O Melo é um Melodrama. Uma caricatura do que poderia ter sido e não foi, desde menino ou muito jovem, ainda mal chegado a Manaus do longínquo Juruá, em guarani, um rio de boca larga, sem maiores alusões. A vida, a partir de certo momento, foi-lhe generosa. De manipulador de iscas e de caniços nas pescarias pelos rios amazônicos, terminou ascendendo com sucesso, mas sempre de forma desairosa. Venceu, quando deveria ter perdido. Seria, como se vê, bem melhor se tivesse perdido. Ficou rico, muito rico, como atesta seu vasto patrimônio, mas terminaria amargando o cárcere e o opróbrio nestas semanas de festejos de fim de ano.
Um drama, com trágico e triste fundo musical, um conjunto não harmônico de sons e ecos da selva. Valeu a pena, talvez agora pense, sei lá? Dele sabe-se também que na Universidade Federal do Amazonas cuidou da divisão de informações, espécie de SNI universitário, ou algo que o valha, durante o regime militar. Trocando em miúdos, exercia o controle sobre todos e sobre tudo o que acontecia na instituição federal de ensino. Apontava o dedo, examinava currículos, identificava subversivos, aprovava e vetava nomes que pudessem aplaudir ou criticar a “Revolução Militar”, a quartelada de 1964.
Tenho um amigo, talentoso e de sólida formação profissional e cultural, que foi uma de suas vítimas, dentre tantas outras. Indicado pelo então reitor para assumir uma das vice-reitorias da Ufam, foi obrigado a explicar-se ao todo-poderoso chefe de informações da Universidade. O encontro não foi nada agradável, frente à petulância de Melo. Não cedeu nenhum milímetro e assim perdeu a oportunidade de ser nomeado. Paciência, ainda hoje relembra os fatos, com orgulho de não ter cedido aos caprichos do arrogante representante do golpe militar.
Com o Brasil já em processo de redemocratização, Melo é agora encontrado como delegado do Ministério da Educação no Amazonas, certamente como rescaldo de sua atuação policialesca na Universidade. Em fase camaleônica, em período de plena mutação de pele e conveniente mimetismo, chega a secretário de Educação do Estado, mais um grande equívoco, típico do poder no Amazonas. Já então ostentava o título de professor (?), não se tem ideia conferida por quem e a que título, diante de sua fragilíssima capacidade de comunicação – quase tatibitate, como demonstrou em sua última campanha eleitoral. Sem maiores atropelos, a não ser as críticas tecidas, com habitual genialidade, pelo talento do senador Evandro Carreira e pela pena magistral e cortante do nosso José R. Bessa Freire, atingiria a culminância com a força e a rapidez de um meteoro. Tinha, portanto, que chegar aonde chegou: deputado federal, estadual, vice-governador e governador, um futuro absolutamente previsível, na esteira de tantos outros que o conquistaram com currículo semelhante. Vale lembrar que Melo foi secretário de Governo – primeiro-secretário e articulador político do governo Eduardo Braga, com forte e ampla atuação nas diversas composições políticas no interior do Estado. Foi Braga que o fez candidato a vice-governador na chapa vitoriosa de Omar Aziz, decisão qu e permitiu em seguida sua promoção ao centro do poder local.
Deste modo, Melo não está aí por acaso, vem de longa carreira, apoiado em lideranças muito bem identificadas. Neste momento, preso, com fotografias insultuosas que circulam com intensidade nas redes sociais, ‘fakes’ ou verdadeiras pouco importa, não há quem admita tê-lo protegido ou apadrinhado sua ascensão política e administrativa no Estado. Esquecem que Melo é arquivo vivo perigoso de tudo o que ocorreu nas últimas décadas no Amazonas, com potencial explosivo de muitos megatons, especialmente em homenagem à sua inata vocação e notadamente quando somado aos dossiês de sua mulher, que parece disposta a tudo para salvar o marido de condenações a penas de difícil cumprimento, nas atuais circunstâncias e em função da idade avançada do indigitado, em ampla acepção.
Melo nos oferece um espetáculo popularesco e caboclo, no pior sentido. Expressa uma traição melancólica e trágica ao que temos de melhor em nossas origens, como povo simples e sábio. Um dia, ainda que possam ser compreendidos ou melhor estudados, os arrivistas e infiéis passarão. Afinal, cumpre insistir com nossos valores inaugurais e fundamentais de forma afirmativa perante a Nação e o Mundo, com lições que resultam de um maravilhoso caldeamento de raças e etnias, lá atrás, inteligentemente detectadas pelo gênio de Darcy Ribeiro e de tantos outros renomados antropólogos.