MANAUS – Ouvi de um amigo que a proposta de Fernando Haddad para as comunicações era temerária e ameaçava o negócio de pessoas como eu, que mantenho no ar o site Amazonas ATUAL há cinco anos. Refutei a informação, mas ele não se deu por vencido. Disse que havia lido a proposta de governo de Haddad e que estava tudo lá. “Querem dar emissoras de rádio para universidades e sindicatos”, dizia ele.
Pois bem, fui direto à fonte e a proposta é o contrário do que pregam aqueles que estão sob o medo do futuro com uma eventual vitória de Haddad. A proposta, na verdade, fala em “promover a democracia, o pluralismo e a diversidade na mídia”. Quem em sã consciência pode ser contra esses três princípios?
Ouvi também de um comentarista em uma rádio nacional que a proposta de governo de Haddad era uma ameaça à liberdade de imprensa e a volta da cesura aos meios de comunicação. Mentira. Ao contrário, o que está proposto é a descentralização dos meios de comunicação eletrônicos (rádio e TV) das mãos de poucos. Isso é pluralismo.
Em duas oportunidades, a proposta deixa claro que não haverá qualquer interferência no conteúdo produzido pelos veículos de comunicação. “As comunicações devem ser livres da ação de controle das autoridades e governantes, impedindo toda e qualquer tipo de censura, mas também da dominação de alguns poucos grupos econômicos. A liberdade de imprensa é fundamental; o pluralismo e o acesso a fontes diversificadas e independentes de informação também são essenciais em uma sociedade verdadeiramente democrática”, diz o primeiro parágrafo da proposta.
O que o plano propõe é um novo marco regulatório da comunicação social eletrônica (rádio e TV), que é distribuído por concessão pública. A lei que regulamenta o setor é de 1967 (do regime militar). Não há quem possa negar que o atual sistema de distribuição de canais impede a diversidade e a pluralidade da mídia eletrônica, altamente concentrada nas mãos de pouquíssimos grupos econômicos e políticos. Há na proposta a proibição de concessões de rádio e TV para políticos, inclusive, o que para a sociedade brasileira é muito bom.
O candidato também propõe mudanças na Lei das Rádios Comunitárias, que atualmente impede qualquer possibilidade de sucesso dessas emissoras, dadas as dificuldades técnicas e econômicas, impostas pela legislação que as regulamentam.
Sobre universidades e sindicatos, a proposta é muito clara: “A distribuição das concessões deve ampliar a participação de universidades, sindicatos e organizações da sociedade civil nas outorgas para o sistema público e privado de televisão e rádio”. Em diversos países da Europa universidades, sindicatos e entidades civis têm concessões de rádio. E no Brasil, também. Os sindicatos podem compor a entidade que deve ser criada para pleitear uma concessão de rádio comunitária. São poucos os que se interessam por isso. Aliás, os sindicatos investem muito pouco recurso em comunicação no Brasil. Mas não há nada que os impeçam de ter jornal, sites, canais de vídeo, etc. Há dificuldades de acesso às concessões de rádio e TV.
Por fim, a proposta para a Internet e divisão da publicidade governamental. A proposta de Haddad visa garantir o acesso à internet de alta velocidade aos mais pobres, porque hoje ela só está acessível a quem pode pagar. “O governo Haddad criará o programa Brasil 100% Online, que prevê fortes investimentos para garantir a universalização da banda larga barata e acessível para todos e todas”, diz a proposta.
E sobre a publicidade governamental, diz: “O governo promoverá ainda a desconcentração dos investimentos publicitários estatais, de forma a promover a diversidade, inclusive regional, e impedir que os gastos públicos reforcem a concentração na comunicação”. Como se vê, não ameaça, mas abre possibilidade de outros veículos receberem verba publicitária que hoje só chega para os grandes grupos econômicos da comunicação.
Para quem acha que nada disso é verdade, acesse a proposta, ou leia abaixo o que diz sobre comunicação.
PROMOVER A DEMOCRACIA, O PLURALISMO E A DIVERSIDADE NA MÍDIA
O direito à comunicação tem sido constantemente violado no Brasil. A diferença na condição de exercício da liberdade de expressão é uma das desigualdades centrais e uma ameaça efetiva à democracia na sociedade brasileira. Todas as democracias consolidadas do mundo estabelecem mecanismos de regulação democrática como forma de apoiar o amplo exercício do direito humano à comunicação. As comunicações devem ser livres da ação de controle das autoridades e governantes, impedindo toda e qualquer tipo de censura, mas também da dominação de alguns poucos grupos econômicos. A liberdade de imprensa é fundamental; o pluralismo e o acesso a fontes diversificadas e independentes de informação também são essenciais em uma sociedade verdadeiramente democrática.
