Por Henderson Martins, da Redação
MANAUS – A enfermeira Francineth Santos Júnior denunciou ter sofrido injúria racial em hospital e delegacia de polícia em Manaus. Ela prestou depoimento na manhã desta quarta-feira, 21, no 24° DIP (Distrito Integrado de Polícia), no inquérito sobre o caso, que ocorreu no dia 10 de janeiro deste ano no Hospital São Lucas, onde trabalha, e no 29º DIP, onde registrou Boletim de Ocorrência (BO).
Francineth disse que as ofensas ocorreram quando cumpria as normas internas da emergência pediátrica do hospital. Segundo ela, a mãe (J. M. V) de uma criança a ofendeu com declarações racistas. “O segurança deixou duas pessoas entrarem no setor de medicação pediátrica. A norma do hospital diz que todo paciente tem direito a um acompanhante. Nesse dia entrou o pai e a mãe da criança e como ela estava chorando bastante, deixamos ficar um pouco até se acalmar. Quando isso aconteceu, eu cheguei até o casal e pedi que um deles pudesse se retirar, pois a norma do hospital não permitia dois. Então, a mãe se retirou”, disse a enfermeira. “Depois, ela voltou novamente”.
Segundo Francineth Santos, foi o momento que a mãe da criança começou a chama-la de mal-humorada, mal-educada, de enfermeira preta e que não sabia o que estava fazendo lá, que não entendia o porquê de trabalhar no local, que não tinha o direito de estar ali, não era o seu lugar. “Quando uma colega foi tirar a pulsão da criança, ela falou para técnica: ‘olha essa enfermeira preta ai, essa preta nojenta’. Ela foi falando pelo corredor e a nossa agente de limpeza ouviu quando ela disse: ‘Por isso que não gosto de preta, preto quando não suja na entrada, suja na saída’. Nunca fui tão humilhada. Minha vontade era apenas de chorar. E chorei muito. Mesmo assim, fui no mesmo dia ao 29º DP registrar o B.O por injuria racial”, disse.
Também na delegacia, Francineth diz ter sofrido nova discriminação. Segundo ela, o atendente, ao ouvir o relato do caso, disse: “Esse caso não é injuria racial, pois você é preta mesmo”.
A coordenadora do Dandara (Movimento das Mulheres Negras da Floresta), Francy Júnior, que acompanha dois casos de injúria racial em Manaus, disse que vem recebendo denúncias desde 2003. Segundo ela, a grande dificuldade é que as vítimas acabam desistindo de tomar qualquer previdência por falta de apoio das instituições ou da própria família.
“No caso da Francineth, nós demos entrada na Comissão de Direitos Humanos da ALE (Assembleia Legislativa do Estado do Amazonas) para que desse todo o amparo jurídico. Também fizemos denúncias na Comissão da Verdade na Escravidão no Amazonas, na OAB (Ordem dos Advogados do Brasil – Seção Amazonas), na Sejusc (Secretaria de Justiça, Direitos Humanos e Cidadania) e na Comissão de Igualdade Racial”, disse Francy.
A coordenadora disse que é importante que as vítimas nunca deixem de fazer o B.O. “As pessoas que cometem injúria racial podem responder criminalmente, com penalidade de prisão de 1 a 3 anos, ou pagamento de finança, ou em casos civis, penalidade por danos morais, algo que atinge a questão financeira”, disse.
Mais casos
Outro caso que está sendo acompanhado pelo movimento Dandara é de uma mulher que sofreu discriminação dentro de um ônibus do transporte de passageiros, em 2014. O caso envolve uma cobradora que se referiu à mulher como ‘preta suja’. A vítima, nervosa, começou a chorar e recebeu apoio de outros passageiros.
A vítima fez o B.O e foi chamada na delegacia. Ela foi ouvida em dezembro de 2015, mas a acusada nunca foi encontrada. O caso foi encaminhado à 1ª Vara do Juizado Especial Cível. O processo está parado.