Por Maria Derzi, da Redação
MANAUS – A instabilidade econômica e os efeitos da crise ética na política formaram um ambiente de gestão para os próximos anos que exigirá dos novos prefeitos atitudes pouco comuns: contenção de gastos para priorizar investimentos sem afetar os serviços essenciais e transparência na aplicação de recursos para obter apoio popular. Com população de 2,094 milhões de habitantes, segundo o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), Manaus se insere nesse cenário e necessitará de uma gestão que os especialistas definem como ortodoxa.
Alguns problemas precisam ser ‘atacados’ de imediato. “A mobilidade urbana, como em toda a cidade, em Manaus tem esse mesmo sentimento que é ausência de um sistema de transporte urbano eficiente”, cita economista Luiz Roberto Coelho Nascimento, professor da Ufam (Universidade Federal do Amazonas). “É preciso observar também o programa de crescimento da cidade, que deve ser pautado no direito de propriedade. Temos invasões recorrentes de áreas verdes para fazer moradias. O ano de 2017 promete ser de grandes desafios”, disse.
Luiz Nascimento considera que esse cenário não é diferente do que os prefeitos anteriores enfrentaram. “Isso porque o quadro econômico nacional, aliado a crise ética e até política, vislumbra a necessidade de gestão municipal pautada na concentração de prioridade, de contenção de gastos pela busca do equilíbrio financeiro, mas sempre atento a uma melhora na arrecadação para poder ter capacidade de investimento e atender os anseios da população”, ponderou.
O economista afirma que a transparência nas ações é fundamental para que o novo prefeito obtenha apoio popular. “O prefeito eleito e seus secretários deverão abrir uma interlocução com seus munícipes para mostrar o real quadro econômico/administrativo que herdaram ou que está em curso e, se possível, trazer a população, a sociedade civil organizada como grandes parceiros para essa travessia difícil que estamos passando evitando vender prosperidade e entregar pesadelo”, disse Nascimento.
Coelho diz que não é verdade que os prefeitos costumam investir mais em obras do que em serviços. “A prefeitura tem realizado trabalho nas duas frentes. Os serviços preponderantes são educação, saúde, limpeza urbana e trânsito. No entanto, uma cidade como Manaus precisa de muitas obras, inclusive para desafogar o trânsito. O problema é o orçamento. Este é curto para uma cidade de mais de 2 milhões de habitantes. O ideal seria um orçamento, no mínimo, de 8 bilhões de reais”, disse.
Luiz Roberto propõe a implementação de um plano de expansão urbana. “A cidade, ou seja, a população precisa saber quais são as terras da prefeitura. A prefeitura precisa estabelecer que áreas poderão ser ocupadas com urbanização, demarcar essas áreas, definir regras de ocupação e ter maior rigidez contra as invasões. Deve cumprir o código de postura como se estivesse em um país desenvolvido. Enfim, o prefeito deve priorizar a economia institucional como fazem os países desenvolvidos”, sugeriu.
Sobre propostas para garantir segurança pública, do economista diz que a prefeitura tem pouco a fazer. “Eles até podem investir nessa frente, mas o máximo que podem fazer é instalar câmeras pela cidade e no transporte coletivo. Criar uma guarda municipal envolve muitos recursos e o resultado é mínimo”, afirmou.
Mudança de hábito
Para o arquiteto e urbanista João Bosco Chama, o enfrentamento dos problemas urbanos passa pela mudança de hábito da população. “Falta hábito urbano, espírito de coletividade, exercício de cidadania. Também falta mobilidade, mas isso já está melhorando. É preciso conseguir recursos para investir em infraestrutura”, disse.
João Bosco defende que os secretários municipais precisam conhecer, realmente, todos os aspectos da pasta que assumirem. “É preciso ter bons projetos detalhados e ter secretários competentes e que zelem pelo erário público. Também aponto que é necessário realizar um trabalho em harmonia com as esferas estadual e federal e deixar tudo claro através do Portal Transparência”, disse.
Conforme o arquiteto, ser prefeito é ter consciência da necessidade de intervir no espaço físico da cidade. “Prefeitura é fazer, na maioria das vezes intervenções no território urbano. Pontes, ruas, calçadas, escolas, postos de saúde, praças, parques, feiras, mercados, terminais de ônibus, paradas, estacionamentos, quadras esportivas. Consequentemente, vem os serviços. O prefeito é um grande síndico. Além de empreender tem que dar manutenção”, comparou.
João Bosco explica que o prefeito deve eleger políticas públicas condizentes com as reais necessidades da cidade. “Deve eleger uma política de controles: conscientização de natalidade, filtragem da imigração, antecipação na preparação do território urbano para assentar o munícipe e promover incentivos a pequenos núcleos industriais”, citou.
Desafios Ambientais
As intervenções urbanas implicam não só melhorias na mobilidade e moradias, como também em equilíbrio ambiental. Nesse sentido, o coordenador executivo da FVA (Fundação Vitória Amazônica), Fabian Lopez da Silva, diz que o controle da ocupação urbana é fundamental para evitar danos ambientais. “O desafio de todo e qualquer governante municipal deve ser a preocupação com a questão do saneamento básico e tratamento de resíduos. Isso é um passivo que a cidade tem histórico e que em algum momento deve ser encarado de frente. Outros elementos mais específicos e fundamentais é controlar as invasões sobre áreas florestais e avançar, de maneira muito mais estratégica, no planejamento de uso e ocupação do solo do município. Eu diria que essas são questões fundamentais mais prementes que a cidade tem hoje”.
Fabiano também sugere que o poder público deve manter atenção na recuperação dos igarapés e das áreas de preservação permanente da cidade. “Eu diria para termos uma atenção específica com o tratamento dos igarapés, qualidade da água e recuperação das matas ciliares. Outra questão que deve receber atenção especial do poder público é a preservação do saium-de-coleira (sauim de Manaus). É um terceiro elemento fundamental e emblemático para a cidade de Manaus pois é macaco (primata) endêmico da cidade de Manaus e é um dos principais animais em perigo de extinção do Brasil”, citou. “Ele (o macaco) é um dos que estão em maior risco de extinção e a sua sobrevivência está, em grande parte, sob a responsabilidade da gestão municipal, uma vez que ele só existe em Manaus”, lembrou.
Investimento e gestão mais eficientes dos parques e áreas púbicas verdes municipais também estão entre as prioridades apontadas por Fabiano. “Vários dos parques municipais estão bastante sucateados, com invasões, com pouquíssimo investimento na gestão e operacionalização dessas áreas. Então, diria que esse é também um fator importante e necessária para receber a atenção do próximo prefeito”.