Ademais, é preciso superar o anacronismo da legislação de 1962 que dispõe sobre rádio e TV. Para enfrentar esse quadro, o governo Haddad irá apresentar, nos seis primeiros meses de governo, uma proposta de novo marco regulatório da comunicação social eletrônica, a fim de concretizar os princípios da Constituição Federal para democratizar largamente a comunicação social e impedir que beneficiários das concessões públicas e controladores das novas mídias restrinjam o pluralismo e a diversidade.
Em linha com o artigo 220 da CF, deve-se impedir monopólios e oligopólios diretos e indiretos, bem como impor limites à concentração dentro do mesmo mercado por meio de restrições à propriedade cruzada (controle de diferentes mídias) e à integração vertical (controle de diferentes atividades da mesma cadeia de valor), bem como vedação de toda e qualquer censura pública ou privada de natureza política, ideológica e artística; é preciso proibir também que os agentes políticos e seus familiares sejam detentores de concessões, e, ainda, fomentar a produção de conteúdos locais e regionais.
O monitoramento e aplicação dos princípios constitucionais deve se dar por meio de um órgão regulador com composição plural e supervisão da sociedade para evitar sua captura por qualquer tipo de interesse particular. O novo marco regulatório deverá levar em conta o cenário de convergência efetiva das comunicações, que transforma o controle econômico do setor em uma batalha global, na qual tempo de audiência e verba de publicidade são disputados por velhos e novos atores. Nesse contexto, regulação e políticas para o setor devem garantir a soberania econômica, cultural e política nas comunicações.
Outro problema central da efetividade do direito humano à comunicação é que o acesso à Internet em alta velocidade está hoje condicionado à renda dos cidadãos, o que amplia o fosso, entre pobres e ricos, de acesso a direitos e serviços. O governo Haddad criará o programa Brasil 100% Online, que prevê fortes investimentos para garantir a universalização da banda larga barata e acessível para todos e todas. O programa terá como meta garantir que todos os domicílios brasileiros tenham condição de acessar a Internet de alta velocidade, a um preço acessível, bem como baratear e melhorar a qualidade do acesso à Internet pelo celular. Para isso, o Brasil 100% Online vai:
i) conectar mais de 2 mil municípios à rede fibra ótica;
ii) garantir que o Satélite Geoestacionário brasileiro seja usado para conexão de rádio IP em municípios de pequeno porte, áreas rurais e distritos isolados. Nosso governo não privatizará o Satélite Geoestacionário, como quer Temer e PSDB. A capacidade do satélite será utilizada para as políticas de Defesa Nacional e para a Telebrás universalizar a internet banda larga. A inclusão digital deve se sobrepor ao lucro privado de grandes empresas;
iii) fazer com que todos os distritos brasileiros [mesmo aqueles afastados da sede dos municípios recebam sinal de celular;
iv) exigir das empresas que forneçam conexão de alta velocidade a 3.600 municípios que hoje só contam com 3G
O governo Haddad dará especial atenção à implementação da recém-aprovada Lei de Proteção de Dados Pessoais, inclusive à efetiva implantação da autoridade nela prevista e à consolidação prática do Marco Civil da Internet enquanto fundamento legal da jurisdição brasileira sobre as atividades na internet em território nacional, sendo assegurada a neutralidade da rede. Serão ainda fomentadas pesquisas e realizados investimentos em inovação que ampliem a presença de empreendedores brasileiros na Internet.
É essencial ainda restaurar o projeto da Empresa Brasil de Comunicação, de forma a retomar seu caráter público, garantir seu financiamento adequado e perene com recursos públicos, e ampliar seu impacto e seu alcance de audiência, para que tenha capacidade de contribuir efetivamente com a promoção do pluralismo e da diversidade.
A distribuição das concessões deve ampliar a participação de universidades, sindicatos e organizações da sociedade civil nas outorgas para o sistema público e privado de televisão e rádio. Faz-se necessário também fortalecer as emissoras de rádio e TVs comunitárias, que devem ser reconhecidas e contar com políticas públicas que promovam a sustentabilidade financeira, garantam condições igualitárias de potência e impeçam sua captura por grupos econômicos, políticos e religiosos. Em face disso, será preciso redefinir o papel da Anatel e da Polícia Federal para impedir perseguições.
O governo promoverá ainda a desconcentração dos investimentos publicitários estatais, de forma a promover a diversidade, inclusive regional, e impedir que os gastos públicos reforcem a concentração na comunicação.
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