase transformam o manifestante em herói, titulo que ele não merece, pelo conjunto da obra até aqui construída.
O caso ainda não foi encerrado e poderemos assistir a novos capítulos dessa novela, que poderia ser apenas um programa de um dia na cena política amazonense.
Valmir Lima é jornalista, graduado pela Ufam (Universidade Federal do Amazonas); mestre em Sociedade e Cultura na Amazônia (Ufam), com pesquisa sobre rádios comunitárias no Amazonas. Atuou como professor em cursos de Jornalismo na Ufam e em instituições de ensino superior em Manaus. Trabalhou como repórter nos jornais A Crítica e Diário do Amazonas e como editor de opinião e política no Diário do Amazonas. Fundador do site AMAZONAS ATUAL.
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