MANAUS – A decisão do TJAM (Tribunal de Justiça do Amazonas) de anular a nomeação de 222 servidores do TCE (Tribunal de Contas do Estado) que eram temporários e ganharam a condição de estatutários é apenas a ponta o iceberg de um problema criado pelas administrações passadas. Um processo que está prestes a ser votado no plenário do STF (Supremo Tribunal Federal) pode colocar para fora do serviço publico estadual mais 10 mil servidores que foram efetivados na mesma condição irregular dos servidores do TCE.
Em 2011, o TJAM julgou procedente uma ação direta de inconstitucionalidade que tornou inconstitucional a Lei 2.624/2000, proposta pelo então governador Amazonino Mendes e aprovada pela Assembleia Legislativa do Amazonas, que transformou em cargos as funções desempenhadas pelos servidores que pertenciam ao regime especial instituído pela Lei nº 1.674, de 10 de dezembro de 1984, ou admitidos como temporários a partir da Constituição do Estado.
Eram cerca de 23 mil servidores que passam a integrar o Quadro Suplementar do Poder Executivo, do Poder Legislativo estadual, do Ministério Público e do Tribunal de Contas. Depois de 15 anos, cerca de 13 mil já estão aposentados, mas uma mudança agora poderia causar problemas, inclusive, para as aposentadorias, já que esses servidores se aposentaram como estatutários.
Recurso negado
A Procuradoria Geral do Estado, a procuradoria-geral da Assembleia Legislativa e a Procuradoria-Geral de Justiça ingressaram com recurso no Supremo Tribunal Federal (Recurso Extraordinário n° 658.375) para revogar a decisão do Tribunal de Justiça do Amazonas, mas o recurso foi negado.
De acordo com a decisão da Segunda Turma do STF, os interessados perderam o prazo para ajuizar o recurso no tribunal. O ministro relator, Celso de Mello, argumentou que as partes recorrentes foram intimadas no dia 17 de maio de 2011 e tinham prazo até 1° de junho daquele ano para recorrer da decisão. “Ocorre, no entanto, que os recursos extraordinários interpostos pela Assembleia Legislativa do Estado do Amazonas (fls. 290/306) e pelo Estado do Amazonas e por seu Procurador-Geral (fls. 309/338) somente vieram a ser interpostos, respectivamente, em 02/06/2011 (fls. 290) e em 03/06/2011 (fls. 309), datas em que já se consumara o trânsito em julgado do acórdão emanado do Tribunal de Justiça local”, escreveu o relator.
O procurador-geral da Assembleia Legislativa, Wander Góes, afirma que o recurso do Poder Legislativo foi ajuizado dentro do prazo e aposta que será apreciado pelo Supremo Tribunal Federal. “Nós ingressamos com um agravo interno e provamos para o STF que o nosso recurso foi tempestivo”, disse o procurador.
A decisão do STF ainda precisa ser confirmada pelo plenário, mas a expectativa é de que seja mantida a decisão da Segunda Turma, e que o Estado, a Assembleia, o Ministério Público e o TCE tenham que demitir cerca de 10 mil servidores.
“Seria um caos”
O procurador Wander Góes aposta que o STF vai apreciar o recurso da Assembleia Legislativa, mas não arrisca um palpite a respeito do julgamento do mérito da ação direta de inconstitucionalidade. Segundo ele, caso o Supremo mantenha a decisão do TJAM, será um caos para os servidores públicos. “Esses servidores tem, no mínimo, 25 anos de tempo de serviço, a maioria já tem mais de 50 anos. A gente tem notícia de que toda vez que esse assunto vem à tona, alguns servidores começam a passar mal. Seria um caos se eles tivessem que ser demitidos. É uma questão social complicada”, disse Wander Góes.
Outro problema apontado pelo procurador é que no caso de confirmação da ADI, os servidores seriam considerados celetistas e teriam direito a indenização, com a obrigação do governo de depositar o FGTS (Fundo de Garantia por Tempo de Serviço). Como a maioria tem mais de 25 anos de trabalho, o valor seria astronômico.
Já há jurisprudência no STF reconhecendo o direito dos servidores de receberem o FGTS em caso de demissão, por inconstitucionalidade de lei que efetivou esses servidores.
Bom senso
O conselheiro do Tribunal de Contas do Estado Érico Desterro, afirma que sempre se posicionou contrário à efetivação de servidores sem concurso público, mas afirma que as administrações estaduais são responsáveis pela situação prestes a ser julgada pelo STF. Segundo o conselheiro, até hoje o poder público continua adotando essa prática de evetivar servidores sem concurso. “Recentemente a Câmara Municipal de Manaus criou uma lei efetivando cerca de 8 mil servidores municipais”, disse.
Neste caso, o conselheiro afirma que é preciso bom-senso do STF na decisão. Isso significa, na opinião de Desterro, os ministros apontarem uma solução mais branda que não seja apenas demitir os servidores que já estão há mais de 25 anos no serviço público. “A culpa não é do servidor. Quando o STF quer, ele adota medidas para abrandar a situação”, disse.
O procurador Wander Góes cita o caso de Minas Gerais, onde, segundo ele, o STF modulou a decisão para não prejudicar os servidores. “Lá eles decidiram que quem já estava aposentado não seria afetado; aqueles que já tinham tempo para se aposentar, também poderiam se aposentar; e aqueles que não tinham tempo de aposentadoria, seria exonerados, mas o STF deu um prazo de um ano para que fossem feitas as demissões”, disse.
A expectativa do procurador é de que o julgamento no plenário do STF seja feito ainda neste ano.