Por Cleber Oliveira e Maria Derzi, da Redação
MANAUS – Não deixa de ser um concurso público, com a diferença de que é realmente o público quem aprova os candidatos. O cargo é atrativo: salário mensal de R$ 15,031 mil, mais verba de gabinete no valor de R$ 60 mil (para bancar assessores) e outros R$ 14 mil mensais da Ceap (Cota de Exercício da Atividade Parlamentar). Esse dinheiro, chamado de ‘Cotão’, é para ser gasto com despesas consideradas típicas da atividade parlamentar de vereador como transporte (combustíveis e aluguel de carros), correspondência (comunicação) e alimentação. São 41 vagas para esse ‘concurso’ político à CMM (Câmara Municipal de Manaus), uma proporção de 43 candidatos por vaga.
Estão de olho nesses atrativos 1.411 candidatos. São gente como profissionais liberais, advogados, psicólogos, sociólogos, motoristas, comerciantes e empresários. Também estão na disputa professores, muitos professores, estudantes, militares, servidores públicos e donas de casa. Entre esses postulantes, 73% declararam ‘outros’ como profissão, não especificada no registro de candidatura. A maioria se declarou branco, tem média de idade de 35 anos e com ensino médio completo.
Estudo realizado no ano passado pela ONG Transparência Brasil revelou que a CMM desponta como o terceiro legislativo mais caro do país, perdendo apenas para São Paulo, que paga R$ 156 mil por mês a cada um de seus vereadores incluindo salário, verba de gabinete e Ceap. No Rio de Janeiro, esse custo mensal é de R$ 107 mil por parlamentar. Um vereador de Manaus custa R$ 89 mil por mês ao contribuinte.
No ano passado, os 41 vereadores de Manaus gastaram R$ 5,878 milhões da Ceap. Desse valor, 35,60% (R$ 2.093.377,30) foram gastos com o aluguel de veículos. Os demais gastos foram com combustíveis, contratação de serviços gráficos e papelaria, restaurantes, telefonia e consultorias.
Com dinheiro farto para fazer política, e também uma carreira pública financeiramente estável, a Câmara atrai interesses também de cantores, jornalistas, técnicos em agronomia, taxistas, industriários, farmacêuticos, corretor de imóveis, mecânico, porteiro de edifício, capitalista de ativos financeiros, sacerdote, agente de saúde, trabalhador da construção civil e até produtor de espetáculos públicos.
Dinheiro e poder
O analista político Tiago Jataúna considera dois fatores sobre os atrativos para se tornar um vereador. “É claro que a questão financeira é atraente, mas por outro lado tem a dimensão de influenciar no poder e no processo decisório das políticas públicas”, disse. “Além da questão financeira, embutida no salário, tem a possibilidade de ter mais acesso a outros tipos de recursos e a participação direta no processo decisório. Tem esse duplo interesse: financeiro e poder”, explicou.
Em tese, Tiago disse que o poder de influenciar nas decisões de muitos pode ser um dos motivos pelos quais pessoas que já têm um bom poder aquisitivo busquem a política. “Tanto é que muitos profissionais que já têm uma renda salarial alta se aventuram no mundo da política porque, na verdade, não é apenas uma questão financeira, mas é também pela influência no poder, avalia.
O analista afirma que essa influência de poder também pode, posteriormente, gerar ainda mais recursos financeiros além do salário de vereador. “Até porque, para ser eleito o político precisa também desembolsar recursos, precisa de apoio de pessoas físicas para auxiliar financeiramente e, quando se conquista a eleição, eles precisam repor o que foi gasto”, disse.
Na teoria, o papel é o de mostrar os problemas da comunidade e buscar providências junto aos órgãos competentes. A principal função, porém, é fiscalizar as contas do Poder Executivo, os atos do prefeito, denunciando o que estiver ilegal ou imoral à população e aos órgãos competentes. É, em tese, o fiscal do dinheiro público.