O dia 19 de abril é o Dia do Índio, dia dos indígenas. Como a maioria das datas comemorativas, a razão da existência desse dia é lembrar e reafirmar as lutas por direitos.
A Constituição Brasileira de 1988, a mais avançada da história do Brasil, somente no último capítulo (Capítulo VIII), prevê dois artigos que tratam dos povos indígenas no país.
O caput do artigo 231, diz que “São reconhecidos aos índios sua organização social, costumes, línguas, crenças e tradições, e os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam, competindo à União demarcá-las, proteger e fazer respeitar todos os seus bens”.
Cumprir esses direitos é o desafio. Historicamente, os indígenas tiveram suas terras invadidas, saqueadas, afetadas por atividades empresarias e predatórias, por exploração ilegal de madeira, grilagens, ocupações com atividades agropecuárias, além da violência e das doenças que atingem, até hoje, os vários grupos e etnias no país.
As demarcações são lentas e, nos dias atuais, cada vez mais difíceis, devido a oposição de grupos políticos no Congresso Nacional, representando o agronegócio e outros setores empresariais.
No período dos dois governos do Lula houve um grande avanço nas demarcações e nas políticas públicas, na saúde, na educação e na assistência dos povos indígenas. No Governo Dilma, com menos intensidade. Mas agora, com o governo interino e ilegítimo do golpista Temer, parou tudo.
E prosperam propostas para retirar os direitos dos indígenas e enfraquecer a atuação de órgãos como a Funai, na sua competência de fazer os estudos para a definição das demarcações.
O dia 19 de abril foi um dia de protestos e de lutas. O Fórum de Educação Escolar Indígena do Amazonas – FOREEIA, junto com outras entidades e movimentos sociais, organizaram a Marcha da Resistência Indígena no Amazonas 2017, inserido num calendário de lutas e resistência indígena no mês de abril, cobrando dos diversos órgãos públicos estaduais, ações concretas para garantir e promover direitos.
A Marcha foi uma forma de protesto contra os Projetos de Lei que tramitam no Congresso Nacional e na Assembleia Legislativa, como a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 215, que pretende transferir a responsabilidade das demarcações de terras indígenas para o Poder Legislativo. Para os indígenas, essas mudanças são consideradas ameaças para a manutenção da cultura tradicional e aos direitos já adquiridos por eles.
Aqui no Amazonas, dentro do Projeto da Nova Matriz Econômica e Ambiental do Governo do Estado, a atividade de mineração estará sendo apoiada e incentivada. Mas grandes reservas minerais estratégicas estão localizadas em terras indígenas. Essa é uma questão que merece mais discussão pelos impactos ambientais, culturais, sociais e econômicos, afetando os povos indígenas.
O Estado tem a maior quantidade de povos indígenas do país. Uma grande diversidade de etnias, povos e grupos, a maioria não conhecidas pela sociedade. Uma riqueza cultural extraordinária, que precisa ser preservada, valorizada e usada para gerar renda para os povos indígenas, principalmente nas atividades turísticas e de artesanato regional.
As políticas sociais ainda são reduzidas nas áreas da saúde e da educação indígenas. A migração para a capital é crescente. Manaus tem mais de 20 mil indígenas. E o pior é que o município não tem uma política sequer para essas milhares de famílias que se fixam na capital. Não há política de terras, nem de habitações e nem de educação. São dezenas de centros culturais não reconhecidos pelo Pode Público e, na maioria, não tem apoio estrutural nas atividades educacionais.
Essas são algumas denúncias apresentadas pela Pastoral Indigenista da Arquidiocese de Manaus, presente na Sessão Especial ocorrida na ALE, dia 19, que contou com pouquíssimos deputados presentes. Na ALE tomada por centenas de indígenas, diversas lideranças, pajés, caciques, houve a ausência da maioria dos deputados. Uma vergonha. Lamentável. A pauta indígena não é prioridade para eles.
Os indígenas não tem representação parlamentar própria. Não tem deputado estadual e nem deputado federal. No Brasil, dos 513 deputados federais, nenhum é indígena.
Uma questão gritante é a falta de recursos públicos estaduais voltados para os povos indígenas. No Amazonas existia uma Secretaria Estadual de Políticas Indígenas (SEIND), extinta em 2015 pelo atual governador Melo e criada a Fundação Estadual do Índio, vinculada à Secretaria de Estado de Justiça, Cidadania e Direitos Humanos e com orçamento reduzido.
Em 2014 a SEIND tinha R$ 12 milhões no orçamento e em 2015 reduziu para R$ 10 milhões. Em 2016, com a Fundação, o orçamento ficou em R$ 3,4 milhões anuais e em 2017 menor ainda, R$ 1,9 milhões. Não é nada. Parece brincadeira de mau gosto.
Por isso, apresentei esta semana, na ALE, uma PEC que prevê a destinação de 0,5% da receita tributária do Estado, para assistência, valorização cultural, geração de renda, organização e promoção dos direitos dos povos indígenas. Uma vez aprovada, os recursos anuais chegariam a R$ 41 milhões, com base no orçamento de 2017. Sem recursos não se faz política pública e os discursos só terão valor se tiver ações concretas.
Também foram apresentadas emendas no orçamento impositivo, aprovado no ano passado, valendo para 2017, com recursos destinados à FEI, à Pastoral Indigenista e para o Instituto Federal (Ifam) de São Gabriel da Cachoeira, que tem cursos destinados aos indígenas.
A luta pelos direitos dos povos indígenas é de toda a sociedade. E como muito bem está estampado na capa do Jornal Amazonas em Tempo do último dia 20: Dia do Índio, A LUTA CONTINUA.
José Ricardo Wendling é formado em Economia e em Direito. Pós-graduado em Gerência Financeira Empresarial e em Metodologia de Ensino Superior. Atuou como consultor econômico e professor universitário. Foi vereador de Manaus (2005 a 2010), deputado estadual (2011 a 2018) e deputado federal (2019 a 2022). Atualmente está concluindo mestrado em Estado, Governo e Políticas Públicas, pela escola Latina-Americana de Ciências Sociais.
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