Muitas coisas impressionam no atual contexto de disputa pelo poder entre forças políticas antagônicas no Brasil, em especial sob a desculpa de que se pretende combater a corrupção e defender a democracia.
A primeira delas é por que, ao invés de se reduzir tudo a mera troca de um nome ou um partido por outro à frente do comando da nação, não se procede efetivamente à reforma política e institucional de que o país tanto necessita? O simples fato de conseguirem o impeachment da “presidenta”, não significa combate efetivo à corrupção sistêmica nem a promoção da democracia. Caso as regras e as leis que estruturam o sistema representativo, partidário e eleitoral não se alterem nem sejam reformadas, concretamente, nada muda e, dependendo de quem passe a comandar o país, pode ficar até muito pior. Há um grave problema de coerência entre meios e fins. O meio disponível não é suficiente para alcançar o fim pretendido. Combater a corrupção, punir e impedir abusos econômicos e políticos, e fortalecer a democracia não se resume a afastar alguém da Presidência da República. Isso já foi demonstrado, basta lembrar o que ocorreu após o afastamento do ex-presidente Collor. O mesmo sistema persistiu, prosseguiu até aqui e deu no que deu. Collor chegou a ser absolvido de todas as acusações pelo STF. O país revisou suas regras para aprimorar o combate à corrupção? Negativo. Resultado: algo bem maior e pior ocorreu depois. Por isso, não faz nenhum sentido certos arroubos, histerias e irracionalidades ideológicas sem que as devidas providências sejam realmente adotadas no sentido de se combater a corrupção e realizar uma reforma política e institucional no país. Sem a necessária reforma política e das instituições, tudo não passa de apostas viciadas e teatro de bizarrices; é como querer fins sem os meios.
A segunda, por que até hoje não se formou um projeto de país minimamente consensuado entre as forças políticas da nação? O que continua impedindo um consenso mínimo entre as correntes e partidos políticos para se compor um projeto viável para o Brasil? Por que o presente sempre pretere o futuro do país?
Terceira, será que a sede por saquear o país enquanto se constroem “mitos e messias” políticos é tanta que cega a partidos e organizações a ponto de inviabilizar qualquer perspectiva de desenvolvimento coletivo para todas as regiões do Brasil? Ou, atrás disso, estaria o renovado empenho de certa região e suas tradicionais oligarquias por serem predominante sobre as demais, como tantas vezes ocorreu na história do país? Uma única região, o sudeste, que concentra investimentos, define prioridades, usurpa a nação, servindo as sobras às demais regiões?
Quarto, a considerar o rateio da arrecadação e a participação das vontades regionais na formação da vontade nacional, até quando insistiremos num federalismo meramente formal e, tradicionalmente, em concreto, continuar sendo um Estado unitário?
Quinto, por que não se convertem os partidos em instituições formadoras de cidadãos e para o benefício da sociedade e da cidadania? Por que tamanha demora para reformar as regras que tratam de atuação institucional e da democracia intra-partidária?
Sexto, por que não se estabelecem critérios mínimos de idoneidade e de compromisso com a coletividade para que um cidadão, uma pessoa física, possa credenciar-se a representar outras pessoas e cidadãos como candidato a um cargo eletivo?
A indiferença quanto a essas “coisas” e outras questões, reduzindo tudo a uma mera disputa, um joguete entre forças político-partidárias, é o que impressiona sobremaneira, pois os meios pelos quais se poderia efetivamente combater a corrupção e contribuir para o desenvolvimento da experiência democrática não estão em pauta no congresso, sequer tem previsão real de serem tratados. Soa muito mal senão péssimo que, apesar de tudo o que esteja ocorrendo e que ocorreu até aqui, nada de efetivo tenha sido realizado para se promover uma reforma política e institucional consequente.
Na realidade, até aqui, tudo não tem passado de uma velha e viciada encenação entre aqueles que disputam o controle da máquina federal. Uns para manter, outros para derrubar e ascender, mas sempre em proveito da própria facção, sem tratar do que importa ao país e à medição politica democrática. Um teatro cínico, hipócrita, que frustra a democracia, cuja cena final já se sabe qual é. E, pior, quem é que vai pagar a conta dessa viciada jogatina, suas velhas desculpas e horrendas encenações.
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