Por Lúcio Pinheiro, da Redação
MANAUS – Em depoimento na Justiça Federal, o ex-secretário de saúde Wilson Alecrim afirmou nesta sexta-feira, 9, serem falsas as afirmações do MPF (Ministério Público Federal) de que ele e demais servidores da Secretaria de Estado de Saúde (Susam) dispensaram ilegalmente uma licitação para favorecer o Hospital Santa Júlia em um contrato firmado com a pasta em 2012. Alecrim é um dos réus na ação civil, acusado de improbidade administrativa.
“É falsa”, disse Alecrim. Ao ser questionado pelo juiz federal substituto Luís Felipe Pimentel porque então ele foi denunciado, o ex-secretário respondeu: “Por falta de compreensão das pessoas que se apresentaram como denunciadores e de não respeitarem instâncias anteriores que deliberaram pela veracidade da não falsidade do acontecimento”.
O processo envolve um contrato sem licitação firmado entre a Susam e o Hospital Santa Júlia para realização de cirurgias cardíacas em crianças. Após representação da ONG Instituto Amazônico de Cidadania (IACi), o MPF investigou o caso e chegou à conclusão de que a dispensa de licitação foi ilegal. Em 2012, o Ministério Público de Contas junto ao TCE-AM (Tribunal de Contas do Estado) apresentou uma representação contra Alecrim classificando como indevida a dispensa de licitação. Isso porque, à época, o Hospital Adventista de Manaus também se declarou apto a prestar os serviços.
Faltou documento
Segundo Alecrim, no decorrer dos trâmites administrativos que antecedem a contratação, o Hospital Adventista de Manaus não comprovou que tinha capacidade para prestar o serviço especializado exigido pela pasta. De acordo com o ex-secretário, o hospital não apresentou um Certificado de Capacitação Técnica, documento que demonstra que a referida empresa realizava ou já tivesse realizado aquele tipo de cirurgia.
Alecrim disse que diante da falta de comprovação do Hospital Adventista de Manaus de que tinha condições de fazer as cirurgias, o hospital foi desclassificado da concorrência, e o Hospital Santa Júlia foi contratado por dispensa de licitação.
O ex-secretário informou ainda no depoimento que, à época, para o referido contrato, a Susam encaminhou propostas para oito serviços e unidades que poderiam ter interesse no serviço. Apenas três responderam: Hospital Santa Júlia, Hospital Adventista de Manaus e o Check Up Hospital. Este último declarando que não tinha interesse por não ter condições de prestar o serviço.
De acordo com o MPF, a Susam embasou sua decisão de dispensa de licitação em favor do Hospital Santa Júlia em atestados assinados pelos então presidentes do Sinessam (Sindicato dos Estabelecimentos de Serviços de Saúde do Estado do Amazonas), Mariano Brasil Terrazas e Adriano da Silva Terrazas. No documento, os dois, que também são alvos da ação, declararam que o Hospital Santa Júlia era o único capacitado para realizar cirurgias cardíacas em crianças no Amazonas.
Segundo a apuração do MPF, semanas depois, a mesma entidade sindical firmou declaração de que o Hospital Adventista de Manaus também era apto a prestar o serviço. Para o procurador do caso, Alexandre Jabur, esta situação revelou contradição diante do atestado que beneficiou o Hospital Santa Júlia na contratação.
A tese do MPF é que foi falsa a alegação dos dirigente sindicais de que o Hospital Santa Júlia era o único estabelecimento de saúde do Estado capaz de realizar cirurgias cardíacas em crianças. A investigação também ressalta que os dois médicos integravam a equipe do hospital. Alecrim disse no depoimento que Mariano Terrazas também trabalhava no Hospital Adventista de Manaus naquele ano.
R$ 12 milhões
Os recursos destinados à contratação desse serviço eram repassados à Susam pelo Governo Federal. Nos cálculos do MPF, os danos causados aos cofres públicos chegaram a quase R$ 12 milhões. A ação é de 2015.
Todos os réus, entre eles o sócio-gerente do Hospital Santa Júlia, Edson Sarkis Gonçalves, e ex-dirigentes sindicais, tiveram os bens bloqueados no valor total de R$ 12 milhões.
Se forem condenados, os réus podem receber um somatório de penas individuais que variam de três a cinco anos de prisão para cada vez que cometeram o mesmo crime, já que cada réu praticou, no mínimo, duas vezes o crime de dispensa ilegal de licitação. Isso porque a prestação do serviço se estendeu, por meio de aditivos e novas contratações por inexigibilidade, até 2013.
Foi a partir dessa investigação que a Controladoria Geral da União no Amazonas começou a apurar suspeitas na Susam que resultaram na Operação Maus Caminhos. A ação é de 2015 e está prestes a ser concluída.