A semana passada foi fechada com uma nota pública da Associação de Juízes Federais contra o presidente do Senado, Renan Calheiros, a quem acusam de comandar uma ofensiva contra os magistrados brasileiros por conta das investigações contra ele e umas dezenas de políticos de Brasília na Operação Lava Jato. A nota foi divulgada na imprensa nacional como uma ofensiva do Judiciário contra as estratégias de Renan Calheiros.
Não há santo nessa história. É verdade que Renan Calheiros e seus asseclas movem céus e terra para tentar aniquilar ou enterrar a Lava Jato ou barrar operações desse tipo no Judiciário brasileiro. Mas essa verdade não pode esconder o que pode ser muito bem taxado como um escândalo: a remuneração de magistrados e de outros servidores de elite dos poderes Legislativo e Executivo.
O presidente da Associação dos Juízes Federais, Roberto Veloso, diz na nota: “É de estranhar que somente agora, quando o Judiciário está empenhado no enfrentamento da corrupção, venham iniciativas do tipo ‘controle de salários’, ‘abuso de poder’ e ‘crimes de responsabilidade’ de juízes de primeiro grau, levando à conclusão que se trata de ameaças de intimidação da magistratura”.
A nota foi divulgada depois que Renan anunciou na quinta-feira, 10, a criação de uma comissão com a missão de identificar os servidores dos Três Poderes que recebem salários mais altos que o teto constitucional. Para os juízes federais, Renan busca uma vingança por causa da Lava Jato e outras ações de combate à corrupção.
Se é vingança ou não, para a sociedade brasileira tal ato não tem a menor importância. Se a constituição estabelece um teto para a remuneração dos servidores públicos e se os magistrados estão incluídos nessa categoria de trabalhadores, como permitir que estejam acima da Constituição da República?
Há que se repudiar, sim, outras iniciativas, como o abuso de poder e crimes de responsabilidade contra magistrados, sob pena de inviabilidade de investigações como a Lava Jato. Mas é bom que se diga que esse tipo de investigação não é regra no Judiciário brasileiro. A regra é não investigar autoridades. A corrupção graça em todos os setores do serviço público e a maioria dos gestores e políticos sangram os cofres públicos sem serem incomodados.
Por outro lado, os magistrados, que nos dias atuais se vestem de togas como nos tempos medievais e insistem em dizer que os tribunais são “cortes”, adoram viver nababescamente, às custas dos pagadores de impostos, como nos tempos remotos.
No Judiciário amazonense, o subsídio (salário que deveria ser único, sem acréscimos) dos desembargadores é de R$ 30.471,11, mas eles recebem, além dele, mais R$ 10 mil da PAE (Parcela Autônoma de Equivalência), R$ 3.351,82 de vantagens, alguns ganham até R$ 10.157,03 por funções gratificadas e R$ 5.877,59 de indenizações, o que inclui o auxílio-moradia. No fim, o salário bruto chega a R$ 59 mil e o líquido, a R$ 42 mil, bem acima do teto constitucional, de R$ 33.763,00.
A nota da Associação dos Juízes Federais invoca ato do Senado de cinco anos atrás e faz uma revelação, sem citar nomes, para contestar a decisão de Renan Calheiros de investigar os salários acima do teto. “Leva-se mais à conclusão de que está havendo retaliação quanto às operações em curso no Brasil, porque em 2011 a Mesa Diretora do Senado entrou com recurso no Tribunal Regional Federal da 1ª Região para que o teto constitucional não fosse observado pelos servidores daquela Casa legislativa, tendo obtido ganho de causa fazendo com que servidores de nível técnico recebam igual ou mais do que um ministro do Supremo Tribunal Federal.”
Como pode uma associação, no afã de defender seus próprios interesses, usar um caso incontestável de ilegalidade para cobrar o que julga ser direito da classe? Não dá para defender os magistrados nessa questão salarial, pelo contrário. Qualquer inciativa que objetive corrigir as distorções que ferem a Constituição da República deve ter o apoio popular.
Valmir Lima é jornalista, graduado pela Ufam (Universidade Federal do Amazonas); mestre em Sociedade e Cultura na Amazônia (Ufam), com pesquisa sobre rádios comunitárias no Amazonas. Atuou como professor em cursos de Jornalismo na Ufam e em instituições de ensino superior em Manaus. Trabalhou como repórter nos jornais A Crítica e Diário do Amazonas e como editor de opinião e política no Diário do Amazonas. Fundador do site AMAZONAS ATUAL.
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